As versões britânica e portuguesa sobre a Batalha de La Lys, há 100 anos, que fez cerca de 400 mortos e 6.600 prisioneiros entre as tropas portuguesas não coincidem, com os comandantes de ambos os lados “a trocarem culpas”. Do lado português, a batalha do dia 9 de abril de 1918 em La Lys, na Flandres francesa, em plena Primeira Guerra Mundial, é descrita por Gomes da Costa (que comandou na linha da frente) como um ato de resistência das suas tropas. No seu relatório sobre a batalha, citado pelo historiador Filipe Ribeiro de Meneses na obra “De Lisboa a La Lys”, Gomes da Costa lembra que a divisão que estava na linha da frente (a 2.ª divisão) havia recebido a ordem para abandonar as trincheiras de 9 para 10 de abril.

“Gomes da Costa chamou a atenção para esta enorme coincidência, afirmando que pareciam os alemães estar a par das movimentações que ocorriam nas linhas aliadas”, o que para Ribeiro de Meneses significa que se tenta “ilibar de qualquer responsabilidade pelo estado da 2.ª divisão (que de facto herdara apenas dias antes da batalha)”. À Lusa, o historiador, que falava a propósito do lançamento do livro, referiu que Gomes da Costa nos seus escritos “culpa os civis franceses que residem naquela área, mas que fazem parte de um esquema de espionagem alemão, de passarem informações para os alemães e, por isso, estes atacam no dia preciso em que a divisão iria ser retirada”.

Por seu turno, fontes britânicas acusam “desertores portugueses, soldados portugueses que fogem e que contam tudo aos alemães para receberem um jantar ou serem bem tratados”, afirmou. Regra geral, os britânicos “culpam os portugueses pelas dificuldades encontradas durante a batalha”. No seu diário, o comandante inglês Douglas Haig escreveu que “os homens recuaram, ou, mais precisamente, ‘fugiram'”. Ribeiro de Meneses concluiu: “de facto, os testemunhos britânicos da ação portuguesa durante o 9 de abril não se coadunam com o tom heroico do relatório de Gomes da Costa”.

O general português escreve que a divisão nacional resistiu oito horas: “Não podendo vencer, pôde apenas morrer, o que fez, deixando 50% do seu efetivo no campo de batalha”. Para o exército português, a 2.ª divisão “fez tudo o que dela se podia esperar”. “Forçada a recuar, fê-lo em ordem razoável, salvando-se o grosso da formação graças ao sacrifício de muitos que lutaram até ao último cartucho”, descreve Gomes da Costa.

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Segundo Ribeiro de Meneses, “as baixas britânicas, embora pesadas, são consideradas no âmbito de quatro anos de perdas, as baixas portuguesas sofridas nessas poucas horas representam a maioria das perdas do CEP na frente ocidental”. O CEP, símbolo do esforço de guerra português na frente ocidental, chegou às trincheiras em janeiro de 1917, e após a Batalha de La Lys desapareceu enquanto força organizada. A Primeira Guerra Mundial terminou com a vitória dos aliados em novembro de 1918.

100 anos do atoleiro de La Lys: a história de uma tragédia militar

O centenário da Batalha de La Lys vai ser evocado em 8 e 9 de abril, em França, em cerimónias nas quais estarão presentes os Presidentes de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, e de França, Emmanuel Macron, e também o primeiro-ministro, António Costa.