Não há uma única forma de definir sucesso mas, sem dúvida, que hoje olhamos para este conceito de um ângulo diferente. “Nos anos 90 houve uma explosão de consumismo e os sinais exteriores de riqueza eram fundamentais. O desemprego era uma humilhação”, afirma Aida Chamiça, Executive and Team Coach e a primeira portuguesa a alcançar o nível de certificação MCC (Master Certified Coach) pela International Coach Federation. “Neste campo, o recente período de crise trouxe coisas boas, como por exemplo refletir sobre o que realmente se quer. Atualmente as pessoas são mais livres de ter o seu próprio conceito de sucesso. Deu-se um abrandamento do consumismo pelo consumismo; há hoje uma conexão mais forte entre o que são os desejos das pessoas e a sua concretização”.

Já começam a ser numerosos os casos de pessoas que deixaram os seus empregos estáveis para se dedicarem a um sonho antigo, um negócio próprio ou uma atividade que equilibre melhor os dois mundos: pessoal e profissional. É o caso de Catarina Beato, jornalista freelance que decidiu em 2005 começar a escrever um blogue (diasdeumaprincesa.pt), porque não queria voltar a trabalhar em algo de que não gostasse. Em pouco tempo, a escrita do blogue tornou-se na sua atividade principal e na sua fonte de rendimento.

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Momentos de viragem

A saída de um emprego é hoje vista, mais do que uma infelicidade, uma boa oportunidade para refletir sobre o futuro e uma possível mudança de vida. “À medida que [na sequência da crise] foram ocorrendo mais casos de despedimento, este passou a ser visto como uma oportunidade de mudança. O despedimento deixou de ser visto exclusivamente como algo pessoal, que nos aconteceu a “nós”, para ser encarado como uma medida de gestão que faz parte da dinâmica da economia. As pessoas aproveitaram o momento e começaram a questionar o que era realmente importante para elas. Não quer dizer que seja um fenómeno total, mas noto que as pessoas se sentem mais livres de fazer escolhas que fazem sentido para si, do que para suportar uma determinada imagem. Esta deixou de estar no centro das aspirações dos executivos, que são a realidade que melhor conheço e com quem trabalho”, esclarece Aida Chamiça.

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A própria perceção de fracasso é hoje diferente. Deixou de ser a ideia de perder um cargo com estatuto, a casa, o carro ou as tecnologias de última geração. “Tudo isso foi questionado e reposicionado. Aproximamo-nos, inclusivamente, de poder deixar de usar a palavra fracasso. A própria linguagem se alterou. Hoje fala-se de profissionais em transição e isso permite-nos uma maior liberdade de escolha. É valorizada a capacidade da pessoa definir o seu conceito de sucesso. Não se fala em fracasso, mas em experiências. As experiências que não correm bem são encaradas de outra forma, com uma atitude exploratória e de maior tolerância ao erro”.

Trabalhar, fracassar, trabalhar

Miguel Pina Martins, CEO da fábrica portuguesa de brinquedos Science4You, reconhece bem o valor do erro: “o sucesso varia de pessoa para pessoa, mas uma coisa é certa, para se chegar até ele, é preciso falhar muito”, garante. Aida Chamiça reforça: “nestes novos conceitos de sucesso, a resiliência tem um papel muito importante, assim como a curiosidade parecem ser as competências que fazem a diferença. Tal como criar e reunir competências com outras pessoas. Trata-se de uma dinâmica mais colaborativa, onde o erro faz parte do caminho exploratório”.

Definir um objetivo, focar e trabalhar para alcançar parecem ser determinantes para se chegar onde se quer. No caso de Miguel Pina Martins, há cerca de cinco anos os objetivos da empresa tornaram-se ainda mais claros, levando-a a alcançar outro nível de concretização…e de sucesso.

“É a atitude que faz a grande diferença”, garante a coach. “Em outras alturas eram as competências e qualificações mas, hoje, quem tenha uma atitude de lutar e de compreender o que é valorizado, tem muito mais hipóteses de sucesso”.

Há algumas décadas atrás, o foco estava centrado na carreira profissional. Hoje, a par da mesma necessidade de garantir a sua capacidade financeira, “o foco tende a esbater-se e podemos considerar que o sucesso hoje é aquilo que deixa a pessoa feliz e realizada”.

As novas gerações têm efetivamente um maior desprendimento. De acordo com um estudo da empresa americana de recrutamento Randstad feito em 2016 com trabalhadores millennials (nascidos entre 1980 e 1990) de dez diferentes mercados de todo o mundo, estes são mais exigentes, têm uma melhor noção do que querem, assim como os limites muito claros relativamente ao que estão dispostos a aceitar, dando mais importância à flexibilidade no trabalho do que a um seguro de saúde. “Sentem-se livres para se despedirem e irem viajar, sem grandes problemas”, concretiza Aida Chamiça.

Esta é também a razão pela qual já se identificou um fluxo de pessoas que decide trabalhar no seu projeto pessoal a partir de casa ou usando incubadoras de empresas – espaços onde não só podem trabalhar como relacionar-se com os seus pares e construir uma rede de contactos que lhes permite acelerar as suas ideias, transformando-as em negócios concretos. Até porque a tecnologia já nos permite montar um negócio munidos apenas de um computador e um telefone. Portugal, e sobretudo Lisboa, é frequentemente apresentado como símbolo de empreendedorismo, onde incubadoras, aceleradoras e espaços de coworking se multiplicam. A presença da Websummit pela segunda vez na capital é disso consequência.

Independentemente da forma como podemos defini-lo ou tentar conquistá-lo, o sucesso está intimamente ligado ao conceito de felicidade. E se estivermos disponíveis para a ideia de que há diversas formas de qualquer um dos dois se concretizar, construiremos sociedades também elas mais bem-sucedidas e felizes. Onde as regras existem para nos organizarmos mas também para serem quebradas e levarem-nos para lá do horizonte.

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