Empoderamento. É sobre ele a 41.ª edição do mais antigo festival de artes performativas do país. O das mulheres, das minorias étnicas, dos pobres, dos ‘periféricos’, dos marginais. Todos eles cabem nos mais de 20 de espetáculos que o Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI) tem planeados entre os dias 12 e 22 de junho. Porto, Matosinhos, Felgueiras e, pela primeira vez, Gaia e Viana do Castelo são as cidades protagonistas desta edição que, devido ao atraso do financiamento estatal, teve de “empurrar” um espetáculo e uma residência artística para setembro e outubro.

Na sessão de apresentação, Gonçalo Amorim, o diretor artístico do festival, anunciou com orgulho que, apesar de o FITEI “não estar na primeira divisão” dos festivais de teatro, “está a morder-lhe os calcanhares” tendo em conta as “obras de grande qualidade” que apresenta, sempre com a preocupação de não “serem excessivamente caras”.

A programação, que conta com produções de vários países da América do Sul, estreia-se no Rivoli com o “Caranguejo Overdrive”, da brasileira Aquela Companhia. A peça, que conta a história de um apanhador de caranguejos no mangue carioca que é arrastado para a Guerra do Paraguai, vai estar no Rivoli a 12 de junho, às 21h30, e a 13 de junho, às 19h. Depois, migra para a Casa das Artes de Felgueiras a 16 de junho, pelas 21h30.

Gonçalo Amorim, diretor artístico do FITEI

Do México, chega “Mendoza”, de Los Colochos, para apresentar uma “visão muito especial de MacBeth” no contexto da revolução mexicana de 1910, explica o diretor artístico do FITEI. Um espetáculo que foi eleito por unanimidade como o melhor a nível nacional, pela crítica espanhola, e que se estreia em Portugal no Teatro Nacional São João, a 20 de junho pelas 21h, chegando ao Teatro Municipal Sá de Miranda a 22 de junho, pelas 21h30.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A colheita nacional

Das obras portuguesas, Gonçalo Amorim destaca a estreia nacional de “Lulu”, de Nuno M Cardoso. O encenador, que esteve na sessão de apresentação, explica que a tragédia original do dramaturgo Frank Wedekind é uma visão da mulher que tem “mais de 100 anos” e que aborda “o sexo, o dinheiro e como eles alteram a relação entre os seres humanos”. A peça, que esteve censurada durante muitos anos em Portugal, vai estar no Teatro Carlos Alberto entre 13 e 15 de junho, sempre pelas 21h.

Já “Margem”, de Victor Hugo Pontes, parte do romance “Capitães da Areia”, de Jorge Amado, para descobrir “quem seriam os capitães da areia de hoje”. “Esta não é uma história de 1937”, atira o criador, que também esteve na apresentação do programa do FITEI. Foi a partir de testemunhos de jovens institucionalizados da Casa Pia de Lisboa e do Instituto Profissional do Terço que nasceu a obra, em que os protagonistas são jovens “privados do ensino, da alimentação, de carinho, de um pai, de uma mãe por razões que muitas vezes lhes são alheias”. Para ver no Teatro Campo Alegre, a 16 e 17 de junho, pelas 17h.

“Margem”, de Victor Hugo Pontes

Destacam-se ainda “Provisional Figures: Great Yarmouth”, de Marco Martins, e as obras das quatro encenadoras Sara Barros Leitão, Ana Luena, Raquel S. e Diana de Sousa, que vão estrear as suas peças no festival. Pós-colonialismo, feminismo e transsexualidade são outros dos temas abordados pelos vários espetáculos que constituem a programação do FITEI, numa edição que também se preocupa em estabelecer pontes com companhias descentralizadas, como é o caso do Teatro Didascália (Braga) e do Teatro do Noroeste (Viana do Castelo).

Em setembro, “Correo”, da chilena Paula Aros Gho, ocupa o Convento Corpus Christi de Gaia, nos dias 14 e 15, pelas 21h30 e, em outubro, Federico León voa de Argentina para Portugal para uma residência artística entre os dias 7 e 14, tempo durante o qual vai trabalhar com atores portugueses para que a obra do encenador seja estreada no FITEI de 2019.

Apesar dos atrasos, FITEI triplicou apoios

Depois de “meses muito complicados para as artes nacionais e para as instituições culturais e companhias da cidade do Porto”, Tiago Guedes, o diretor artístico do Teatro Municipal do Porto, elogia a militância artística de Gonçalo Amorim. E há razões para isso. O FITEI foi uma das entidades que cuja candidatura ao apoio da Direção-Geral das Artes (DGArtes) foi, inicialmente, negada. Mas o setor protestou e os resultados foram reavaliados. No final da saga, o FITEI acabou por conseguir um apoio de 203 mil euros, menos 35% do valor inicialmente pedido. “É sempre humilhante falar da precariedade”, explica Gonçalo Amorim, que não entende “como é que o festival só vai receber apoios da DGArtes para dois anos”, quando já estão estabelecidas as parcerias com as câmaras e as instituições culturais para os próximos quatro.

Além disso, o atraso do financiamento estatal, como já foi mencionado, causou moça: dois dos eventos do FITEI passaram para setembro e outubro, visto que só nessa data é que o festival conseguirá pagar aos artistas internacionais.

Ainda assim, com o apoio reforçado da Câmara do Porto a atingir os 110 mil euros, o FITEI tem nesta edição “o triplo do valor que tinha em apoios”, em comparação com o ano passado. “Apesar de tudo, é um orçamento que nos permite estar desafogados e pensar no futuro”, admite o diretor artístico. Em 2019, já estão garantidos 224 mil euros por parte da DGArtes.

TEP e FIMP com apoio da Câmara, Seiva Trupe em perigo

Já o Teatro Experimental do Porto (TEP) não teve a mesma sorte. No ano em que assinala 65 anos de história, a companhia vê-se fora da lista definitiva das estruturas que vão ser apoiadas pela DGArtes. Gonçalo Amorim, que também é o diretor artístico do TEP, considera a decisão “totalmente incompreensível e injusta” e admite recorrer a “todos os mecanismos jurídicos” contra os cortes.

O Presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira

Tanto o TEP como o Festival Internacional de Marionetas do Porto, que também se manteve inelegível nos resultado finais anunciados pela DGArtes, estariam ameaçados se não fosse o apoio da Câmara Municipal do Porto. Rui Moreira anunciou esta quinta feira que vai ser concedido “apoio de emergência durante os próximos dois anos” a ambas as companhias -– uma medida que será aprovada na próxima reunião de Câmara e que vai disponibilizar 70 mil euros/ano a cada companhia, um valor semelhante ao que foi atribuído pela DGArtes no ano passado.

Um processo que, afirma o autarca, “seria muito mais simples se já tivéssemos a Empresa Municipal de Cultura do Porto, tal como já existe em Braga e Lisboa” – uma proposta que levou um chumbo Tribunal de Contas ao qual a Câmara do Porto vai recorrer.

Por sua vez, a companhia Seiva Trupe, que há dias anunciou o cancelamento de uma peça por falta de apoios, vê-se para já sem qualquer apoio da DGArtes e da Câmara. Rui Moreira revela que a companhia ainda não requisitou o apoio da autarquia, mas adianta que “a lógica que [levou a Câmara a apoiar] as duas instituições” advém do facto de tanto o TEP como o FIMP “terem coproduções programadas com o Teatro Rivoli”: “Se elas desaparecessem, ficávamos subitamente com um problema de conteúdo.”