O recém-eleito líder do PSD, Rui Rio, voltou a não excluir a possibilidade de chegar a um acordo parlamentar com o Partido Socialista, caso seja derrotado em eleições legislativas. Em entrevista à RTP, Rio deixou claro que o seu objetivo principal é “ganhar com maioria absoluta”, mas, caso os sociais-democratas percam as eleições, irá procurar garantir que “a dependência da governação não esteja na extrema-esquerda”. “Entre o CDS, o PSD e o PS há traços comuns que o país ganhava muito se fossem aproveitados no sentido do interesse nacional”, declarou Rio.

Questionado sobre as recentes declarações de Manuela Ferreira Leite, que disse que o PSD devia “vender a alma ao diabo para por a esquerda na rua”, Rio falou numa “clubite” dos elementos do partido que dizem que não falam com o PS. “Parece o Porto e o Benfica”, classificou o antigo presidente da câmara do Porto. “Não faço isso sequer ao Bloco de Esquerda e ao PCP, que fará ao PS e ao CDS, que são partidos muito mais próximos.”

Rio, por outro lado, procurou desvalorizar a aparente proximidade com o primeiro-ministro António Costa, que disse esta segunda-feira que “não será difícil” que o seu entendimento com o novo líder do PSD seja melhor do que com o anterior líder, Pedro Passos Coelho. “Se tivesse ganho Santana Lopes, penso que António Costa teria dito o mesmo”, garantiu, sublinhando que as declarações apenas revelam a “relação muito difícil” entre Costa e Passos Coelho.

Também ao falar sobre a campanha eleitoral, Rio explicou por que razão não assumiu uma postura mais beligerante face aos socialistas, admitindo que “dificulta ganhar uma eleição”, mas dá mais liberdade para “fazer o serviço público nos termos em que deve ser feito”. “Sei que esta coisa face ao Partido Socialista do ‘vamos matá-los, vamos esfolá-los’ é popular para o eleitorado que estava em causa”, disse. “Mas as campanhas eleitorais são absolutamente decisivas para os graus de liberdade que temos a seguir”. “É preciso namorar bem para que o casamento dê certo”, ilustrou Rio. “Se se promete à noiva um Ferrari, férias do outro lado do mundo, uma mansão com piscina, e depois casa e não tem nada para lhe dar… O casamento começa logo mal.”

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“No Porto, o que a comunicação social fazia deu-me uma energia enorme”

Rui Rio, que foi presidente da Câmara Municipal do Porto durante mais de uma década, aproveitou também para falar sobre um antigo cavalo de batalha: o da sua relação com o poder “centralizado” na capital. “É curioso, porque em Lisboa dizem que não me conhecem, que não sou uma figura nacional, mas eu ganho as eleições e no dia seguinte são páginas e páginas a falar sobre mim”, afirmou o vencedor das diretas do PSD. Rio utilizou a expressão “corte lisboeta” para se referir à situação de um país “que tem o poder ali muito enquistado todo no mesmo sítio”. “Eu não estou amarrado a interesse nenhum”, reforçou Rio, que destacou o facto de a sua candidatura ter emanado das cidades do Porto e Aveiro.

Sobre a direção do grupo parlamentar — com vários elementos do partido como Ferreira Leite ou José Eduardo Martins a sugerirem que Hugo Soares deveria colocar o lugar à disposição –, Rio sublinhou que esta matéria não deve ser feita “ao cronómetro”. “Com certeza que vamos falar”, disse a sorrir, mas “com calma, sem precipitações”.

Também sobre a possibilidade de já ter em mente nomes para os cargos que terá de nomear ou de estar à procura de entendimentos com elementos da candidatura de Santana, o novo líder adiou decisões para mais tarde. “Nem eu sou fonte próxima de mim mesmo”, disse, numa alfinetada à comunicação social, garantindo que ainda está apenas “a arrumar a cabeça” e a “ouvir algumas pessoas”. “Há elementos dentro do partido que têm sido sub-aproveitados”, acabaria por admitir, acrescentando ainda que pode fazer sentido ir buscar alguns independentes.

Um dos temas mais abordados ao longo da entrevista foi mesmo a relação conturbada de Rio com a comunicação social. O ex-autarca (que à frente da Câmara do Porto alimentou algumas guerras contra jornais como o JN, como recordou o Observador neste especial), rejeitou definir a sua relação com os jornalistas como uma relação de “desconfiança”, preferindo antes assumir-se como “crítico”. “Na Câmara do Porto isso funcionou em pleno, o que a comunicação social fazia deu-me uma energia enorme”, atirou. “Foram tão contra mim que se constituíram como oposição a mim.”

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Rio, no entanto, não antecipa a mesma dificuldade agora porque, diz, no plano nacional “há um pluralismo muito maior”. “O professor Cavaco Silva também tem esse perfil. E não deixou de ser primeiro-ministro [durante] 10 anos com grande sucesso e depois Presidente da República [durante] 10 anos”, relembrou, acrescentando que “Sá Carneiro também era assim”.

Sobre o antigo fundador do partido, Rio aproveitou a oportunidade para o definir — e às suas ideias — como a sua “referência política de sempre”: “Não sou do PSD, sou do partido do doutor Sá Carneiro”, sentenciou.