Não foi Mário Centeno, como os deputados esperavam, mas foi o secretário de Estado do Tesouro, Ricardo Mourinho Félix, a dar explicações no Parlamento sobre o plano de recapitalização e reestruturação da Caixa Geral de Depósitos, a pedido do CDS. Sem grande novidades em relação ao que já era conhecido ao nível da injeção de capital no banco público, o governante congratulou-se pelo facto de o acordo com a Comissão Europeia ter sido conseguido “à primeira” e insistiu, antevendo as críticas, que a reestruturação não implica despedimentos no banco, apenas rescisões amigáveis e reformas antecipadas. Mais: o Governo promete devolver aos contribuintes “mais do que” o dinheiro público agora investido.
“Não é um plano de despedimentos. Um plano de despedimentos tentou o anterior Governo fazer na administração pública. O que preconizamos para a Caixa são rescisões por mútuo acordo e reformas antecipadas”, disse Ricardo Mourinho Félix. PSD e CDS tentaram alegar que a verba disponível para o pagamento de indemnizações com essa redução de pessoal poderia implicar o despedimento acrescido de cerca de “cinco mil trabalhadores”. O Governo afastou o cenário dos despedimentos — que é, de resto, uma linha vermelha afirmada e reafirmada pelo BE e PCP –, mas não avançou números sobre a redução de custos com pessoal.
Sobre os trabalhadores da Caixa, Mourinho Félix admitiu que o plano de negócio acordado “exigirá aos trabalhadores uma forte capacidade de adaptação à mudança”. Mas nada mais disse sobre as implicações que terá a reestruturação do banco. Era este o ponto que os deputados mais queriam ver esclarecido, da esquerda à direita. Começou com a deputada centrista Cecília Meireles, que abriu o debate a questionar o Governo sobre o número de trabalhadores que vão ser dispensados e o número de balcões que vão ser encerrados, continuou com o deputado do PSD Hugo Soares a questionar o Governo sobre “quantos trabalhadores tem a Caixa a mais”, e terminou com o BE e o PCP a garantirem que não apoiaram um plano de negócio que passe por despedir pessoal.
Encerrar balcões e despedir trabalhadores é uma forma de garantir mais negócio a outros bancos privados e é uma forma de os financiar indiretamente”, sublinhou o deputado comunista Miguel Tiago.
Ou seja, nem despedimentos nem fecho de balcões. Isso é ponto assente à esquerda. Para o secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, o plano acordado para o banco público não vai ser só exigente para os trabalhadores mas também para os acionistas, que são os contribuintes. “Os verdadeiros acionistas da Caixa são os contribuintes portugueses, serão eles que, através do seu trabalho, investirão na Caixa até 2.700 milhões de euros”, disse, garantindo de seguida que serão ressarcidos por esse investimento.
“O Governo e a nova administração da CGD comprometem-se a implementar um plano de negócio que permitirá devolver aos acionistas no futuro mais do que aquilo que agora investirão”, disse, não especificando números.
Críticas ao Governo de Passos e ao Banco de Portugal
Antes, contudo, ainda houve tempo para o atual governante apontar o dedo ao anterior executivo PSD/CDS, com Mourinho Félix a acusar o anterior Governo de ter “mascarado” os problemas do setor financeiro, com a complacência do Banco de Portugal e das instituições internacionais. “Uma recessão tão profunda deixou marcas no sistema financeiro. Marcas tanto maiores quanto os problemas do sistema financeiro, que foram mascarados pelo anterior executivo, com a complacência do supervisor e das instituições internacionais”, disse, sublinhando o papel que a Caixa teve no período de “recessão” que Portugal viveu nos últimos anos.
Segundo o secretário de Estado, “nesse período, a Caixa foi o banco de refúgio das poupanças de muitos portugueses e evitou a que se assistisse a uma fuga de depósitos”. Agora, para o governante, o acordo alcançado vai permitir à Caixa “lidar com os ativos improdutivos e assegurar uma adequada cobertura de imparidades”, bem como “orientar a concessão de crédito para os melhores projetos empresariais que criam valor e emprego”, e ainda “criar valor para o acionista”. O objetivo é que o banco estatal seja “autossustentável, como foi no passado”, disse.
Numa crítica à postura do PSD e CDS, também o deputado socialista Carlos Pereira, acusou os partidos da direita de terem um “desejo oculto” de que o executivo de António Costa perca a batalha com Bruxelas relativamente à reestruturação da Caixa Geral de Depósitos. “Há um desejo oculto e uma vontade mal escondida para que o Governo português perca uma batalha com Bruxelas”, disse o deputado.