Manuel (nome fictício) mora no Restelo. Este ano, ele e a mulher decidiram mudar a filha mais velha, que vai para o 7.º ano, de um colégio privado para uma escola pública. A Escola Secundária do Restelo foi a primeira opção depois de terem ligado para a Direção Geral de Estabelecimentos Escolares (DGESTE) que lhes confirmou que estavam na “área de influência” daquela escola. Tudo certo até há duas semanas, quando perceberam que a filha não tinha entrado e a justificação dada pela escola foi a de falta de cumprimento do critério da residência.
“Fomos surpreendidos com a exclusão da nossa filha e ainda mais surpreendidos quando fomos informados por dois colaboradores que a exclusão se devia a residirmos fora da área de influência da escola”, contou Manuel, ao Observador.
“Foi-nos mostrado um mapa, exposto na biblioteca, diferente do que atempada e oportunamente tivemos ocasião de consultar, por indicação da DGESTE. Um mapa que mostra uma área de influência diferente desse mapa, onde existe uma risca que divide a zona em dois, inventando uma suposta área na zona de influência de outra Escola Básica 2/3 desse agrupamento, por isso, excluída da área de influência da Escola Secundária do Restelo e na área da Paula Vicente”, relatou.
Momentos antes, Manuel já tinha explicado o que lhe foi dito quando ligou para a DGESTE, corria ainda o mês de fevereiro ou março.
“A DGESTE informou-nos, naquela primeira ocasião, mediante indicação da nossa morada e respetivo código postal, que a mesma se encontrava dentro da área de influência da Escola Secundária do Restelo e informou que no site ‘Lisboa Interativa’ se poderia verificar essa informação. A consulta ao site confirmou a informação telefónica, ou seja, que a nossa residência se encontra na área da influência do estabelecimento de ensino”, recordou.
O Observador fez a mesma pesquisa, no referido site, selecionando apenas as escolas secundárias e de terceiro ciclo e as escolas secundárias e, na área do Restelo, não surge qualquer linha divisória entre a Escola Secundária do Restelo (quadrado roxo com círculos no centro, logo acima de onde se lê Restelo) e a Escola Básica 2/3 Paula Vicente (ponto verde mais à direita), como se pode confirmar na imagem abaixo.
Perante esta divergência de informação, os pais voltaram a contactar a DGESTE na semana passada, que repetiu a informação prestada há uns meses e que lhes terá feito chegar um mapa onde a tal linha azul escura que separa as zonas de influência daquelas duas escolas não aparece.
“E é com base no mapa do Lisboa Interativa e com base no e-mail da DGESTE com este mapa que contesto o mapa que está afixado na escola, um mapa impresso da Internet, não coincidente com o recebido da DGESTE, e com uma linha azul feita pela escola”, argumenta Manuel.
De onde surge aquele mapa? Se existe um mapa com uma linha divisória, porque razão não está na Carta Educativa? Porque razão não está no site da DGESTE? Porque razão, repito, não está no site da escola?”, questiona este pai, que já fez chegar a sua reclamação à Inspeção Geral de Educação — que está a analisar a situação –, ao Provedor de Justiça — que já questionou o agrupamento — e fez também uma exposição ao diretor do agrupamento.
“Ora, de acordo com o mapa recebido da DGESTE estamos na área de influência, de acordo com o mapa do Lisboa Interativa estamos na área de influência, mas, de acordo com o mapa afixado na biblioteca da escola, estamos excluídos da área de influência”, rematou Manuel.
Diretor diz que o mapa que está na biblioteca é o mais atualizado
Ao Observador, o diretor do Agrupamento de Escolas do Restelo, Júlio Santos, explica que foi “de propósito” à escola no passado sábado para perceber o problema levantado pelo encarregado de educação. “Pus-me a olhar para isto e percebi qual o problema. Estavam a ver o mapa do 1.º ciclo e não do 3.º ciclo e secundário”.
A área de influência do agrupamento coincide num e no outro. O que acontece é que o mapa que a DGESTE lhe enviou, que é da Câmara, tem os limites das escolas do 1º ciclo daí que não apareça o traço azul. Este mapa, com esta divisão, enviaram-nos em maio de 2015. E o que temos na biblioteca foi montado em cima do da Câmara de Lisboa, trabalhado e ampliado, para o operacionalizar”, explicou.
“Esta escola era muito requisitada e foi preciso criarmos mecanismos de defesa. Pedimos à tutela o mapa para termos a certeza das zonas de influência. Antes não se colocava, porque a Escola Básica Paula Vicente não fazia parte do Agrupamento. Há quatro começámos a tratar do processo e há dois já fazia parte do agrupamento”, explicou Júlio Santos.
Questionado sobre o porquê de essa informação não estar, por exemplo, no site da escola, o responsável disse que está afixada na biblioteca da escola e que pode ser consultada por todos, assim como nos dois anos anteriores.
O diretor confirmou outra das informações denunciadas ao Observador por Manuel, sobre o uso de compasso, mas remeteu essa técnica para o passado. “No início, antes de termos recebido este mapa, usávamos até compasso para ver os que estavam mais perto ou mais longe, para critério de desempate. Mas desistimos. E a verdade é que colocávamos os candidatos da área de residência todos porque sempre me bati por isso e consegui sempre mais uma turma. Conseguíamos sempre o pleno. Era para mim uma satisfação.”
Quanto ao problema das “moradas falsas” dos alunos, Júlio Santos apenas refere que “as leis nem sempre são justas” e que “esta lei tem um alçapão do tamanho de um porta-aviões”, mas que “a tomada de decisão dentro desta escola é, primeiro, de acordo com a lei e, em segundo lugar, a favor das pessoas”. “Posso errar, mas é assim que aqui as coisas funcionam.”
Ministério não comenta o caso
Questionado sobre as divergências entre a informação prestada pela DGESTE e presente no site Lisboa Interativa e aquela que é a informação tida em conta por esta escola na hora da avaliação das matrículas, o Ministério da Educação respondeu que “as referências geográficas à área de influência da Escola Secundária do Restelo adiantadas pela DGESTE e pelo próprio estabelecimento são coincidentes” e que o “referido mapa, que serve de base ao trabalho dos técnicos afetos à Rede de Lisboa, foi elaborado em 2009, em articulação com a Câmara de Lisboa, a então Direção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo e os Diretores das referidas unidades orgânicas”, sendo que “o mapa referente a este Agrupamento não foi sujeito, desde então, a qualquer alteração”.
“É preciso, por fim, ter em atenção que uma coisa é a área de influência do agrupamento e outra são as áreas de cada escola do agrupamento”, explicou o Ministério. Porém, a informação pedida por este pai à DGESTE dizia respeito à área de influência da Escola Secundária do Restelo, em concreto, e não às das escolas primárias daquele agrupamento, pelo que a resposta dada o induziu em erro na hora da matrícula.
A Câmara Municipal de Lisboa não respondeu às questões feitas pelo Observador, até ao momento.
A acrescer a isto o artigo 25.º do despacho das matrículas publicado este ano refere que “compete, ainda, à DGESTE proceder à divulgação da rede escolar, com informação sobre a área de influência dos estabelecimentos de educação e de ensino integrantes da mesma, devendo a divulgação ocorrer até ao dia 30 de junho de cada ano”. Também questionado sobre esta informação e onde podia ser encontrada, fonte oficial do Ministério da Educação respondeu que “as áreas de influência foram definidas conjuntamente pelos serviços do Ministério da Educação, Câmaras Municipais e as escolas” e que “não tendo sido divulgadas alterações das áreas de influência este ano valem as áreas geográficas de influência que já existiam”.