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Rosa Grilo e António Joaquim começaram a ser julgados no dia 10 de setembro pelo homicídio de Luís Grilo
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Rosa Grilo e António Joaquim começaram a ser julgados no dia 10 de setembro pelo homicídio de Luís Grilo

Rosa Grilo e António Joaquim começaram a ser julgados no dia 10 de setembro pelo homicídio de Luís Grilo

Pena máxima. Do "comportamento bizarro" à "frieza", Rosa Grilo perdeu o caso mas não perdeu a pose

É o fim de mais um capítulo de um dos crimes mais mediáticos de 2018. Havia dois acusados pelo homicídio do triatleta Luís Grilo: a sua mulher e o amante. Agora, há apenas uma culpada: Rosa Grilo.

Sobrancelhas arqueadas, sorriso desafiador, braços cruzados. Quem olhasse para a Rosa Grilo naquele momento não diria que tinha acabado de ser condenada à pena máxima prevista na lei pelo homicídio do marido. Foi precisamente para a família da vítima que, já depois de ficar a saber a sua sentença, olhou — olhos semicerrados —, para depois perguntar:

— Onde está a tua mãe?

A arguida perguntava por Júlia Grilo a um dos seus filhos. Queria saber onde estava a irmã do marido — que, na verdade, o triatleta via como mãe. Depois de, no entendimento do tribunal, ter matado o seu irmão e, ao mesmo tempo, um “filho”, queria agora, momentos depois de ser condenada pelo homicídio, saber onde ela estava. Mas Júlia Grilo, que ao longo das 14 sessões do julgamento marcou presença na primeira fila, não estava ali. O sentimento era exatamente de desilusão, porque a cunhada — ou “sogra” — não estava presente. E a postura de Rosa Grilo parecia denunciar qual seria a sua intenção — como se lhe quisesse perguntar: “Estás satisfeita com 25 anos?”.

Mas não perguntou. Sem Júlia Grilo, Rosa virou costas ao público e continuou a fazer o que mesmo que tinha feito desde que os juízes e jurados tinham abandonado a sala. Ora sorria, ora sacudia o cabelo. Ora se levantava, ora se sentava. Ao mesmo tempo, ia conversando, alternadamente, com os guardas prisionais e a sua advogada, Tânia Reis. Lá pelo meio, virava-se para o pai, de quem recebia e para quem mandava beijinhos. O pai ficou até ao fim, sentado já sem ninguém a seu lado, na primeira fila. Se Rosa Grilo procurava pela “mãe” do triatleta no final do julgamento, bem podia também procurar pela sua própria que não a ia encontrar — tinha abandonado a sala de audiências assim que a juíza leu, no acórdão, que a filha seria condenada a 24 anos de prisão só pelo crime de homicídio qualificado, a que somariam outros pelas restantes acusações.

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O pai de Rosa Grilo, à saída do tribunal, já depois de saber que a filha tinha sido condenada a 25 anos de prisão

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Já não ouviu que Rosa Grilo também foi condenada a um ano e 10 meses de prisão pelo crime de profanação de cadáver. E a 18 meses pelo crime de detenção de arma proibida. Mas viria mais tarde a saber — ou pelas notícias ou pelo marido — que o cúmulo jurídico foi de 25 anos. Nem mesmo os familiares de Luís Grilo, a vítima, esperavam este desfecho:

— Não esperava isto…

— Eu também não!

O “isto” que não esperavam não eram apenas os 25 anos. Também não esperavam que António Joaquim, o homem com quem Rosa Grilo teve uma relação extraconjugal e que foi também detido e acusado do homicídio do triatleta, fosse absolvido. Em pleno contraste com a viúva, da qual apenas quatro cadeiras o separavam, António Joaquim bebia calmamente o café que uma das pessoas da larga equipa de advogados e peritos que o defendeu lhe trouxera.

A postura de Rosa Grilo parecia denunciar a sua intenção ao procurar Júlia Grilo, irmã da vítima. Era como se lhe quisesse perguntar: "Estás satisfeita com 25 anos?"

Cerca de um ano e meio depois de ambos serem detidos por suspeitas de coautoria de um dos crimes mais mediáticos de 2018, vão agora seguir caminhos diferentes. Rosa, prestes a fazer 45 anos, sem direito a herança e ainda a ter de indemnizar o filho em 42 mil euros por danos não patrimoniais, continuará presa a não ser que algum tribunal superior reverta a decisão. António, da mesma idade, terá apenas de cumprir dois anos de pena suspensa — está em liberdade desde o início do ano, depois de os juízes terem alterado a medida de coação — e poderá regressar aos tribunais, ao trabalho como funcionário judicial.

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Uma absolvição anunciada e concretizada, apesar do “comportamento estranho” de António Joaquim

Primeiro, a libertação do arguido. Depois, as alterações feitas à acusação que atribuíam a Rosa Grilo a autoria moral e material do crime. Quando a absolvição de António Joaquim parecia ser cada vez mais um cenário provável, a juíza Ana Clara Baptista começa a ler o acórdão e confirma as suspeitas. À medida que elencava os factos dados como provados — praticamente quase todos da acusação —, o nome de António Joaquim simplesmente ia desaparecendo. Onde antes se lia que ambos os arguidos tinham planeado, matado e escondido o corpo de Luís Grilo, passou a ler-se que apenas Rosa Grilo planeou, matou e escondeu o corpo do marido. O plano que o Ministério Público acusava os dois de terem delineado é agora, aos olhos do tribunal, apenas um plano da viúva.

António Joaquim foi absolvido dos crimes de homicídio qualificado e profanação de cadáver

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

A história é a mesma, só que agora só há uma protagonista: Rosa Grilo. Na decisão do tribunal, foi ela quem planeou matar o marido para beneficiar de cerca de meio milhão de euros dos seguros de vida que tinha; foi ela quem “encontrou uma oportunidade” para lhe tirar a vida; foi ela quem disparou o tiro fatal enquanto o triatleta dormia, com uma arma que pertencia a António Joaquim; foi ela quem enrolou o seu corpo num edredão e colocou um saco de plástico na sua cabeça; foi ela quem transportou o cadáver até à localidade de Alcórrego, no concelho de Avis, e ali o abandonou; e foi ela quem simulou o desaparecimento do triatleta para confundir as autoridades, tendo-se livrado do seu telemóvel e da bicicleta. E, assim, apenas ela acabou condenada.

Mas restam dúvidas. “De forma que não foi possível apurar” é uma expressão que aparece algumas vezes no acórdão do tribunal. Juízes e jurados não conseguiram “apurar” como é que Rosa Grilo “entrou na posse da arma de fogo” do amante, que usaria para matar o marido. Não apuraram também em que carro é que a viúva transportou o cadáver do Luís Grilo até Alcórrego nem como é que o retirou do seu interior, para depois o deixar estendido junto a uma estrada de terra batida. Mais: não foi possível “apurar” como é que Rosa Grilo se “desfez do telemóvel” do triatleta nem que “destino” deu ao colchão onde ele dormia quando foi alvejado.

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Mesmo absolvido, a verdade é que também restaram dúvidas em relação a António Joaquim. O tribunal absolveu o funcionário judicial fundamentando-se no princípio in dubio pro reo, ou seja, em caso de dúvidas, favorece-se o arguido. Não quer dizer que o tribunal tenha a certeza de que o arguido não esteve envolvido no crime, mas “no mínimo fica instalada a dúvida”, lê-se no acórdão. E isso basta para o absolver.

A juíza Ana Clara Baptista realçou que “é certo que a arma usada” para matar o triatleta pertencia a António Joaquim e que este “assumiu um comportamento estranho”: desde ter começado a frequentar a casa de Rosa Grilo enquanto decorriam as buscas por Luís Grilo e de marcar férias com ela, ao facto de o próprio nunca ter estranhado o comportamento da amante. Mas reconhece que “esta constatação não é suficiente” para o condenar e que “não se produziu em audiência prova suficiente” de que tenha estado envolvido no homicídio. António Joaquim foi apenas condenado a dois anos de prisão, com pena suspensa, pelo crime de detenção de arma proibida.

A juíza Ana Clara Baptista realçou que “é certo que a arma usada” para matar o triatleta pertencia a António Joaquim e que este “assumiu um comportamento estranho”, mas admitiu que as provas não eram suficientes para uma condenação.

Para fundamentar esta decisão, o tribunal destacou que até o próprio Ministério Público, nas alegações finais, assumiu que “não existiam provas” do envolvimento de António Joaquim no crime — o que não agradou o procurador Rui Frias. O magistrado esperou mesmo que a juíza acabasse de ler o extenso acórdão para pedir que ficasse em ata um pedido de correção ao mesmo. Este pedido levou o coletivo de juízes e os quatro jurados a sairem da sala: a correção foi feita, mas em nada alterou a decisão, apesar de terem sido dados 30 dias ao MP e à defesa para se pronunciarem. Entretanto, o MP já fez saber, pela agência Lusa, que vai recorrer da decisão.

Da “compleição física” de Rosa Grilo — que lhe permitia deslocar o cadáver — à tese dos angolanos que “não merece credibilidade”

Para a advogada da viúva, “a dúvida criada para o arguido António Joaquim também devia ter sido para Rosa Grilo” e, por isso, também ela vai recorrer da decisão, disse aos jornalistas no final da leitura do acórdão. Não foi o que o tribunal considerou. Para juízes e jurados, “não resultaram dúvidas”. “Rosa Grilo foi autora material do homicídio do marido”, disse a juíza presidente do coletivo, que, à medida que ia lendo a decisão, olhava nos olhos da arguida sentada à sua frente. “Tinha uma motivação” e “encontrou uma oportunidade para tirar a vida” ao triatleta. 

Rosa Grilo foi detida em setembro de 2018. A sua advogada já anunciou que vai recorrer da decisão do tribunal

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Apesar de reconhecer que há dados que não foi possível apurar “concretamente”, o tribunal não considerou “impossível” que o crime tivesse sido cometido apenas por “uma pessoa” — neste caso, Rosa Grilo. Isto porque, segundo explica o acórdão, a arguida tem uma  “compleição física” que lhe permitiria carregar o cadáver do marido. E o facto de ter sido enrolado num edredão “tornou mais fácil a sua deslocação”.

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De costas para a audiência, apenas era possível perceber que a arguida abanava a cabeça — poucas vezes —, num gesto de discordância com o que a juíza ia dizendo. Na sua tese de defesa, o marido foi assassinado à sua frente por homens angolanos que lhe invadiram a casa em busca de diamantes. Um relato que, para o tribunal, “não merece credibilidade”. “Nem ela [Rosa Grilo] conseguiu apresentar justificação para algumas questões”, lê-se.

A juíza Ana Clara Baptista já tinha mostrado a sua indignação, ao longo do julgamento, em relação a alguns dos elementos da história apresentada pela arguida: o facto de ter, supostamente, deixado o filho sozinho com um dos assassinos do marido; ou a ida a festivais de música com o amante, numa altura em que estaria sob ameaça daqueles mesmos homens. “Mesmo na sua versão, a acreditar, a frieza que manifesta é algo que não é normal. Descreve a morte do seu marido (que parece uma cena de filme) e a senhora está como se nada tivesse acontecido. O seu filho tinha acabado de perder o pai. Como é que depois vai para fins de semana e festivais de música? Aquilo que, para alguém, era o mundo a cair, a senhora conseguiu seguir com normalidade“, disse ainda a magistrada, considerando que todo o comportamento de Rosa Grilo foi “bizarro e contraditório”.

“Mesmo na sua versão, a acreditar, a frieza que manifesta é algo que não é normal. Descreve a morte do seu marido (que parece uma cena de filme) e a senhora está como se nada tivesse acontecido"
Juíza Ana Clara Baptista

A presidente do coletivo considerou ainda que, ao longo do julgamento, foram ouvidas testemunhas “serenas e isentas”, que permitiram ao tribunal chegar a uma decisão. Mas que o testemunho do pai de Rosa Grilo em tribunal — que disse que também tinha sido atacado por angolanos — “só se explica se tiver sido para tentar corroborar o depoimento da filha” e para a “desresponsabilizar” dos crimes.

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Certo é que o pai de Rosa Grilo acompanhou-a desde o dia em que foi presente a tribunal pela primeira vez, para aplicação das medidas de coação — em setembro de 2018 —, até esta terça-feira. À saída, pediu que não lhe fizessem perguntas. Lá dentro, descansou a filha e transmitiu-lhe esperança. A verdade é que este é apenas o fim de mais um capítulo, mas não do caso. Os recursos que, já se sabe, vão ser apresentados podem trazer decisões novas para cada um dos arguidos.

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