O problema da habitação em Portugal tem sido um tema subjacente a todos os governos desde que há memória, com um enfoque mais acentuado, desde 2012, nos últimos governos de esquerda e, agora, neste social-democrata.

Vamos então refletir se as medidas adotadas servem apenas “para tapar os buracos” ou se resolvem efetivamente (e a longo prazo) o problema da habitação.

O XXIV Governo Constitucional tem como uma das principais prioridades a entrega de 26.000 casas até junho de 2026 ao abrigo do programa “Construir Portugal”. De acordo com os dados do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), no âmbito do Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, foram entregues até 30 de junho deste ano 1.607 habitações, em zonas tais como Oeiras, Figueira da Foz e Entroncamento.

O atual Governo revogou alguns pontos da lei anterior do Governo socialista, nomeadamente a do arrendamento coercivo aplicado às habitações devolutas, e aprovou algumas medidas com destaque para uma garantia pública aos jovens até aos 35 anos para viabilização do financiamento bancário – aplicou, assim, aos mesmos a isenção de IMT e IS na compra da 1.ª casa.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Houve uma reformulação ao apoio ao arrendamento através do Porta 65 e o alargamento do programa de emergência para alojamento estudantil, onde se praticam rendas altas para a utilização de um quarto apenas.

Voltando atrás no tempo, e referindo o que disse em relação às preocupações governamentais de governos anteriores, na 1.ª Républica houve, por exemplo, a criação de leis protecionistas aos inquilinos, com a lei do inquilinato de novembro de 1910 que era claramente favorável aos inquilinos; em 1918 foi aprovado um decreto, o n.º4137 de 24 de abril, publicado no Governo de Sidónio Pais, o qual foi pioneiro ao estabelecer as providências relativas à construção das chamadas “casas económicas”, casas estas que tinham um fim muito próprio que era erradicar os bairros “infectos” de Lisboa e Porto.

Houve a criação de bairros operários, tais como Arco do Cego, Boa Hora e Ajuda, Alcântara, Braço de Prata e Penha de França, com uma ideologia fortemente socializante e coletivista, em que a propriedade das habitações eram do Estado e havia coletivos de moradores e do Estado que instituíam as rendas.

Mais perto de nós, no Estado Novo existiram as chamadas casas económicas e rendas económicas, ou seja, a preocupação da habitação sempre foi algo que esteve presente e sendo uma constante de Governo para Governo.

O que fazer para resolver? Esta parece ser a questão de um milhão de dólares.

A experiência do passado prova que a criação de rendas económicas e bairros económicos não funcionam. Precisamos de políticas coerentes e que se apliquem a pelo menos 100 anos, pois, passados 100 anos, esses mesmos bairros sociais viram bairros de moda onde o metro quadrado ultrapassa os 6 e 7 mil euros. Vejam-se bairros como a Ajuda, Alcântara e algumas zonas do Restelo.

Note-se que o grave problema da habitação em Portugal deve-se à falta construção de novos prédios. De acordo com o INE entre 1981 e 2000 construíram-se 1.138.816 habitações, comparando com o período de 2011 a 2021 em que se contruíram apenas 110.784 habitações, ou seja, uma quebra de 90%.

Se a esta quebra somarmos ainda o agravamento do preço da construção, o aumento dos preços dos terrenos para construção e o aumento da população, afigura-se claríssimo que existe uma disparidade enorme entre a procura e a oferta.

O Estado pode e deve ter iniciativas para impulsionar a construção nova, como, por exemplo, a medida proposta por algumas associações do sector, de baixar o IVA da construção nova para 6% e, ainda, fazer uma análise rigorosa ao número de fogos devolutos na mão do Estado para reabilitar e transformar em habitação para jovens, para famílias etc…

Além destas medidas, há também que considerar temas transversais que afetam a construção nova e que constituem para os promotores, investidores e também proprietários um verdadeiro fator de risco como, por exemplo, o tempo que as autarquias demoram a aprovar os projetos e a instabilidade fiscal que leva a que quem faça investimentos na promoção imobiliária, na reabilitação ou na transação de bens imobiliários desista de comprar ou vender.

Em suma, as medidas do atual Governo são positivas, mas insuficientes para o problema da habitação nos centros urbanos, em particular, e em Portugal, em geral.