Numa sociedade onde predominam os atrativos ecrãs retroiluminados é natural, e até desejável, que a Educação aproveite ao máximo aquilo que a tecnologia possa oferecer-lhe tanto para o aprofundamento da relação pedagógica bem como para o aumento do leque de respostas metodológicas que contribuam para a finalidade última de um processo de aprendizagem não apenas eficaz mas, fundamentalmente, eficiente.

Porém, numa ótica de equilíbrio, é importante que a Educação e, neste caso específico, as escolas não sejam “esterilizadas” e não se alheiem ao contexto natural envolvente, que muito pode contribuir para a capacitação e (trans)formação das crianças e jovens.

Nesta partilha, a “Escola em Expedição” pretende ter um duplo sentido: O primeiro, provocatório, que alerte para um tipo de Educação que procure conhecer o desconhecido, que evolua e que se transforme durante o processo de busca por uma melhor versão de si. O segundo, literal, e que aqui irei explorar, é o de equacionar a possibilidade de utilização da Atividade Desportiva “Expedição” como palco e ambiente efetivo de aprendizagem significativa sendo esta uma atividade planeada por alunos e professores, de forma interdisciplinar e que, através de caminhadas em percursos pedestres (trilhos, levadas e veredas) contribuam para reconfiguração do que poderá ser um espaço de aprendizagem.

Recorrendo às ilações (pessoais e de alunos) provenientes de Expedições realizadas com diferentes ciclos de estudos, entendo as Atividades Desportivas realizadas em ambientes naturais como metodologias com elevado potencial pedagógico e didático, e que, mediante abordagens inovadoras, são passíveis de reintegrar a experiência direta com a Natureza no currículo, equilibrando o contexto de crescente imersão tecnológica e o indesejável distanciamento da Natureza.

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A relevância e importância de uma “Escola em Expedição” (com todas as possíveis formas que a proposta possa assumir), reside na sua capacidade de proporcionar experiências de aprendizagem significativas e imersivas, que promovam o desenvolvimento integral dos alunos e a conexão com o meio ambiente. Através da exploração ativa e interdisciplinar de ambientes naturais, os alunos poderão ser estimulados a desenvolver habilidades socioemocionais, cognitivas e práticas essenciais para o seu sucesso pessoal e profissional.

Certamente que o planeamento, a operacionalização, condução e monitorização de práticas pedagógicas com estas caraterísticas coloca as Escolas, os Professores, os Alunos e toda a Comunidade Educativa em situações que requerem a superação dos seus próprios limites, e fundamentalmente, numa relação dialética com um meio inabitual bem como com constrangimentos de ordem logística que, se bem geridos, potenciam uma transcendência educativa, que entenda as práticas como um meio para a transformação de cada indivíduo e não apenas como uma finalidade que leve ao cumprimento de um projeto de escola ou ocupação de cargas letivas.

Durante uma Expedição (perto ou longe da Escola, durante um fim de semana, ou durante uma semana inteira), se houver intencionalidade, os alunos não apenas adquirem conhecimentos em contexto (algo que tem faltado), mas também tornam-se exploradores de si mesmos e do mundo ao seu redor. São incentivados a questionar, a investigar e a procurar respostas não só para o cumprimento do currículo ou de aprendizagens essenciais mas também para as questões mais profundas e complexas que a vida possa apresentar. Esta jornada ontológica na Escola em Expedição não é apenas sobre encontrar respostas, mas também sobre aprender a fazer as perguntas certas, nos locais certos.

Assim, a Natureza não é apenas um lugar de ensino, mas um espaço de descoberta e exploração contínua. A turma, por sua vez, configurar-se-ia uma comunidade de mentes inquietas em busca de significado e compreensão sob pressão de prosseguir em caminhada num meio em constante mudança, até certo ponto previsível, mas outras tantas vezes enriquecida pelo imprevisto. Neste ambiente de aprendizagem, os alunos são desafiados a transcender as fronteiras do conhecido e a abraçar a incerteza como uma oportunidade para o crescimento intelectual e pessoal.

Telas Luminosas e Trilhos Escurecidos

Entre telas luminosas e trilhos escurecidos pelas sombras das árvores, o aluno poderá conhecer uma versão sua que, noutros contextos dificilmente conheceria.

Os trilhos da natureza representam (figurativamente e na realidade) um vasto território de descoberta e maravilha, onde cada pedra, cada folha, contam uma história única. Por outro lado, as telas oferecem uma janela para o mundo, mas que muitas vezes capturam-nos num círculo vicioso de distração. Aqui a Expedição e a impiedosa necessidade de prosseguir, sem se perder, em direção ao destino, reforçam uma saudável e eficiente combinação dos recursos digitais no meio natural.

A expressão “perder-se/deslocalizar-se” adquire, aqui, um significado duplo. Perder-se na natureza pode ser uma jornada de autoconhecimento e crescimento, um mergulho profundo na simplicidade e na beleza do mundo natural. No entanto, perder-se nos ecrãs pode significar perder-se de si mesmo, afastando-se da verdadeira essência da aprendizagem e da conexão humana.

Imagine-se por um momento como um aluno perdido/embebido numa floresta de aplicações móveis, ou a navegar por um mar de notificações e likes, sem rumo nem propósito. Enquanto isso, outro aluno percorre um trilho fixo, mas que o espera pacientemente, oferecendo lições valiosas sobre resiliência, interconexão e respeito pelo meio ambiente.

Para estes alunos, a importância de doses adequadas de risco (controlado) na aprendizagem não pode ser subestimada. A exposição a desafios na Natureza potencia o desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas, tomada de decisão e gestão da perceção de risco.

São muitos os exemplos, dentro e fora do país onde a Natureza e a tecnologia coabitam e fazem crescer as escolas, no entanto, reconheçamos que há todo um vasto capital de espaços naturais subaproveitados e fatores que causam inércia ao planeamento e operacionalização.

Valorizemos a natureza não apenas como um complemento agradável (para ocupar umas horas), mas sim como um catalisador na formação dos alunos. Transformemos os espaços naturais em salas de aula vivas, em acampamento ou em caminhada, onde os alunos possam aprender com a terra que pisam, com o vento e com o sol nos seus rostos – que se sintam desconfortáveis com a variabilidade do ambiente e que para isso tomem constantes decisões para se adaptarem.

Se a Natureza fosse professora, pouco se preocuparia com processos avaliativos pois é nutrida de desafios que permitem ao aluno se autoavaliar e tomar consciência das suas próprias capacidades e limitações. Esta professora seria, porém, muito preocupada com o Perfil do aluno “à saída do trilho”, mas acima de tudo muito atenta ao perfil do aluno à entrada “na vida real”.

Permitam-me terminar esta partilha com o lema que tem nutrido as minhas práticas pedagógicas: “Não retiremos os alunos da Natureza, sob pena de perder a mais pura natureza que cada aluno possui.”

Observação: É claro que não escrevi este artigo com “papel e caneta” e que tão pouco o remeti por correio tradicional, mas tomei a liberdade de caminhar até ao Pico Ruivo para o digitar sobre a pressão temporal da previsão meteorológica de elevados níveis de pluviosidade. Partilho ainda que a maioria das ideias escrevi-as no pensamento enquanto caminhava até cá e que, no regresso, surgirão outras tantas que terão que ficar para outro momento. Agora vai começar a chover… até breve, eu posso molhar-me, mas o portátil não!