A expectativa foi crescendo ao longo do dia e o título confirmou-se já noite dentro, depois da derrota do Benfica em Famalicão. O 20.º campeonato nacional da história do Sporting motivou a festa dos adeptos leoninos um pouco por todo o país. Ainda o jogo em Famalicão não tinha terminado e já muitos sportinguistas se desdobravam em festejos nas vias de acesso à rotunda do Marquês de Pombal — naquele que viria a ser o epicentro da festa verde e branca.
“Não é todos os anos que o Sporting é campeão. É sempre bom ver esta união”, dizia Tomás, 16 anos, que esperava com um amigo, junto ao El Corte Inglês, para se dirigir para a rotunda do Marquês, onde os dois grandes de Lisboa festejam os títulos nacionais. O mérito, diz, é todo de Rúben Amorim, o treinador — com um passado ligado ao grande rival Benfica — que chegou ao Sporting em 2020 e que, em quatro anos, já conquistou dois campeonatos nacionais, tantos quantos o clube erguera nos 38 anos anteriores. “Tínhamos jogadores que pensávamos que não resultariam na equipa no início mas a verdade é que resultaram. O Rúben Amorim fez um trabalho ótimo”, afirma o jovem adepto, que veio de… Benfica, em Lisboa.
Apesar de não esconder a vontade de continuar a ver Amorim a liderar a equipa na próxima temporada, Tomás admite que o mais provável é que o treinador acabe por sair, “para treinar noutra liga”. Este é, de resto, um sentimento comum à maioria dos adeptos com quem o Observador falou numa noite de verdadeira euforia. Rúben Amorim foi o principal obreiro do título, dizem os sportinguistas, mas o mais provável é que deixe o clube no final da temporada.
Amorim, claro. A estrutura, também. E o olheiro, Flávio Costa?
“Rúben Amorim já pode sair, deu tudo o que tinha”, diz outro Tomás, na casa dos 40 anos, que se reuniu com um grupo de familiares e amigos para festejar o título. À primeira pergunta do Observador, sobre a quem deve ser atribuído o maior mérito pela conquista do campeonato nacional, as respostas dividiram-se. “Ao Amorim, claro”, diziam uns. “A resposta é à estrutura”, contrapunham outros, com destaque para o presidente Frederico Varandas e para o olheiro do Sporting, pouco conhecido do grande público, mas cujo trabalho é avaliado de forma muito positivo por Tomás. “Falem do Flávio Costa, o nosso olheiro”, sublinha. “Não só por causa do Gyokeres, começou muito antes, com a contratação do Ugarte por exemplo”, lembra.
Por volta da meia noite vislumbrava-se já fogo de artifício em redor do Marquês. Antes disso, vários adeptos do Sporting festejavam com petardos e com tochas verdes, que foram lançando ao longo da Avenida António Augusto de Aguiar (uma das principais artérias de acesso à rotunda) perante o olhar ora de espanto, de muitos turistas que entravam e saíam dos hotéis daquela zona do centro de Lisboa, ora de desaprovação ou indiferença dos poucos moradores que arriscaram sair de casa.
Mas enquanto o fumo verde se dissipava rapidamente — no final de um dia frio e chuvoso de maio — os elogios ao treinador do Sporting ecoavam pelos adeptos. “Foi o grande obreiro, se ganhar a Taça também e se decidir sair está desculpado e pode ir para Inglaterra ou para onde quiser”, diz Rodrigo Mota, que veio da Amadora com um grupo de amigos e que faz questão de lembrar que Amorim “apostou e bem em Gyokeres, o melhor jogador do campeonato”.
“Foi o homem que nos fez chegar onde estamos hoje desde que entrou no clube”, reforça Íris, também da Amadora. “Mas acho que ele vai sair”, lamenta. O grupo de Tomás relembrava ao Observador que este domingo se fez história. Já não havia um treinador campeão pelo Sporting por duas vezes há quase de 60 anos, desde que em 1966 Juca juntou o título de campeão nacional ao ganho na época de 1961/62.
Pela 00h20, e enquanto se concentravam cada vez mais pessoas na zona de revista, surgiu o tradicional cântico dirigido ao rival Benfica. “E quem não salta é lampião, olé, olé, olé”, entoado sob o fogo de artifício que continuava a preencher, a espaços, o céu por cima da zona do Pavilhão Carlos Lopes. Adivinhava-se uma festa rija.
E será este título mais mérito do Sporting ou demérito do Benfica, o até há poucas horas campeão em título e que todos apontavam no início da temporada como a equipa com melhor plantel e com mais condições para se sagrar de novo campeã? “O Benfica deu uma boa ajuda. O treinador do Benfica não teve a competência para guiar o clube“, diz o jovem Tomás. Já o seu homónimo mais velho destaca sobretudo a perfomance leonina. “Foi mais mérito do Sporting que demérito do Benfica. Se o Benfica fizer os últimos seis pontos, fica com uma pontuação que daria para ser campeão na maioria das épocas”, justifica.
E, se, dado a relativa surpresa pelo festejo antecipado, (apesar de tudo não era expectável que um Benfica ainda com aspirações ao título perdesse pontos contra o 9º classificado), a maioria dos adeptos veio das imediações da capital, também houve quem fizesse muitos quilómetros — cerca de 3 mil — para festejar o título.
Três mil quilómetros de viagem e a esperança na continuidade de Amorim
Daniel Silvestre, de 28 anos, viajou da Islândia de propósito para celebrar. A trabalhar no setor da hotelaria, chegou a Lisboa há cerca de duas semanas e vai ficar até domingo, dia 12. Quando decidiu viajar desde o norte da Europa, acreditava que o Sporting seria campeão, na pior das hipóteses, a uma jornada do fim — daí a prudência na data de regresso. No entanto, a ansiedade acumulada foi afastada uma semana mais cedo, com a derrota do Benfica a precipitar os festejos.
“Estava com esperança no título, o Sporting jogou muito bem ao longo da época”, diz o português de Alverca, emigrado há um ano na terra do gelo e do fogo. Rúben Amorim e o avançado sueco Gyokeres, o melhor marcador do campeonato foram, sublinha, cruciais para a conquista do título. Daniel é uma exceção entre os adeptos leoninos: ao contrário da maioria, acredita que Amorim se vai manter no clube.
Apesar de o fluxo de adeptos em direção à rotunda do Marquês ter continuado intenso, pela uma da manhã já eram visíveis muitos adeptos a regressarem, principalmente famílias com filhos pequenos. Uma segunda-feira de trabalho e de aulas obrigam a uma festa mais curta, como disse ao Observador uma família, com duas crianças, que veio da Ericeira.
Indiferentes ao adiantado da hora, dezenas de milhares de adeptos esperaram contudo até cerca da 1h45 pela chegada do autocarro com os jogadores e equipa técnica do Sporting, após mais de uma hora de viagem, em marcha lenta, pelas ruas de Lisboa desde o estádio de Alvalade, onde os agora campeões nacionais assistiram ao Famalicão-Benfica.
Uma noite de esforço, dedicação, devoção e glória.