Há poucos dias fomos surpreendidos pelo primeiro-ministro, António Costa, que justificou a compra pelo Estado português de seis quadros de Maria Helena Vieira da Silva por 5,5 milhões de euros graças à “antipatia das cativações”. O chefe de Governo destacou ainda o “esforço” que foi feito para se poder chegar ao final do ano com condições de fazer esta aquisição, que “marca um resgate, porque depois do resgate que sofremos, merecemos agora resgatar-nos”. E toda esta prosa à volta desta aquisição milionária merece alguns comentários.
Já sabíamos que, depois de 2010, 2016 e 2017 tinham sido anos recordistas de cativações, ficámos agora a saber que o objetivo não foi apenas o de cumprir as metas acordadas com Bruxelas, foi também para comprar estes seis quadros.
Ora, a antipatia às cativações a que se refere António Costa saiu bem cara a cada português nos últimos 2 anos.
Para que o Estado português tivesse condições para comprar estes quadros, houve um país que sucumbiu à estratégia das cativações.
Enquanto o Governo resgatava estes belos quadros, ninguém resgatou o Serviço Nacional de Saúde enquanto aumentavam as listas de espera, a falta de medicamentos nos centros de saúde e hospitais, a falta de dinheiro para pagar o seguro do transporte de medicamentos, a falta de dinheiro para pagar aos bombeiros o transporte de doentes ou a falta de concursos para a colocação de recém-especialistas que levou já a que 200 abandonassem o Serviço Nacional de Saúde e ao caos nas urgências.
Enquanto o Governo resgatava estes belos quadros, ninguém resgatou as escolas que não tiveram dinheiro para pagar a luz e o aquecimento, as escolas com falta de assistentes operacionais colocando em causa a segurança dos alunos e a higiene e conservação dos edifícios ou as escolas onde chove dentro das salas de aula e não há dinheiro para as obras.
Enquanto o Governo resgatava estes belos quadros, ninguém resgatou as Instituições de Ensino Superior enquanto sufocavam com a violação do acordo feito com o Governo no acordo de legislatura ou os milhares de estudantes que ainda aguardam as suas bolsas de ação social para suportar os custos com a sua frequência no Ensino Superior.
Enquanto o Governo resgatava estes belos quadros, ninguém resgatou os milhares de jovens que ficaram à Porta do apoio ao arrendamento jovem, única e exclusivamente por falta de verbas, ficando uma vez mais com o seu futuro adiado, sem que o Estado fizesse alguma coisa para os socorrer.
Enquanto o Governo resgatava estes belos quadros, ninguém resgatou os milhares de jovens à espera de estágios profissionais ou travou a fraude dos estágios em que empresas obrigaram os seus estagiários a entregarem-lhes parte do dinheiro que recebiam ou a pagar os encargos da empresa com a Segurança Social.
Que a aposta na Cultura é essencial, estamos todos de acordo. Mas isso não pode ser, nem a justificação, nem à custa de tudo o resto.
Ficou claro que a prioridade do Governo foi resgatar estes seis quadros. O país e os portugueses ficaram de facto muito melhor por isso. E as perguntas que eu coloco são: quem resgata os portugueses? Quem resgata as novas gerações?
Deputada do PSD