O pálido Orçamento do Estado para 2024, que poucas ou nenhumas novidades trouxe, ganhou cor com a adoção pontual de medidas de cariz fiscal que, em bom rigor, traduzem a preocupação em combater problemáticas sociais que marcam de forma indelével a atualidade.
Sem prejuízo de se poder tecer considerações acerca do seu eventual mérito, sobressaem algumas alterações legislativas que procuram dar resposta, na medida do possível, a questões como a erradicação da pobreza e a promoção de um trabalho digno e do bem-estar social.
Desde logo, dever-se-á assinalar que os limites dos escalões do IRS foram atualizados em 3%, tendo sido, a par e passo, igualmente revistas as taxas marginais aplicáveis até ao 5.º escalão.
Estas medidas visariam, crê-se, combater a galopante perda do poder de compra dos portugueses, fazendo face à inflação, que se estima que ascenda até 2,9% em 2024 – todavia, não deixa de ser curioso constatar que este aumento percentual é inferior à valorização nominal de 5% das remunerações acordada para o ano já em curso.
Por outro lado, o valor de referência do mínimo de existência foi atualizado, com o intuito de acompanhar o aumento da Remuneração Mínima Mensal Garantida para 2024 (€ 820,00).
Adicionalmente, o regime fiscal do IRS Jovem, que estabelece isenções para os rendimentos da categoria A e B, auferidos por sujeito passivos entre os 18 e os 26 anos, nos cinco primeiros anos após a conclusão de ciclo de estudos igual ou superior ao nível 4 do Quadro Nacional de Qualificações, foi novamente reforçado através de um incremento das percentagens de rendimento isento de tributação e dos limites aplicáveis.
Deste modo, os jovens trabalhadores, que não sejam dependentes, a partir de 2024, passam a estar isentos de imposto: em 100 % no primeiro ano, em 75 % no segundo ano, em 50 % no terceiro e no quarto ano e em 25 % no último ano, com os limites de 40 vezes o valor do IAS, 30 vezes o valor do IAS, 20 vezes o valor do IAS e 10 vezes o valor do IAS, respetivamente.
Para além do exposto, salvo as pouco expressivas alterações ao incentivo fiscal à valorização salarial, haverá que destacar outras três medidas relevantes.
Em primeiro lugar, foi consagrada uma disposição transitória, segundo a qual ficam isentos de IRS até ao valor de uma remuneração fixa mensal e com o limite de € 4.100,00, os montantes atribuídos aos trabalhadores a título de participação nos lucros da empresa, por via de gratificação de balanço, pagos por entidades cuja valorização nominal das remunerações fixas por trabalhador em 2024 seja igual ou superior a 5 %.
No entanto, deve notar-se que esta benesse pode vir a relevar-se um presente envenenado, sobretudo porque os rendimentos isentos são obrigatoriamente englobados para efeitos de determinação da taxa aplicável aos restantes rendimentos: como tal, se o somatório deste rendimento isento com os restantes auferidos redundar numa subida para o escalão de rendimentos imediatamente superior, o colaborador poderá acabar a pagar mais imposto.
Em segundo lugar, com a revogação do artigo 4.º do Decreto-Lei 137/2010, de 28 de dezembro, verificou-se um aumento dos valores de referência para o abono de ajudas de custo e para o subsídio de transporte: assim sendo, voltam a estar presentemente em vigor os valores aprovados pela Portaria n.º 1553-D/2008, de 31 de dezembro.
Por fim, convirá salientar-se que passaram a estar isentos de IRS e de contribuições sociais, os rendimentos do trabalho dependente, atribuídos em espécie, que resultem da utilização de casa de habitação permanente localizada em território nacional, fornecida pela entidade patronal, referentes ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2024 e 31 de dezembro de 2026.
A mencionada isenção aplica-se até ao valor limite das rendas previstas no Programa de Apoio ao Arrendamento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 68/2019, de 22 de maio.
Paulatinamente, ainda em relação a esta medida, os imóveis detidos, construídos, adquiridos ou reconvertidos pelas entidades patronais para habitação dos trabalhadores, para efeitos de determinação do lucro tributável, em sede de IRC, os sujeitos passivos podem aplicar sendo fiscalmente aceites, quotas de depreciação correspondentes ao dobro das que resultam da tabela anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, na sua redação atual.