No Brasil, há uma expressão utilizada para designar quando uma pessoa critica outra sobre um mal de que também padece: “O sujo falando do mal lavado”. Com as devidas diferenças, a frase pode ser utilizada para descrever a comissão especial do impeachment, o grupo de deputados que vai votar esta segunda-feira à noite o parecer que recomenda a destituição de Dilma Rousseff. Segundo dados da agência Lupa e do site Transparência Brasil, atualizados pelo jornal Zero Hora, 35 dos 65 deputados que fazem parte do grupo respondem a inquéritos, ações criminais e cíveis, ou tiveram contas rejeitadas por órgãos de fiscalização ou controlo.
O caso mais grave diz respeito a oito deputados, que são réus do Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta instância do poder judicial do Brasil, responsável por julgar políticos com “foro privilegiado”. É o caso de Paulo Maluf, filiado no PP, ex-prefeito da cidade de São Paulo e ex-governador do estado de São Paulo, condenado pela justiça brasileira por vários crimes, além de ser réu em duas ações penais, uma delas por lavagem de dinheiro.
Segundo descreve o site G1, os deputados Paulo Magalhães (PSD), Benito Gama (PTB) e Édio Lopes (PR) respondem a processos por crimes eleitorais. Washington Reis (PMDB) responde a uma ação penal por crime contra o meio ambiente e associação criminosa; Nilson Leitão (PSDB) por apropriação ou desvio de bens ou rendas públicas; Weverton Rocha (PDT) por violação da lei de concursos públicos; e Júnior Marreca (PEN) por crime de responsabilidade.
De acordo com o jornal Zero Hora, Washington Reis é o deputado que responde ao maior número de processos. Ao total, são 30 processos abertos, dos quais é réu em sete ações penais e cíveis, além de ser indiciado em seis inquéritos e dever explicações ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro em 17 procedimentos por alegadas irregularidades cometidas quando era presidente de câmara da cidade de Duque de Caxias, relata a publicação.
Os processos com a justiça brasileira também afetam o presidente da comissão especial do impeachment, Rogério Rosso (PSD), que é acusado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal por crime contra a administração geral. Jovair Arantes (PTB), relator do parecer que recomendou a continuação do processo de destituição de Dilma Rousseff, também é alvo da justiça. De acordo com o jornal Zero Hora, as contas do deputado nas eleições de 2006 e 2012 foram rejeitadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, além de responder a uma ação civil pública por improbidade administrativa.
Entre os 35 deputados que devem esclarecimentos à justiça brasileira, os partidos PMDB e PP são os que têm mais processos. Dos oito membros filiados no PMDB, sete têm processos abertos. Em seguida, aparecem o PP, com cinco em cinco parlamentares investigados, o PT (quatro em oito parlamentares) e o PSD (quatro em quatro parlamentares).
É de salientar que todos os processos estão em investigação e ainda não houve qualquer julgamento.
Como surgiu a comissão e para onde vai o processo
A 17 de março, foi formada a comissão especial responsável pelo andamento do processo de destituição da presidente do Brasil. Líderes dos 24 partidos com representantes na Câmara indicaram os nomes dos 65 deputados que participam nos trabalhos, em número proporcional ao tamanho da bancada de cada grupo parlamentar. Quanto mais deputados um partido tem no Parlamento, mais membros pode colocar na comissão. PMDB e PT, os maiores grupos parlamentares, contam com oito deputados no grupo
A 4 de abril, o procurador-geral da União, José Eduardo Cardozo, apresentou a defesa de Dilma Rousseff numa sessão para a comissão. Dois dias depois, o relator da comissão, Jovair Arantes, apresentou o parecer favorável à abertura do processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff. Esta segunda-feira, a comissão vota se concorda ou não com o documento, antes de ir a votos no Congresso brasileiro. Segundo uma estimativa do site UOL, pelo menos 34 integrantes da comissão devem votar a favor do afastamento da Presidente da República. O resultado vai ser conhecido a partir de um painel eletrónico, onde os nomes dos deputados deverão aparecer divididos nas colunas “sim” ou “não”.
Após a votação da comissão, o resultado será lido durante uma sessão parlamentar esta terça-feira e publicado no diário da Câmara na quarta-feira. A partir daí, inicia-se a contagem de 48 horas para o início da votação na Câmara dos Deputados. O jornal Folha de S. Paulo relata que o início do debate está previsto para esta sexta-feira e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já afirmou que pretende realizar a votação este domingo.
Em causa estão as chamadas “pedaladas fiscais”, atos ilegais resultantes da autorização de adiantamentos de verbas de bancos para os cofres do Governo para melhorar o resultado das contas públicas.