É a partir da cadeia de Tires, numa chamada de cerca de três minutos, que Rosa Grilo confessa alegadamente o homicídio do marido, um crime que até aqui sempre negara, mas pelo qual foi condenada à pena máxima de prisão (25 anos). O telefonema foi divulgado ao início da madrugada desta segunda-feira nas redes sociais pelo consultor forense João de Sousa, que fez parte da equipa de defesa da viúva do triatleta e que é a pessoa com quem fala ao telefone. Nele, Rosa Grilo afirma: “Fui eu que matei o Luís“.
Se vierem a confirmar-se as declarações que se ouvem no áudio divulgado como sendo da viúva, que sempre recusou o envolvimento direto no homicídio perante a Polícia Judiciária (PJ) e os tribunais, Rosa Grilo vem ao fim três anos contar mesmo os detalhes do crime. No telefonema que João de Sousa — o seu ex-consultor forense e acusado de alegadamente ter ‘plantado’ provas durante a investigação — tornou público, diz que terá sido ela a matar o marido com recurso à arma de António Joaquim, seu amante à data do crime, e que também foi condenado a 25 anos pelo homicídio do triatleta. No entanto, na chamada divulgada, não fala sobre qual terá sido o envolvimento de António Joaquim no homicídio.
Rosa Grilo admite também que, alegadamente, foi ela quem criou a versão falsa que apresentou em tribunal. A de que foram três homens angolanos que invadiram a casa em busca de diamantes e acabaram por matar Luís Grilo à sua frente, ameaçando-a depois para não contar nada.
Pena máxima. Do “comportamento bizarro” à “frieza”, Rosa Grilo perdeu o caso mas não perdeu a pose
Num tom conformado, que contrasta com a forma assertiva com que sempre falou em tribunal, a voz que se ouve identificada como sendo de Rosa Grilo revela também que já não vai recorrer da decisão do Supremo Tribunal de Justiça — que manteve a pena de 25 anos aplicada pelo Tribunal de Loures, já confirmada também pelo Tribunal da Relação de Lisboa. “Eu quero terminar com isto. Vou desistir dos recursos. Já chega. Não quero recorrer para mais nada”. Seguem-se depois pedidos de desculpa: ao filho, aos pais, à sua família e à família de Luís Grilo e a todas as pessoas que a apoiaram. “Principalmente ao meu filho”, termina (como pode ouvir no vídeo no início deste artigo).
Rosa Grilo terá decidido confessar há dois dias. “Demonstrei que seria o melhor para ela”
O telefonema aconteceu na manhã deste domingo, segundo João de Sousa, naquilo a que chama um “culminar” da sua intervenção no processo enquanto consultor forense na defesa da Rosa Grilo. Ao que explicou ao Observador, a viúva terá decidido há cerca de dois dias fazer a alegada confissão depois de ele próprio lhe ter demonstrado que “seria melhor para ela”. “E ela compreendeu”, afirmou o antigo inspetor da PJ, acrescentando: “Tenho a técnica e o expertise para conseguir que ela tenha este tipo de confiança para confessar-me a mim. Defendo técnicas de entrevista em interrogatório, já defendia quando estava na polícia, publiquei internacionalmente artigos sobre a matéria e estou a exercitar aquilo que sei”.
A chamada que acaba de ser divulgada surge cerca de um mês depois de o Supremo ter confirmado a pena máxima para Rosa Grilo e do então seu amante e de o Ministério Público ter acusado João de Sousa, o ex-consultor forense, e Tânia Reis, antiga advogada da viúva, de terem alegadamente colocado dois fragmentos de projétil na banheira da casa onde o triatleta foi morto, supostamente para confundir o tribunal, numa altura em que decorria o julgamento do caso do homicídio. Esta acusação levou a advogada a renunciar à defesa de Rosa Grilo, bem como João de Sousa a quebrar o vínculo de consultor forense.
No entanto, o ex-inspetor da PJ continuou a manter ligação com a reclusa, até porque se encontra a realizar um trabalho científico na área da ciência forense sobre ela. Questionado sobre se esta alegada confissão pode beneficiá-lo neste processo em que é visado, João de Sousa afastou essa hipótese: “O crime, nestes moldes [da acusação de que é alvo], continua a ser um crime”.
O consultor forense garantiu que a decisão de divulgar a alegada confissão não teve a intervenção da antiga advogada de Rosa Grilo. Contactada pelo Observador, Tânia Reis confirmou: recusando fazer comentários sobre o conteúdo da alegada confissão, negou qualquer interferência na divulgação da chamada até porque já não tem qualquer ligação com Rosa Grilo. Soube apenas que a chamada (e o conteúdo) ia ser divulgada porque João de Sousa o anunciou nas redes sociais.
Este é a segunda chamada entre João de Sousa e Rosa Grilo que é divulgada pelo consultor. Numa anterior, publicada na passada sexta-feira, a reclusa revelava que, depois de Tânia Reis renunciar a sua defesa, já três advogados tinham pedido escusa do seu processo, embora atualmente já tenha quem a represente. No entanto, a chamada divulgada hoje não será a última.
Homicídio aconteceu no verão de 2018. Rosa Grilo participou desaparecimento do marido à GNR
O caso do homicídio de Luís Grilo veio a público como um desaparecimento, quando, a 16 de julho de 2018, Rosa Grilo deu conta às autoridades que o seu marido desaparecera. Na altura, informou que o triatleta tinha saído para fazer um treino de bicicleta e não tinha regressado a casa.
Seguiram-se semanas de buscas e de entrevistas dadas por Rosa Grilo a vários meios de comunicação — nas quais negava qualquer envolvimento no desaparecimento do marido, engenheiro informático de 50 anos e triatleta. O caso viria a sofrer uma reviravolta quando, já no final de agosto, o corpo de Luís Grilo foi encontrado, com sinais de grande violência, em Álcorrego, a mais de 100 quilómetros da localidade onde o casal vivia — em Cachoeiras, no concelho de Vila Franca de Xira. Nessa altura, as buscas deram lugar a uma investigação de homicídio e, novamente, a mulher negou sempre qualquer intervenção no assassínio do marido.
Mas a prova recolhida levou a PJ a concluir que Luís Grilo foi morto a tiro, no quarto do casal, por Rosa Grilo e António Joaquim e deixado depois no local onde foi encontrado. O triatleta terá sido morto a 15 de julho de 2019, por motivações de natureza financeira — o meio milhão de euros que o triatleta tinha em seguros — e sentimental — a possibilidade de Rosa Grilo assumir publicamente a relação com o amante. Logo no primeiro interrogatório e durante o julgamento, Rosa Grilo manteve a mesma versão: a de que tinham sido três angolanos a matar o marido, depois de lhe terem invadido a casa em busca de diamantes. Até hoje, se se confirmar o conteúdo deste telefonema.