Vivemos num mundo onde os consumidores são cada vez mais exigentes, com a expectativa de que tudo lhes seja entregue de forma rápida, conveniente e personalizada. Ao mesmo tempo, a quantidade de informação criada, publicada e consumida duplica a cada dois anos, tornando-se cada vez mais difícil para as empresas captar a atenção e o interesse do seu público-alvo.
A função de marketing tem hoje uma importância incontornável nas organizações. Divulgar a marca, conhecer profundamente os clientes atuais e potenciais, criar e comunicar produtos e serviços adequados a cada consumidor, ou definir estratégias bem-sucedidas de captação, vinculação e retenção de clientes, são algumas das responsabilidades centrais das equipas de marketing.
No entanto, apesar de ser uma das principais prioridades das organizações, os clientes nem sempre reconhecem essa experiência. Segundo um estudo da Deloitte publicado em 20241, observa-se um gap entre a perceção de valor oferecido pelas marcas e a experiência real dos consumidores. Por exemplo, enquanto 79% das organizações consideram que os seus clientes têm uma experiência de compra online muito positiva, apenas 46% dos consumidores atribuem a mesma classificação.
Neste contexto, a Inteligência Artificial Generativa (GenAI) surge como uma tecnologia com enorme potencial para transformar o marketing. Diferente da automação tradicional, a GenAI cria conteúdos originais de várias naturezas – como textos, imagens, vídeos e sons.
Um dos impactos mais imediatos e visíveis da GenAI no marketing é a forma como poderá transformar a criação de conteúdo necessário para alimentar sites, apps, redes sociais e campanhas de email marketing ou de media tradicional. Ferramentas como o DALL-E permitem que as empresas gerem novas imagens de forma instantânea.
Por exemplo, algumas plataformas de e-commerce estão a utilizar ferramentas de GenAI para gerar descrições de produtos automaticamente, a partir da fotografia e da identificação sintética do produto. Desta forma, uma loja que ofereça milhares de produtos online poderá poupar centenas de horas a criar ou atualizar as descrições detalhadas do seu catálogo, ajustando para cada caso particular os elementos visuais para diferentes públicos-alvo, permitindo criar campanhas personalizadas e impactantes, sem o investimento tradicionalmente necessário.
A personalização tem sido um tema central no marketing há anos, mas a adoção de GenAI permitirá levar este conceito a um novo patamar. Tradicionalmente, as tentativas de personalização envolviam segmentar grandes audiências em grupos menores e adaptar manualmente as mensagens e conteúdo para cada segmento. Com a utilização de GenAI, as marcas podem explodir o grau de personalização, oferecendo, no limite, uma experiência única a cada utilizador.
Pensando numa empresa de streaming de vídeo que utiliza algoritmos de GenAI para personalizar as sugestões de conteúdo para cada utilizador, é possível gerar automaticamente imagens relacionadas a filmes e séries que sejam mais adequadas ao perfil de cada cliente. Se o modelo identificar que um utilizador responde melhor a imagens com certos atores, cores ou estilos visuais, serão criadas versões personalizadas dessas imagens para aumentar a probabilidade de clique.
Este tipo de personalização torna a experiência do utilizador mais envolvente e aumenta a eficácia das campanhas de marketing. Qualquer empresa pode também utilizar uma estratégia semelhante no contexto da sua estratégia de marketing digital, por exemplo, personalizando emails ou criando anúncios em redes sociais ajustados ao perfil e comportamento individual de cada utilizador.
Noutro campo, a GenAI poderá também ter um papel importante na interação que as organizações têm com os seus clientes, seja substituindo integralmente a intervenção humana em jornadas de serviço ao cliente, seja enquanto ferramenta para auxiliar o colaborador nessas jornadas.
Por exemplo, um Banco está a adotar GenAI para automatizar a gestão de reclamações e pedidos de clientes. Apesar de o envio da resposta a cada cliente continuar a ser confirmado por um colaborador, todas as tarefas anteriores ao envio da resposta passaram a ser executadas de forma automática – criação de um resumo da reclamação ou pedido, tipificação e catalogação com base no assunto ou natureza, identificação e encaminhamento para a área responsável pela sua análise ou até elaboração de sugestão de resposta. Desta forma, foi possível reduzir o tempo dedicado à gestão de reclamações e pedidos em 60%, libertando-o para tarefas de maior valor.
Por outro lado, o atendimento ao cliente poderá ser uma das áreas mais impactadas pela GenAI, com a adoção de assistentes virtuais com capacidades avançadas de diálogo em voz, texto ou vídeo. Ao contrário dos chatbots tradicionais, que seguem respostas predefinidas com base em regras determinísticas, os modelos de GenAI são capazes de entender o contexto e oferecer respostas mais humanizadas e precisas. Este tipo de atendimento ao cliente, disponível 24/7 e sem tempos de espera para o cliente, tem o potencial para melhorar significativamente a experiência dos clientes e reduzir os custos para as empresas.
Algumas empresas estão a desenvolver protótipos de assistentes virtuais cuja interação ocorre através de videoconferência. Imagine-se a conversar com um colaborador virtual, que se assemelha muito a um ser humano, através do ecrã do seu computador. Este assistente está à distância de um clique, disponível todos os dias, a qualquer hora, e é capaz de dialogar com os clientes de forma natural, fazer pausas apropriadas e até sorrir, esclarecendo todas as suas dúvidas. O potencial desta tecnologia é impressionante, proporcionando uma interação mais imersiva e humanizada.
A GenAI também pode ser utilizada para agregar e resumir conhecimento relevante para as empresas. Por exemplo, algumas organizações já usam modelos de IA para monitorizar informações externas que impactam o negócio – como legislação e regulação em vigor, produtos, serviços e preçário dos concorrentes, atividade nas redes sociais, etc. – e gerar resumos diários que destacam as principais alterações.
Diversas empresas estão também a criar plataformas internas de gestão de conhecimento, com base em modelos de GenAI, permitindo aos colaboradores “conversar com as bases de dados da empresa”, de forma natural e intuitiva. Desta forma, toda a informação que consta em normativos, manuais de procedimentos, páginas de intranet ou até relatórios de atividade, mapas de gestão ou bases de dados departamentais passa a estar acedível num modelo de “pergunta e resposta”.
Apesar dos benefícios, a adoção da GenAI enfrenta desafios significativos. Um dos principais obstáculos está na qualidade dos dados. A eficácia da GenAI depende da qualidade dos dados utilizados para construir as bases de conhecimento às quais a IA será exposta, garantindo que as respostas e sugestões sejam relevantes e precisas.
Outro grande desafio é o fenómeno de “alucinação”, onde o sistema pode gerar informação errada ou incoerente. Para mitigar este risco, é essencial combinar a automação com supervisão humana. Além disso, questões relacionadas com a privacidade dos dados, conformidade legal e ética no uso da IA são áreas que necessitam de atenção redobrada.
A implementação da Inteligência Artificial Generativa (GenAI) no marketing exige uma evolução na arquitetura tecnológica das organizações, permitindo a criação e gestão de conteúdos em larga escala. As empresas devem desenvolver uma infraestrutura flexível que integre dados de várias fontes internas e externas e suporte ferramentas de marketing digital, como plataformas de marketing automation, sistemas de análise de dados e plataformas de automação, através de APIs. A utilização de cloud computing é crucial para garantir escalabilidade e eficiência, possibilitando uma resposta rápida às necessidades do mercado e a personalização das interações com os clientes em tempo real.
A Inteligência Artificial Generativa tem o potencial para revolucionar o marketing, transformando a forma como as empresas interagem com os seus clientes. Embora a maioria das empresas ainda esteja numa fase experimental, com projetos piloto e provas de conceito de pequena dimensão, espera-se que nos próximos anos a adoção se torne mais ampla. O marketing será uma das áreas onde antecipamos maior transformação, não apenas em termos de produtividade, mas também na criatividade, permitindo novas formas de captar, personalizar e envolver os consumidores.