Alguém que dedicou toda a vida a estudar doenças e as suas origens a discursar num Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas só podia dar numa intervenção do 10 de junho fora do comum. Manuel Sobrinho Simões é médico e investigador e também presidente da comissão organizadora das comemorações e aproveitou o momento para falar de genética e até da responsabilidade de portugueses pela propagação de doenças raras. Isto tudo para concluir que os portugueses têm “uma mistura notável de genes com as mais variadas origens” que pode ser útil para “aproveitar de forma positiva os tempos difíceis que se vivem na Europa e no mundo”, mas também têm pontos a melhorar.

“Não estou a sugerir que há genes portugueses”, disse o médico quase mal começou o discurso e quando descrevia a genética portuguesa, nas cerimónias do 10 de junho que este ano decorrem em dois palcos, de manhã no Porto, mas depois o Presidente da República e o primeiro-ministro seguem para o Brasil, para marcar o dia junto da comunidade portuguesa no país.

“O que nos carateriza geneticamente é que temos uma mistura notável de genes com as mais variadas origens”

Sobrinho Simões até começou com uma explicação para refrear entusiasmos que as suas palavras inicias pudessem provocar face à existência de qualquer gene nacional, elencando doenças que os portugueses acabaram por levar pelo mundo. “Existem doenças que, fruto da diáspora, os portugueses espalharam pelo mundo” e exemplificou com a doença dos pezinhos, mas também com a doença hereditária de cancro da mama.”Doenças raras, transmitidas por genes, mas não os genes portugueses, são genes humanos que por acaso e por azar ocorrem em portugueses. Como temos a tradição enorme de andar pelo mundo fora espalhámos esses genes, que mostram o padrão das nossas migrações”, justificou. Mas logo de seguida explicou a sua exaltação sobre a mistura genética nacional.

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O que nos carateriza geneticamente é que temos uma mistura notável de genes com as mais variadas origens. E se pudesse identificar uma característica quase única entre nós era essa mistura genética”.

E de acordo com os dados históricos, os portugueses deviam “ser mais homogéneos e monótonos em termos genéticos do que os outros povos europeus. Mas não somos, somos de uma extraordinária diversidade genética“, argumentou o fundador do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular e Celular da Universidade do Porto. Falou nos “árabes“, nas “miúdas mestiças que integrámos mais do que os rapazes” para explicar a “diversidade genética” em Portugal que, comparada com o que acontece em Espanha “impressiona pela consistência”: “Há mais linhagem ameríndia [índios americanos], africana e judias no Minho do que na Galiza”.

E toda esta dissertação sobre a genética predominante no país para quê? Para dizer que o “grande capital” do país é ter “as pessoas com estas misturas, em Lisboa como na Serra de Montemuro”, fazendo uma relação direta com o que Portugal avançou em vários domínios: “Na saúde, na ciência na inovação e educação. Somos até já muito competitivos”. Mas com reparos e avisos.

“Temos de ser exemplares, de cima para baixo, na organização social e na seleção das lideranças, o privilégio tem de ser acompanhado de responsabilidade“, alertou. Outro aviso é que “Portugal precisa, cada vez mais, de instituições fortes“, dando como exemplo dos que existem as Forças Armadas e a Igreja”, mas pedindo que existam mais “que criem oportunidades, recompensem o mérito e potenciem a capacidade do saber fazer”. E ainda a necessidade de combater aquele que ainda é um problema, a Educação, com o médico a dizer que existe “meio milhão de portugueses que ainda que escrevem mal”.