O fadista e ex-deputado eleito nas listas do PSD, Nuno da Câmara Pereira, corre o risco de perder a licenciatura em Engenharia do Ambiente. É um dos alunos que beneficiou de equivalências que foram declaradas nulas pela Inspeção-geral da Educação e Ciência (IGEC). Tal como Miguel Relvas ou como outros 150 alunos, Câmara Pereira tirou o curso na Universidade Lusófona, mas a tutela entende que o processo não foi rigoroso e não cumpriu as todas regras. Isso mesmo pode ler-se no relatório da IGEC, consultado pelo Observador.
O Ministério da Educação concluiu que “o registo do percurso escolar do aluno, assim como o certificado emitido, não se encontram de acordo com nenhum dos planos de curso” aprovados. Segundo a Inspeção-Geral, a matrícula do aluno no curso de Engenharia do Ambiente em 2 de fevereiro de 2012 num “plano de estudos que já não se encontrava em vigor é irregular, na medida em que foi efetuada em data que já não permitia a obtenção do grau de acordo com o plano de estudos” aprovado.
Ao Observador, Câmara Pereira garante que o seu caso “não se trata de nenhuma relvice” e diz que houve no processo “má-fé”. “O que aconteceu foi uma vergonha e uma fantochada”, insiste.
“Agora de repente, aparecem uns iluminados que dizem que nós não temos direito à licenciatura. Não tenho nada a ver com as relvices”, afirma.
Para perceber todos os contornos da formação académica do fadista é preciso recuar até 1975, ano em que concluiu o curso de regente agrícola (equiparado a bacharel) em Évora. Em 2008, um diploma assinado pelo então ministro da Ciência e do Ensino Superior, Mariano Gago, reconheceu aos equiparados a bacharéis o “direito ao prosseguimento de estudos e ainda à creditação da sua formação profissional”.
Nesse ano, Nuno da Câmara Pereira decidiu candidatar-se à licenciatura em Engenharia do Ambiente e foi-lhe proposto pela instituição que frequentasse um Curso de Especialização em Ciências do Ambiente para Regentes Agrícolas, criado precisamente para pessoas com essas habilitações. Ao todo, inscreveram-se 15 alunos, “homens maduros”, conta o fadista.
É aqui que as coisas se começam a complicar. Depois de terminar a especialização em 2011, Nuno da Câmara Pereira inscreveu-se na licenciatura de Engenharia do Ambiente em fevereiro de 2012, curso que terminou em novembro do mesmo ano, ao abrigo das equivalências que lhe foram atribuídas: 60 créditos pelo Curso de Especialização, 27 pelo percurso profissional e 103 pelo currículo académico anterior, totalizando 190 créditos – que correspondiam a todas as “cadeiras” da licenciatura. Na prática, Nuno da Câmara Pereira não teve de fazer qualquer avaliação no âmbito da licenciatura em Engenharia do Ambiente.
Ora, o problema é que por decreto-lei a Universidade Lusófona só estava autorizada a atribuir, “no limite”, 125 créditos por equivalência (27 pelo percurso profissional e 98 pelo currículo académico) e não 190 como atribuiu a Nuno da Câmara Pereira. Em 2008, a Comissão Científica do Curso de Engenharia do Ambiente ainda tentou aumentar o limite de créditos atribuíveis e enviou ao reitor da Universidade uma proposta de alteração nesse sentido. Proposta, essa, que nunca foi autorizada pelo reitor daquela instituição, diz o relatório do IGEC.
Também o percurso profissional do fadista foi tido em conta neste processo. A equivalência à cadeira de Microbiologia I, por exemplo, foi conseguida devido à experiência como vice-presidente da Cruz Vermelha Portuguesa e à direção técnica de obras de drenagem em instituição não especificada. Já a cadeira de Processos de Separação foi conseguida, por sua vez, devido a conhecimentos nas culturas de cana de açúcar na Companhia de Açúcar de Angola.
Tal como Nuno da Câmara Pereira, outras 13 pessoas do mesmo curso viram as suas equivalências anuladas – o que, em última instância pode significar a anulação das licenciaturas. No relatório do Ministério da Educação, a informação que consta é a de que o ex-deputado já se mostrou disponível para reintegrar o curso, mas o próprio disse ao Observador que ainda não sabe o que vai fazer. “Depende da proposta que tenham para me fazer, depende das circunstâncias e do tempo que vai durar”, explicou, admitindo um eventual regresso.
O fadista já foi líder do Partido Popular Monárquico e deputado entre 2005 e 2009, quando o PSD resolveu fazer uma aliança com o PPM e o MPT. Em 2013, foi candidato pelo Partido da Nova Democracia à Câmara Municipal de Sintra.