Nos últimos dias, comentadores, alguns especuladores da comunicação social e especialistas em gestão de empresas têm andado entretidos a dizer que Ruben Amorim e Frederico Varandas estão em fim de linha por causa da venda do Matheus Nunes. Uns dizem que Ruben Amorim já está a fazer as malas mentalmente, outros que a relação de Amorim com Viana e Varandas azedou, outros, que com certeza nunca discutiram com o seu chefe ou com amigos, dizem que este episódio matou a lua de mel entre os três. Muito gostamos nós de especular e de manchetes com a voracidade de quem come tremoços. Como se uma situação banalíssima num clube de futebol, numa empresa ou numa organização – uma divergência de opiniões – desse azo a demissões, ações irrevogáveis ou a inícios repentinos de divórcios. Das duas, uma: ou o Sporting é um clube a funcionar bem e esta situação não tem significado absolutamente nenhum, ou o Sporting, como outros clubes em Portugal, não anda saudável e este episódio serve para expor uma gestão danosa. Acredito, ao contrário do que se tem dito, muito mais na primeira do que na segunda hipótese. Mas o tempo dirá quem tem razão. Se é que isso interessa para alguma coisa.

O Sporting, a cerca de 15 dias do fecho de mercado e antes de um jogo contra o Porto, vendeu um dos seus melhores jogadores. É um momento difícil porque obriga a uma contratação de um substituto e o tempo escasseia. Como é evidente, Frederico Varandas não queria perder Matheus Nunes, muito menos Ruben Amorim, mas os clubes em Portugal não nadam em dinheiro e, infelizmente, têm de vender os seus maiores ativos para se aguentarem de pé e poderem investir.

Diante desta circunstância, Ruben Amorim mostrou algum descontentamento na conferência de imprensa e aparentou certa preocupação com a perda de um pilar, com o possível substituto, com a venda do Tabata (jogador que não teria saído se se soubesse que o Matheus iria sair), e fez algumas críticas à direção – com educação e serenidade, como é seu apanágio –, acabando por se revelar conformado porque é “apenas um empregado do clube“. Acabou também por confirmar que sabia que a direção queria vender o jogador (evidenciando transparência entre ele e a direção) e que “adora o miúdo“, dizimando os críticos que comentavam a falta de profissionalismo de Matheus Nunes.

Mas o legítimo descontentamento ou o facto de Ruben Amorim ser contra esta decisão da direção – porque, como ele próprio afirma, e bem, a direção e o treinador não têm sempre os mesmos interesses ou as mesmas prioridades para o clube –, não significa que esteja gerado o caos em Alvalade, como tanta gente tem afirmado. A pressa por manchetes faz com que se tenha necessidade de criar tempestades em copos de água quando o assunto, apesar de ter interesse, não tem dimensão para ser uma tempestade. É, quando muito, uma chuva ligeira, vá.

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As empresas que funcionam decentemente, ao contrário do que se pensa, não vivem como se vive nos filmes da Disney – com prados idílicos, amor à primeira vista e fadas tão felizes como uma criança que recebe gelados no verão. As empresas que funcionam decentemente e que, por isso, evoluem, são feitas de homens corajosos, livres, com liberdade para errar, para dizer o que pensam e com elevação para, ao dizer o que pensam, perceberem que, acima deles próprios, está a instituição. Assim crescem as organizações, com valentia e bravura, sem romantismo e argumentos hollywoodescos.

São normais as discussões, as visões distintas e os interesses desfasados. Fazem parte da rotina das empresas mais saudáveis. O problema é quando não se consegue digerir acontecimentos corriqueiros como este.

Por isso, Ruben Amorim apenas confirmou em conferência de imprensa aquilo que já se sabe sobre empresas normais: a união não significa que todos concordem uns com os outros e que todos pensem da mesma forma. A união de uma empresa mede-se sempre pela liberdade e pela capacidade de os seus ativos lidarem com ela.

Nada mais do que isso.