Os sinais de alarme soaram quando, esta manhã, o Governo teve acesso aos números de novos casos que constariam do boletim diário da DGS, o que, juntando-se a outros indicadores, foi suficiente para o Governo pôr em marcha uma nova de estratégia — que até surpreendeu alguns dos membros do Executivo na sala. A ordem agora é para apertar a malha às restrições que já estavam em vigor mas que, com o “cansaço natural”, começaram a ser descuradas, e agravar as multas para os incumpridores. Ou seja, travar o contágio antes de entupir os hospitais. Tudo mudou em poucas horas. E foi António Costa quem apareceu para dar a cara.

O Conselho de Ministros reuniu-se esta manhã e, depois de ser confrontado com os números das últimas 24 horas (ainda não revelados), juntando a outros sinais que se vinham avolumando, decidiu elevar o estado de prontidão em todo o território nacional para “estado de calamidade” (em vez do atual estado de contingência). Tudo para poder ter mais instrumentos e mecanismos de restrição ao seu dispor — nomeadamente a possibilidade de restringir a circulação das pessoas, que poderá aplicar a partir de agora quando o entender necessário. Acima do estado de calamidade só mesmo o estado de emergência, que o Governo também não descarta vir a aplicar se for caso disso. No final, foi o primeiro-ministro que decidiu falar aos jornalistas para dar maior solenidade ao momento. O aviso é claro: não facilitar porque a “evolução da pandemia em Portugal é grave”.

A decisão final surpreendeu até alguns membros do Governo. No dia anterior, como deram conta o Observador e o jornal Público, o Governo não previa “alterações significativas” ao estado de contingência, muito menos previa agravar o estado de alarme nacional. Mas, ao que o Observador apurou, terão sido os números de novos casos de infeção — entretanto conhecidos  — que fizeram o Governo repensar a estratégia. Era preciso agravar o tom da pedagogia, pedir aos portugueses que não cedessem ao cansaço e que mantivessem as regras apertadas para a situação, que é “grave”, não se vir a agravar ainda mais. É que a economia nacional não comporta mais nenhum confinamento restritivo como o que aconteceu em março, vai lembrando o primeiro-ministro.

As novas regras são estas:

  1. O Governo vai propor ao Parlamento, ainda hoje, a obrigatoriedade do uso de máscara na via pública “sempre que necessário”. Ou seja, sempre que haja pessoas a cruzar-se na via ou que estejam pessoas próximas num raio aproximado de 200 metros. A medida vai ser entregue à Assembleia da República através de proposta de lei (o Governo podia legislar sobre isso sozinho mas optou por pôr à consideração da Assembleia) e serão os deputados que vão decidir se aprovam ou não.
  2. Os ajuntamentos na via pública que estavam limitados em todo o país a 10 pessoas (exceto nos locais nas proximidades dos estabelecimentos de ensino onde a limitação era de 4) vão agora reduzir-se em todo o país para 5 pessoas.
  3. Os ajuntamentos em eventos familiares como casamentos ou batizados vão passar a estar limitados a 50 pessoas.
  4. Festas académicas proibidas.
  5. Multas vão ser agravadas para 10 mil euros nos casos dos estabelecimentos comerciais e restaurantes. E a fiscalização vai apertar, não só nos estabelecimentos comerciais, como também ao nível do cumprimento das regras individuais de não consumo de álcool na via pública ou da limitação aos ajuntamentos.
  6. O Governo vai ainda propor à Assembleia da República, na mesma proposta de lei sobre o uso de máscara na rua, que a aplicação StayAway Covid venha a ser obrigatória “em contexto laboral, escolar e académico, nas forças armadas e forças de segurança e no conjunto da Administração Pública”.

O primeiro-ministro não descartou vir a adotar mais regras, nem sequer descartou uma nova passagem para a situação de estado de emergência, deixando claro que o Governo não vai hesitar em “tomar todas as medidas que venham a considerar-se necessárias em cada momento”. Essa análise vai continuar a ser feita de 15 em 15 dias. O que o Governo não quer é que a economia volte a paralisar, porque isso agravaria de forma incalculável a crise social e económica que já se verifica.  

Daí pedir que os portugueses se motivem “na prioridade de preservar a capacidade do SNS e de assegurar que as atividades letivas prosseguem sem interrupções e que não vamos ter de tomar nenhuma medida que agrave a crise económica e social que estamos a viver”. O primeiro-ministro rejeita que o SNS já esteja em situação de descontrolo — “só haverá descontrolo quando não houver capacidade de resposta” — mas pede que não se espere que seja o SNS “a resolver a pandemia”. Tem de ser ao contrário: “O controlo da pandemia coloca-se no momento anterior a entrarmos no SNS, depende exclusivamente de nós individualmente e de todos nós em conjunto”, disse.

António Costa admitiu que há um “cansaço” generalizado com as regras e que, em função disso, “o cumprimento das regras tem vindo a deslaçar-se” nos últimos meses. Mas é por isso que as multas se vão agravar e as regras vão apertar: para que o cumprimento seja mais eficaz. Costa até pediu, na conferência de imprensa que deu no Palácio da Ajuda, que não interpretem as palavras dele como alguma espécie de “censura”, mas antes de aviso. “Temos de resistir ao cansaço e não podemos desvalorizar o vírus”, disse. Para depois completar: “Não quero assustar ninguém, mas a verdade é que não se sabe o que acontece de hoje para amanhã”.

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