A ministra da Saúde, Marta Temido, admitiu esta sexta-feira que a tutela “acompanha com elevada preocupação” o facto de quase 40% dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) terem indicado ruturas diárias no fornecimento de medicamentos.

Em declarações aos jornalistas em Gondomar, no distrito do Porto, Marta Temido, afirmou que o Ministério da Saúde está “atento” à situação e foi por isso que, disse a governante, “no passado mês de agosto elaborou uma proposta que depois se transformou numa resolução do Conselho de Ministros”.

“[A proposta é] para um sistema mais rigoroso e mais responsável de todos os intervenientes no setor do abastecimento relativamente ao circuito do medicamento”, disse Marta Temido.

Segundo um estudo da Ordem dos Farmacêuticos, Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares e Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, quase 40% dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) têm diariamente ruturas no fornecimento de medicamentos, enquanto em outros 30% as ruturas ocorrem semanalmente. Este estudo, tornado agora público, foi feito com base em questionários que foram respondidos em outubro por metade das unidades do SNS.

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Os preços “excessivamente baixos dos medicamentos genéricos” são a causa mais importante identificada pelos hospitais para as ruturas de fornecimento. Estas ruturas são muitas vezes resolvidas com recurso à importação.

Na sequência da apresentação destes dados, a Associação dos Administradores Hospitalares já propôs que os hospitais do SNS criem parcerias com centros de saúde e farmácias para permitir aos doentes levantar os medicamentos de uso hospitalar mais próximo de sua casa.

“Não faz sentido que um doente de Bragança, seguido no São João, por exemplo, tenha de ir ao Porto levantar um medicamento. Faz sentido que os hospitais tenham parcerias em outras unidades do Serviço Nacional de Saúde, sejam outros hospitais ou centros de saúde, bem como com farmácias, mais perto da casa das pessoas”, defendeu o presidente da Associação, Alexandre Lourenço, em declarações à agência Lusa.

Confrontada com esta ideia, Marta Temido disse que “os medicamentos de cedência obrigatória por farmácia hospitalar tradicionalmente só podem ser levantados em farmácia hospitalar”, mas apontou que o Ministério tem como objetivo “colocar os medicamentos mais próximos da residência dos doentes”.

“O que verificamos é que evolução da própria técnica exige menos consultas hospitalares. Logo os doentes precisam de ir ao hospital para levantar medicamentos e não já para a habitual consulta de seguimento. O que é objetivo é colocar os medicamentos mais próximos da residência dos doentes. Isso já está a acontecer em algumas áreas do país, em projetos piloto, em projetos de articulação entre hospitais e centros de saúde e é um trajeto que vamos aprofundar”, disse a governante.

Ex-secretário de Estado da Saúde denuncia “campanha organizada” sobre alegada falta de acesso a medicamentos.

O ex-secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, acusou esta sexta-feira empresas farmacêuticas e responsáveis de organizações médicas de se envolverem numa campanha para “montar alarmismo” sobre a alegada falta de acesso de portugueses a medicamentos inovadores para o cancro.

Na abertura do Fórum do Medicamento, que esta sexta-feira decorre em Lisboa, Francisco Ramos disse que nas vésperas das eleições legislativas de 6 de outubro se assistiu a uma “campanha organizada com a colaboração de empresas e responsáveis de organizações médicas” com o intuito de “montar algum modelo de alarmismo”, dando a entender que os portugueses não estavam a ter o melhor acesso aos medicamentos inovadores.

O ex-secretário de Estado da Saúde, que deixou o anterior Governo há cerca de um mês, referia-se a notícias divulgadas antes das eleições em que médicos denunciavam dificuldades no acesso a fármacos inovadores na área oncológica, apontando barreiras à Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed).

Para Francisco Ramos, o estudo que será esta sexta-feira divulgado no Fórum do Medicamento sobre acesso aos medicamentos hospitalares vem “aparentemente desmentir as dificuldades no acesso” à inovação.

Não só os casos não aprovados [pela Autoridade do Medicamento] são residuais como o tempo entre o pedido (de utilização excecional de um medicamento) e a compra é relativamente curto”, afirmou.

Segundo o Índex Nacional de Acesso ao Medicamento Hospitalar, no que respeita a medicamentos inovadores, mais de 80% dos pedidos de autorização excecional de fármacos feitos pelos hospitais foram aprovados pelo Infarmed no ano passado. Assim, a maioria dos hospitais utiliza medicamentos inovadores ainda sem autorização de introdução do mercado ou já com autorização, mas sem a decisão de financiamento.

O estudo aponta para uma taxa de aprovação pela Autoridade do Medicamento — Infarmed entre os 80% e os 89%.

No ano passado, o Infarmed aprovou 89% dos pedidos de autorização de uso excecional de medicamentos inovadores que ainda não tinham autorização de introdução no mercado (foram aprovados 238 dos 279 pedidos iniciados pelo médico). A título de exemplo, o caso do medicamento para a bebé Matilde, com atrofia muscular espinhal, insere-se nestes pedidos de excecionais antes da autorização de introdução no mercado.

Mais pedidos de autorização excecional surgem da parte dos hospitais na fase em que o medicamento já está aprovado no mercado, mas ainda não tem decisão de financiamento pelo SNS.

De 1778 pedidos feitos por médicos no ano passado, foram submetidos ao Infarmed 1.739 e aprovados 1.494, tendo sido indeferidos 236.

O estudo que é esta sexta-feira apresentado conclui ainda que a complexidade dos processos, a falta de recursos humanos e a lentidão dos processos e de cabimentação são os maiores desafios à introdução de novos medicamentos.