Na sexta-feira de manhã, Andy Murray dirigiu-se aos jornalistas e ao mundo e anunciou que irá terminar a carreira este ano. “A dor é demasiada”, explicava o tenista escocês, que viu uma lesão na anca limitar-lhe os últimos anos de competição e colocar um ponto final antecipado num percurso que o levou ao número 1 do ranking ATP, a cinco vitórias no Open da Austrália, duas em Wimbledon, uma em Roland Garros e outra no Open dos Estados Unidos. Esta segunda-feira, naquela que poderá ter sido a última partida da carreira, Andy Murray lutou durante mais de quatro horas para seguir em frente no Grand Slam australiano. Mas perdeu.

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O tenista é atualmente o número 230 do ranking; Roberto Bautista Agut, o opositor, é o atual número 23. O pico de forma em que os dois atletas se encontram não podia ser mais díspar e polarizado, o que levava a crer que o espanhol não precisaria de muito mais do que duas horas para eliminar Andy Murray do Open da Austrália. O escocês, porém, obrigou o adversário a uma batalha de quatro horas e nove minutos onde completou os últimos jogos do derradeiro set em visíveis dificuldades físicas. Com os parciais de 6-4, 6-4, 6-7 (5), 6-7 (4) e 6-2, Agut venceu — mas foi Murray quem saiu do court de Melbourne enquanto vencedor. Com a mãe e o irmão presentes nas bancadas, o tenista de 31 anos voltou a não conseguir conter as lágrimas na entrevista pós-jogo e garantiu que irá fazer “todos os possíveis” para tentar despedir-se da carreira e do ténis em Wimbledon, em julho.

“Isto foi incrível. Muito obrigada a todos os que vieram. Honestamente, adorei jogar aqui ao longo dos anos. É um sítio fantástico para jogar ténis. Se este foi o meu último jogo, esta foi uma forma fantástica de terminar. Dei literalmente tudo o que tinha. Não foi o suficiente, por isso parabéns ao Roberto e à equipa dele. Talvez vos volte a ver. Farei todos os possíveis para tentar. Se eu quiser voltar, vou ter de fazer uma grande operação onde não tenho garantias de que possa regressar. Mas vou fazer a minha melhor tentativa”, disse Andy Murray, que terminou as breves palavras com uma grande ovação por parte do público presente, que não deixou o recinto até o tenista recolher ao balneário.

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Depois das palavras de Roberto Bautista Agut, que defendeu que Murray “merecia aquela atmosfera” e agradeceu ao tenista por “tudo o que fez pelo ténis”, a organização do Open da Austrália passou um vídeo de homenagem composto por várias mensagens de amigos, colegas e rivais. De entre dezenas de personalidades do ténis e do desporto em geral, destacam-se Roger Federer, que congratulou o amigo por uma “carreira fantástica”, Novak Djokovic, que recordou que conhece o escocês desde os 12 anos, e ainda Rafael Nadal, John Isner, Nick Kyrgios, Alexander Zverev e Caroline Wozniacki, que além de ter revelado que Murray “tinha sempre as melhores piadas”, ainda o convidou para a treinar.

Andy Murray ainda não se despediu de forma oficial e pretende fazê-lo em Wimbledon, em casa, junto ao seu público. Mas John O’Donnell, o cirurgião que já o operou à anca no passado, garante que será “muito difícil”. “Não digo que seja impossível, mas será muito difícil. O Andy tem tentado muito e tem explorado todas as opções que tenham alguma possibilidade de ajudar. De forma realista, não acho que exista qualquer forma de preservar a anca e melhorá-la para que consiga continuar a jogar. Isso não vai acontecer”, explicou o médico em entrevista à BBC Radio 5. O’Donnell lembrou ainda que, mesmo tendo em conta que se trata de Wimbledon e que seria o último torneio, o tenista poderá não contar com a motivação habitual, já que já decidiu que irá colocar um ponto final na carreira.

Murray com Nick Kyrgios, que o considera um “tenista inacreditável”

“Idealmente, ele quereria jogar em Wimbledon, mas imagino que quando se toma a decisão de que se vai parar, torna-se muito difícil continuar com a reabilitação, o exercício contínuo e a convivência com a dor. Quando vemos o fim no horizonte, acho que se torna mais difícil ficar motivado”, disse o cirurgião do tenista. Quem também comentou o fim da carreira de Andy Murray foi Nick Kyrgios, o rebelde tenista australiano que é conhecido pelo mau feitio dentro e fora dos courts, mas que recorreu ao tom mais sério para falar sobre o amigo que o acolheu “debaixo da sua asa”.

“A primeira vez que me cruzei com o Andy ele destruiu-me num encontro em Toronto. Desde aí que trocamos mensagens e saímos juntos. Parece que o conheço desde sempre (…) Quando joguei contra ele as primeiras vezes, senti-me um puto no court. Já ia batido para o campo. Quando jogava contra o Federer ou contra o Rafa, não me assustava tanto. Mas o jogo do Andy é muito mais duro para um tipo como eu. Porque eu sabia que não conseguia fazer jogadas longas com ele e que não durava muito. Adorava ter jogado contra ele com ele no seu melhor e eu no meu melhor, como estou neste momento. (…) Estou sempre a dizer-lhe: ‘Meu, és tão melhor que o Djokovic, devias ter uma carreira melhor’. Estou sempre a chateá-lo com isso. É mesmo azar que o corpo dele o tenha deixado mal”, escreveu Kyrgios numa carta publicada no The Guardian.

Andy Murray vai terminar a carreira. Seja agora ou em julho, em Wimbledon, um dos melhores tenistas do século XXI foi vencido pelas lesões e vai deixar os courts muito antes de ter feito tudo aquilo que tinha para fazer. O escocês com laivos ruivos e pouco cabelo, o “tenista inacreditável”, como diz Nick Kyrgios, perdeu em quatro horas e nove minutos aquela que poderá ter sido a sua última batalha.

“A dor é demasiada”: em lágrimas, tenista britânico Andy Murray anuncia abandono da carreira este ano