Um abaixo-assinado a favor do respeito pela objeção de consciência dos pais que não queiram que os seus filhos frequentem a disciplina escolar de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento (ECD) juntou perto de 100 personalidades entre a direita e setores conservadores, como o ex-Presidente Aníbal Cavaco Silva, o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho ou o cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente.
O abaixo-assinado surge na sequência do caso de irmãos de Vila Nova de Famalicão, com 12 e 14 anos, que foram inicialmente impedidos de progredir para o 7º e o 9º ano, respetivamente, por não terem frequentado as aulas de ECD, do Agrupamento de Escolas Camilo Castelo Branco, por decisão dos seus pais.
As crianças em causa não frequentaram qualquer aula daquela disciplina (onde se fala de temas tão díspares como direitos humanos, igualdade de género, sexualidade, media ou mundo do trabalho) no 6º e no 8º ano, respetivamente. Inicialmente, o Conselho de Turma acabou por aprovar os alunos. Porém, essa decisão foi mais tarde dada como revertida, por se entender que não reter os alunos violava a lei — já que eles não tinham frequentado nenhuma aula de ECD. Foi ainda proposto aos encarregados de educação dos dois alunos que eles frequentassem um plano de recuperação à disciplina — hipótese que os pais rejeitaram.
Perante aquela recusa, e mantendo o retenção à disciplina de ECD sem qualquer presença em aula, a escola “chumbou” os dois alunos com efeitos retroativos — obrigando-os a começar o ano letivo de 2020-21 no 6º e 8º ano, respetivamente, apesar de já terem progredido para o 7º e 9º. Esta decisão foi entretanto suspensa pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que aceitou uma providência cautelar interposta pelos pais daqueles dois alunos.
Porém, este desfecho mais recente não demoveu os quase cem signatários de um abaixo-assinado lançado pelo professores da Universidade Católica Manuel Braga da Cruz e Mário Pinto, este último deputado à Assembleia Constituinte de 1975 pelo PSD.
No abaixo-assinado, lê-se que é “imperativo que as políticas públicas de educação em Portugal respeitem sempre escrupulosamente, neste caso e em todos os demais casos análogos, a prioridade do direito e do dever de as mães e pais escolherem ‘o género de educação a dar aos seus filhos’, como diz, expressamente por estas palavras, a Declaração Universal dos Direitos Humanos“. O abaixo-assinado cita também vários artigos da Constituição da República Portuguesa, entre eles o artigo 43, onde se lê que “o Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas”.
Velha e nova guarda da direita, Igreja e Universidade Católica, um ex-PR, um ex-PM e um PS. Quem assinou?
Entre os assinantes, aquele que desempenhou cargos mais cimeiros foi o antigo primeiro-ministro e também ex-Presidente da República Aníbal Cavaco Silva. Da orla do atual Presidente da República, consta o nome do jurista e historiador António Araújo, que é assessor de Marcelo Rebelo de Sousa.
Outro ex-primeiro-ministro presente é Pedro Passos Coelho, que é acompanhado naquela lista por outras personalidades por ele lideradas no Governo. É o caso do ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Rui Machete, além do antigo secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Parlamentares Pedro Lomba e do ex-deputado social-democrata Miguel Morgado, que foi assessor político de Pedro Passos Coelho.
Também do PSD, mas longe da esfera do passismo, estão pessoas como a ex-ministra das Finanças e antiga presidente do partido Manuela Ferreira Leite, tal como o ex-ministro da Educação e antigo presidente do Conselho Nacional de Educação, David Justino, que é atualmente vice-presidente do PSD.
Mais à direita, do CDS, surgem nomes como o antigo ministro do Ultramar e ex-Presidente centrista Adriano Moreira, o ex-Presidente José Ribeiro e Castro e também o ex-ministro das Finanças António Bagão Félix.
À esquerda, apenas um nome: o deputado Sérgio Sousa Pinto.
Surgem também nomes da Igreja Católica: o bispo de Aveiro, D. António Moiteiro e o cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente.