Vivemos tempos conturbados no panorama futebolístico português, onde a paixão pelo futebol muitas vezes (ou quase sempre) ultrapassa os limites do razoável. A detenção do líder dos Super Dragões é apenas a ponta de um icebergue que deve levantar questões sérias e profundas sobre qual o papel das claques no futebol nacional.

Se, por um lado, as claques desempenham um papel fundamental dentro das quatro linhas, empolgando equipas, motivando jogadores e ensaiando coreografias impressionantes, por outro, o impacto que têm fora de campo é assustador.

Desde ataques a academias, como aconteceu em 2018 em Alcochete, ao apedrejamento do autocarro da equipa, como aconteceu em 2022 com o Benfica, ou chegar ao exemplo trágico que ocorreu nesse mesmo ano, nos festejos do título do Porto, onde um adepto foi brutalmente agredido e esfaqueado até à morte.

No entanto, mesmo tendo o seu expoente máximo na violência, o problema das claques vai muito além deste aspeto. Associadas frequentemente a atividades criminosas que vão desde o tráfico de drogas à posse de armas, as claques acabam por espelhar a parte mais obscura do futebol.

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Não nos esqueçamos que, já em 2016, dados apresentados pelo Observatório de Futebol da Universidade de Coimbra revelaram que as claques associadas aos três grandes clubes de Portugal (Benfica, FC Porto e Sporting) foram responsáveis por um terço dos episódios de violência em Portugal no ano anterior.

Os adeptos são vistos muitas vezes como uma manifestação de culto e lealdade ao clube e aos seus símbolos, mas a linha que separa o fervor desportivo da violência e do vandalismo é muito ténue. O impacto social das claques é um fenómeno raro. O elevado nível de identificação dos seus membros cria uma mentalidade onde as vitórias e derrotas do clube são vividas como algo de cariz pessoal. A equipa nada mais é que uma extensão do adepto, moldando comportamentos e toldando a perceção social. Onde adeptos de outros clubes são rivais, não apenas do ponto de vista desportivo, mas também socialmente incompatíveis.

É fundamental que exista uma reflexão séria sobre o papel das claques e a necessidade que existe em redefinir os limites da paixão pelo futebol. A colaboração entre clubes, autoridades e adeptos, mais do que nunca, é essencial para erradicar esta sombra que paira sobre o futebol português e devolver-lhe alguma da sua verdadeira essência desportiva. (se é que essa ainda existe).