Joelhos, tornozelos e anca são as articulações mais afetadas pelos desportos de impacto elevado, como o futebol, e em que a única saída para fintar a incapacidade passa, frequentemente, pela sua substituição total através de próteses.
Henrique Jones, médico especialista em medicina desportiva e ortopedia, explicou que a prática desportiva provoca uma “agressão mecânica” que, juntamente com a predisposição genética e lesões anteriores, formam uma “mistura explosiva”.
“A gonartrose, uma das lesões mais graves e prevalentes nos jogadores de futebol, é o desgaste da articulação do joelho, em que a cartilagem, que é o tecido protetor do joelho, se degrada completamente e muitas vezes desaparece, deixando o joelho sem proteção”, detalhou o médico, reconhecendo que pode provocar dor incapacitante, deformação do joelho, derrames e até mesmo dificuldades em andar.
O impacto sofrido pelas articulações, associadas à genética e ao aumento do peso no final da carreira, está ligado à incidência destas lesões altamente incapacitantes. Perante esta leitura, o antigo médico da seleção portuguesa desenvolveu um estudo, tendo como amostra os internacionais das décadas de 1970, 80 e 90, e chegou à conclusão de que existe uma percentagem “importante” que hoje tem graves problemas articulares.
Entre os mais de 200 atletas referenciados, o especialista em medicina desportiva revelou que mais de 30% já tem alterações graves nas suas articulações da anca ou do joelho, e quase 7% já tem próteses.
Estes são dados que revelam que, entre os jogadores de futebol, existe uma prevalência deste tipo de lesões muito acima da registada na população em geral. Um ex-profissional de futebol tem cerca de cinco vezes mais tendência para ter artrose do que o cidadão comum, e tem duas a três vezes mais tendência a ter uma prótese do que um cidadão comum”, atestou
Perante esta constatação, é fundamental que durante a carreira se deva sempre ter em conta o futuro, o que, admitiu, muitas vezes não acontece. “A prevenção começa quando os atletas ainda estão no ativo. Se formos ver alguns atletas dos anos 1970, 80 e 90, as técnicas eram diferentes e muito mais amputadoras. O menisco, por exemplo, não era preservado, os suplementos de reforço ligamentar não eram os que temos hoje e havia um descuido no trabalho de ginásio e fortalecimento muscular. É natural que esses atletas tenham lesões graves, alguns deles inclusivamente sujeitos a substituições articulares por próteses”, referiu.
Além do problema médico, o ortopedista lembrou que há uma outra dimensão, tão ou mais grave do que a clínica, e que muitos desvalorizam: a social. “Este é um problema social e psicológico, porque quando um atleta acaba a carreira as luzes da ribalta se apagam, os amigos vão-se embora e os médicos também se afastam. Por isso, sinto-me na obrigação de dizer que existe este problema e que estes atletas têm de ser apoiados, pois os que hoje precisam de ajuda são os mesmos que deram o seu contributo à seleção nacional e foi o futebol que lhes marcou as articulações”, advertiu.
Com a evolução da medicina, o antigo médico da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) notou a alteração dos protocolos de tratamento, nomeadamente no aumento do tempo de recuperação e na preservação de certas estruturas ligamentares, apesar de alguns aspetos serem imutáveis.
“Desde sempre, a primeira pergunta que um atleta faz ao médico quando se lesiona é “quando posso voltar a jogar?”. Isso é intemporal. Hoje em dia somos muito mais cautelosos, sobretudo em alta competição, e costumo dizer que a culpa da primeira lesão é derivada de fatores externos ou fatores intrínsecos ao atleta, mas a culpa de uma segunda lesão, caso não sejam respeitados os prazos de recuperação, já é de quem permitiu que o atleta regressasse”, rematou.