O Google dá jeito nestas alturas. É como aquele amigo que apanha qualquer pergunta que se atire para o ar para dar a resposta. Escreve-se “temperatura” e “São Petersburgo” e, em menos de um segundo, ele mostra um redondo zero. É segunda-feira, hora de almoço em Portugal, meio da tarde naquela parte da Rússia e, ajustando os contextos, o frio que por lá aperta os ossos até nem é assim tão mau. Há piores, a obrigarem os termómetros a serem tão negativos que, a cada ano, o futebol fica quieto durante quase três meses, à espera que o inverno perca força. De repente, o país ganha uns quantos emigrantes.
O frio congela, toca a fugir. A neve e o gelo não combinam com uma bola a rolar na relva e as equipas russas evadem-se do país. Compram passagens aéreas e enfiam os jogadores em aviões que aterram em sítios quentes, onde o inverno é mais um verão que faz os jogadores andarem de manga curta. Era assim que toda a gente do Zenit andou no Algarve, durante duas semanas. A equipa escolheu Portimão para se isolar, todos sentiram o calor e aquecerem as pernas para o que aí vinha antes de o frio deixar o campeonato russo recomeçar — a Liga dos Campeões.
E a estadia que o Zenit São Petersburgo fez no Algarve, entre 28 de janeiro e 7 de fevereiro, interessa porque foi a única mostra de futebol que a equipa teve desde que as bolas pararam de rolar na Rússia. Era preciso sacudir o pó das pernas e André Villas-Boas lá montou uma espécie de segunda pré-época, tentando desenferrujar Hulk, Danny, Axel Witsel, Ezequiel Garay, Rui Neto e dos restantes com jogos-treino. Os russos já não têm uma partida a sério desde 9 de dezembro e aqui entra o Benfica no texto, pois esta será a maior vantagem que os encarnados terão para a primeira mão dos oitavos-de-final da Liga dos Campeões, que se joga esta terça-feira (19h45).
Mesmo com dias consecutivos de treinos puxados, a mandar os jogadores subir uns degraus na intensidade, e com jogos que não contam para nada, contra outras equipas que fugiram com o rabo à seringa invernal (Brondby e Norrköping), o Zenit está sem ritmo competitivo. As palavras que saem da boca dos treinadores nunca são um acaso e daí André Villas-Boas ter dito para os russos “tentarem manter a eliminatória viva, levá-la até São Petersburgo e fazer tudo lá”. Porque mesmo que tenha fugido, é lá que o Zenit tem a ajuda do frio e dos adeptos que fazem a vida negra a quem os visita. Os russos ainda não têm derrotas em casa — a única derrota na competição aconteceu na Bélgica, em casa do Gent. O Estádio Petrovski, em São Petersburgo, ajuda.
Como Hulk. A alcunha que encurtou o nome a Givanildo Vieira de Souza vai com 11 golos e 16 assistências esta época e as bombas que seu o pé esquerdo costuma disparar serão a maior preocupação do Benfica. O brasileiro até já as mostrou, várias vezes, na Luz, onde até marcou um golo da última vez que os encarnados defrontaram o Zenit, na primeira jornada da fase de grupos da época passada. Antes, já ele e Villas-Boas tinham chateado o Benfica em 2010/11, quando foram à Luz com o FC Porto e conquistaram o campeonato e a passagem à final da Taça de Portugal nas barbas dos encarnados. Eram tempos em que Ezequiel Garay ainda jogava no Benfica e Axel Witsel estava em vias de o fazer (lá chegaria na temporada seguinte).
São estas antigas companhias que tocarão o despertador europeu para acordar a equipa de Rui Vitória, depois da derrota no clássico, frente ao FC Porto. Os lisboetas vinham com um embalo de 11 vitórias seguidas antes do duelo com os dragões e um momento que parecia muito bom passou a ser assim-assim. O treinador continua a ter apenas Jardel e Lindelöf para serem centrais e, esta segunda-feira, os jornais desportivos já escreveram sobre a hipótese Nico Gaitán dizer até já à ala esquerda, para fazer de segundo avançado atrás de um primeiro, entre Jonas ou Mitroglou — como aconteceu em Braga, quando o Benfica lá venceu (2-0) para o campeonato.
Poderá ser uma forma de os encarnados terem perto da bola mais gente com bons pés para não a perder. Seria um dos aspetos para o Benfica se impor ao Zenit, que na fase de grupos da Liga dos Campeões foi a sétima equipa que, em média, teve menos companhia da bola: 43,3%, segundo as contas da Opta. Até os israelitas do Maccabi Tel Aviv conseguiram melhor registo e isto não abona muito a favor dos jogadores de Villas-Boas. Tão pouco o facto de os russos serem quem mais vezes perdeu a bola nesta Champions — em média, os adversários roubaram-lhes a bola umas 15,2 vezes por jogo (no Benfica, já agora, foram 13,7 vezes por jogo, o quinto pior registo).
Mas o que pode ser visto como defeito, será apenas a consequência de um estilo de jogo que faz a equipa preferir ataques rápidos que deixem Danny, Shatov ou Hulk à frente da baliza, prontos a rematar. O Benfica tem de ter especial cuidado com o brasileiro e não é preciso dar uso ao Google para perceber porquê.