É o sexto país mais pequeno do mundo (com apenas 176 quilómetros quadrados), tem um dos níveis de vida mais altos e um monarca com poderes praticamente absolutos — e que determina os destinos de quase 38 mil pessoas. Não, não estamos a falar de um país longínquo, mas de um principado aqui mesmo no centro Europa, entre a Áustria e a Suíça: o Liechtenstein, que este ano celebra o 300.º aniversário.

É o príncipe Alois, de 51 anos, quem rege o principado. Está no trono desde 2004, ano em que o pai, Hans Adam II, lhe passou o testemunho, embora ainda se mantenha como príncipe, o título mais alto (o filho é o regente). A Constituição do país dá a Alois amplos poderes, como nomear juízes, demitir os membros do executivo ou vetar as leis que não sejam do seu agrado. E tanto o pai, como o filho, não se inibiram de o fazer.

Hans Adam (à esquerda) com o Papa Francisco e o filho, Alois

Nos últimos anos, houve duas ameaças de demissão. Em 2003, Hans Adam garantiu que deixaria o trono caso não fosse alterada a Lei Fundamental de forma a que os seus poderes fossem reforçados, por considerar que, se tal não acontecesse, não poderia governar eficazmente. Certo é que foi apoiado pela maioria dos cidadãos do país: dois terços apoiaram o príncipe nas urnas. “Devemos ser o primeiro país que decide votar para voltar à Idade Média”, disse, na altura, o líder do Partido Democrata, que fez oposição a Hans Adam, Sigvard Wolhend.

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Em 2012, nova ameaça. Desta vez depois de um movimento de cidadãos ter obtido as assinaturas necessárias para que fosse referendada a descriminalização do aborto até às 12 semanas (em Portugal, é legal até às dez semanas). A proposta enfureceu Alois, católico convicto. O regente avisou que vetaria qualquer lei que levasse a ideia adiante. E ganhou.

O príncipe Alois com a esposa, Sofia, no funeral do grão-duque João do Luxemburgo, em maio de 2019

O movimento de cidadãos voltou ao ataque e promoveu novo referendo. Só que agora sobre se o príncipe deveria ou não ter direito a vetar as leis do Parlamento. Alois não esperou: garantiu que deixaria a coroa se deixasse de ter tal poder. Resultado? 76% dos cidadãos apoiaram o monarca nas urnas.

Fortuna de 3.200 milhões de euros: da herança, aos investimentos financeiros

No pequeno Liechtenstein, a dinastia tem uma fortuna avaliada pela Forbes em, pelo menos, 3.200 milhões de euros, uma das mais elevadas entre os monarcas europeus. De onde vem o dinheiro? Da herança familiar, dos investimentos num banco privado, o LGT Group, de várias propriedades no principado e em países no centro da Europa e das famosas vinhas do Liechtenstein. Hans Adam possui ainda uma das coleções de arte particulares mais importantes do continente europeu, com obras de pintores como Rembrant, Rubens e Rafael.

Hans-Adam II e a mulher, a princesa Marie

A família real é discreta nos meios de comunicação social e conservadora. Enquanto que nas restantes monarquias da Europa, os pretendentes ao trono casam com plebeus ou plebeias (são disso exemplo William e Harry no Reino Unido ou Alberto II, no Mónaco), no Liechtenstein, a tradição manteve-se. Casamento? Só entre pessoas de “sangue azul”. O próprio Alois deu o nó com a duquesa Sofia, bisneta do último rei da Baviera, Luís III. E o seu pai, Hans é casado com a prima em segundo grau, Marie Aglaë. Já a irmã do regente, Tatiana, esteva “prometida” ao agora Rei Filipe de Espanha no final dos anos 90.

Criado em 1719, há precisamente 300 anos, pelo imperador Carlos VI, o Liechtenstein é constituído por territórios que fizeram em tempos parte do Sacro Império Romano-Germânico.  Três séculos depois, há coisas que não mudaram. Como uma lei que impede as mulheres de ascender ao trono. “Não seria fácil mudar um sistema que se provou eficaz durante séculos”, respondeu certa vez Alois, quando questionado sobre o assunto.