Com o lançamento das novas consolas, das novas placas gráficas e com uma lista aparentemente interminável de novos títulos que são colocados à venda a tempo das festas, esta é a época certa para deambular pelo sempre intenso mundo dos videojogos. Acrescentemos aqui as novas plataformas e as novas formas de “como” (e “onde”) absorver estes conteúdos — neste campeonato, o streaming tem um papel de protagonismo, é uma espécie de futuro-presente inevitável.

É uma tendência para a mobilidade que já há algum tempo vai além dos jogos para smartphone. A Nintendo teve uma aposta vencedora com a Switch, esse híbrido assinalável entre a sala de estar e a consola portátil. Com algumas diferenças de filosofia, tanto a Microsoft como a Sony já têm plataformas de Remote Play a assegurar esta possibilidade de levarmos as suas coleções para todo o lado, associadas também às suas vertentes dos jogos, como serviço, como o XBox GamePass ou o PS Now. Até no mundo do PC, a NVIDIA, com o serviço GeForce Now, quer levar o gaming para longe do computador propriamente dito.

E foi já há cerca de um ano que entrou um player gigante nesta equação, com a Google a lançar o serviço Stadia, que acaba de ficar disponível em Portugal (a plataforma está online em diferentes países da Europa em simultâneo a partir das 17h, mas a Google avisa que em alguns casos pode haver um atraso de uma ou duas horas no pleno funcionamento do sistema). Já foi descrito em várias ocasiões como um “Netflix dos jogos de vídeo” e a verdade é que é difícil encontrar um resumo mais simples e eficaz. A grande vantagem aqui? Não é necessário comprar nenhuma consola, só precisa de ter internet e Google Chrome ou uma box Chromecast ou um dispositivo móvel com o sistema operativo Android. Depois, tem de assinar o serviço por 9,99 euros por mês. Isto para uma base de jogos que, pelo menos até ao momento, é curta. Os títulos mais fortes e mais populares tem de os comprar à parte, pelo preço médio habitual: cerca de 60 euros.

[como funciona o Stadia:]

O lançamento inicial nos Estados Unidos e outros países selecionados teve de combater alguma desconfiança relativamente à performance destas plataformas quando não vêm acompanhadas de uma velocidade de internet impossivelmente rápida. Pois bem, tivemos oportunidade de testar o Google Stadia por alguns dias antes do lançamento, com uma ligação à internet que podemos descrever como “a normal entre os comuns mortais” e podemos garantir que esse pesadelo de tempos de resposta lentos e texturas de baixa resolução é um pouco exagerado — a limitação existe, mas manifesta-se sobretudo numa utilização móvel e não de uma forma tão acentuada como poderia parecer à primeira vista.

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A tecnologia por trás do Stadia é próxima de impressionante. A navegação nos menus é rápida, bem rápida, e a velocidade com que podemos trocar de um jogo para o outro, sem tempos de loading ou impedimentos do género, é a primeira coisa a destacar nesta experiência. Saltar de um portátil para o computador desktop, por exemplo, e continuar um jogo com o save associado à nossa conta funciona de forma incrivelmente fluída.

Para os que não se dão bem com teclado e rato, ligar um comando de consola a um dispositivo que o aceite também funciona imediatamente, sendo que o comando específico que a Google lançou como elemento mais palpável do serviço talvez ajude à maior facilidade entre levar os jogos de um dispositivo para o outro. Uma facilidade que certamente continuará a aumentar num maior número de situações, até porque a possibilidade de a Google levar tudo isto para os dispositivos do ecossistema da Apple parece estar próxima de acontecer.

[“Destiny 2”:]

Mas aquela que será a dúvida mais razoável quando se experimenta este tipo de produto é mesmo a velocidade de conexão necessária para que tudo isto se jogue de forma fluída. E numa conexão de 120 Mpbs, tanto em cabo de Ethernet como em Wi-Fi, tudo aqui se portou muito bem. Os jogos de maior traquejo gráfico que estão disponíveis na versão Pro do Stadia (já lá vamos) conseguem correr nuns 60 frames por segundo bastante estáveis, com resoluções de 4K. Se nos primeiros segundos se nota que estamos efetivamente a jogar um jogo que nos chega por streaming, com o momento de carregamento de texturas mesmo nos menus iniciais, esse efeito desaparece rapidamente. E é aí que pensamos que podemos estar mesmo a ver o futuro (ou um tipo de futuro, pelo menos) de como os videojogos poderão ser consumidos nos próximos anos. Há coisas a afinar, mas a base é surpreendente.

E os jogos? O que é que já podemos jogar?

Claro que tudo isto é muito bonito, mas, como em qualquer outra plataforma, o que importa mesmo é o que podemos jogar. O Stadia vem com duas modalidades, uma gratuita, que permitirá jogar títulos free-to-play, em que o primeiro grande destaque será “Destiny 2”. Depois temos a modalidade Pro, que na altura da escrita deste artigo contava com 27 jogos incluídos, bem como alguns descontos e outras oportunidades, como períodos de jogos gratuitos (é esta modalidade que custa os tais 9,99€ por mês, com um período experimental de 30 dias). Talvez esta seja mesmo uma das grandes limitações do Stadia: pelo menos para já, a seleção de jogos nesta modalidade é curta, especialmente quando comparada com outros serviços.

Google lança “Netflix dos jogos”. Stadia quer ser a revolução dos jogos sem consola

No entanto, está longe de ser uma má seleção e dentro dessa quantidade de títulos tivemos oportunidade de testar esta plataforma nos critérios que realmente interessam. Com o já mencionado “Destiny 2” pudemos ver que isto corre bem um shooter de gráficos modernos e exigentes. É um jogo que funciona sobretudo numa lógica de cooperação online e nisso nunca nos faltou ajuda para completar os raids que tínhamos pela frente, com o chat de jogo incluído. Dentro dos testes gráficos, ambos os jogos da série Hitman que estão presentes (“The Complete First Season” e “Hitman 2”) são dois ótimos exemplos de como jogos de aspeto, duração e velocidades mais tradicionais correm extremamente bem no Stadia — e o tempo que passámos com ambos nunca desiludiu.

[“Hitman”:]

Como muitas das escolhas da modalidade Pro estão viradas para os jogos indie de plataformas, voltámos a pegar em “Celeste”, que é uma maravilha dos puzzles de plataformas. É um daqueles jogos em que o tempo nunca é mal investido, seja lá em que contexto. A facilidade de ligar um comando e pegar num dos maiores milagres da pixelização retro dos últimos anos faz com que esta ubiquidade que o Stadia envolve pareça particularmente apelativa. Depois seguimos para “Superhot: Mind Control Delete” porque o original é um dos bons exemplos de como a fórmula do first person shooter se calhar ainda não deu tudo o que tinha a dar, e esta expansão é um belo complemento a essa ideia. Passámos também um belo tempo com “Everspace”, no fundo porque naves e espaço são sempre coisas sedutoras quando separadas, em conjunto essa sedução é ainda maior.

[“Everspace”:]

É natural que nenhum dos nomes que listámos até agora seja propriamente um peso pesado, especialmente com tudo o que é jogo que está para sair na época natalícia e adiante. Mas, tal como nas outras plataformas, temos a loja online, onde estão presentes os principais jogos dos últimos tempos e outros que estão para vir — estes são os tais que tem de comprar à parte, se os quiser jogar. “Star Wars: Jedi Fallen Order”, “Sekiro: Shadows Die Twice”, “Watch Dogs: Legion”, Assassin’s Creed Valhalla”, “NBA 2K21” ou “Cyberpunk 2077”, com lançamento marcado para esta semana, são apenas alguns dos exemplos.

[“Celeste”:]

Se é o mesmo que jogar tudo isto numa consola ou num PC? Talvez ainda não, é certo. Há momentos em que as limitações do streaming se tornam evidentes, mais que não seja porque as exigências da internet numa casa comum a dado momento podem estar a ser puxadas por outros interesses. Mas os títulos que acabámos de listar e a possibilidade sempre em evolução de os levar para todo o lado em vários dispositivos, aliados à performance que testemunhámos, tornam esta nova aventura da Google numa proposta que vai muito além da curiosidade.