Uma equipa de investigadores do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa descobriu, numa experiência com ratinhos, que determinados glóbulos brancos que protegem o organismo de infeções, também ajudam no desenvolvimento de cancro do ovário. Bruno Silva-Santos, que lidera a equipa, explicou à agência Lusa que “a interação entre dois tipos de células do grupo dos glóbulos brancos” – os linfócitos T gama-delta e os macrófagos peritoneais – “promove o crescimento do cancro do ovário”.
O investigador esclareceu que os linfócitos T gama-delta produzem uma molécula, a interleucina-17, que “vai recrutar” os macrófagos e “levá-los para o sítio do tumor”, causando a formação de vasos sanguíneos que “vão fornecer alimentos ao tumor, que cresce mais depressa”. O coordenador do grupo de trabalho, do Instituto de Medicina Molecular da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, adiantou que o que o tumor faz é “raptar o mecanismo protetor” dos linfócitos T gama-delta e dos macrófagos peritoneais contra infeções e “usá-lo a seu favor”.
Os linfócitos T gama-delta e os macrófagos peritoneais são considerados “muito importantes” para a proteção natural do corpo contra microrganismos, em particular fungos e bactérias.
O que acontece, segundo Bruno Silva-Santos, é que a resposta do organismo “é aproveitada pelo tumor para favorecer o seu crescimento”. Por isso, assinalou, basta extrair do organismo os linfócitos T gama-delta ou a molécula interleucina-17 para travar a progressão do tumor.
“Se tivermos um doente com cancro, o que queremos é impedir o desenvolvimento do tumor. Vamos tirar estas células e esta molécula para impedir o desenvolvimento do tumor. Sabendo à partida que o doente vai ficar mais suscetível a uma infeção fúngica ou bacteriana, controlamos… com recurso a antibióticos”, exemplificou.
Sobre os benefícios terapêuticos da descoberta, Bruno Silva-Santos referiu que já estão a ser testados em ensaios clínicos anticorpos para neutralizar a interleucina-17, responsável pelo desenvolvimento de doenças autoimunes. Os anticorpos, sustentou, podem ser úteis no tratamento – por imunoterapia – do cancro.
O próximo passo da sua equipa é estudar o mesmo mecanismo imunitário em células de humanos e verificar se é visível noutros tipos de cancro, sem ser o do ovário. Bruno Silva-Santos invocou, a este propósito, um estudo recente de cientistas chineses que concluiu que os linfócitos T gama-delta estão associados a um mau prognóstico no cancro do cólon. Os resultados da investigação do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa são publicados na revista Proceedings of the Natural Academy of Sciences.