O histórico café de Lisboa Martinho da Arcada assinala em janeiro 240 anos de existência, pretexto para um programa de comemorações promovido pelo escritor e dinamizador cultural Luís Machado, que inclui um livro, tertúlias e um recital de poesia.

As comemorações visam celebrar a vida do café mais antigo de Lisboa — inaugurado pelo Marquês de Pombal em janeiro de 1782 — e com uma história intimamente ligada à literatura portuguesa, tendo sido frequentado por escritores como Bocage, Lopes de Mendonça, Cesário Verde, Augusto Ferreira Gomes, António Botto e Almada Negreiros.

Contudo, um dos seus clientes mais assíduos foi Fernando Pessoa, que ali tem uma mesa permanentemente reservada, onde escreveu muitos dos seus poemas e a última parte do “Livro do Desassossego”.

A história deste espaço está contada num livro que evoca as etapas mais significativas daquele espaço histórico da Praça do Comércio, e que foi recentemente lançado por Luís Machado, também escritor e secretário-geral da Associação Portuguesa de Escritores (APE), intitulado “Martinho da Arcada, um café de todos nós”.

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Esta obra contextualiza datas e nomes que marcaram a historia do café e, ao longo das suas 124 páginas ilustradas com fotografias de época e atuais, destacam-se alguns episódios curiosos, até agora pouco conhecidos, contou à Lusa Luís Machado.

Entre essas histórias relatadas, conta-se o facto de o Martinho de Arcada ter sido um dos precursores da rede telefónica da capital, de ter sido à sua porta que passou o primeiro automóvel (Panhard & Levassor) a circular em Portugal, antes de iniciar viagem para Santiago do Cacém, e de ter sido frequentado pelo escritor Antoine Saint-Exupery, pelo fotógrafo Man Ray e pela bailarina Josephine Baker, durante passagens por Lisboa.

Terá sido também dentro deste “mítico santuário da memória cultural coletiva” — como lhe chama Vítor Melícias no posfácio do livro — que Jaime Cortesão, fundador da Seara Nova, foi detido pela PIDE, e que Manuel Serra e os capitães Carlos Vilhena e Vasco Gonçalves planearam a Revolta da Sé.

O livro conta também com diversos depoimentos que ao longo dos anos várias personalidades da vida pública portuguesa prestaram sobre o Martinho da Arcada, como é o caso de Agostinho da Silva, Álvaro Siza Vieira, Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Mário de Sá Carneiro e Fernando Pessoa, mas também o seu heterónimo Bernardo Soares.

Entre as personalidades ilustres, quer do meio político, quanto intelectual e artístico, que passaram pelas mesas do Martinho da Arcada, muitas deixaram escritas “passagens memoráveis” no livro de honra do café.

Esses testemunhos são também reproduzidos na monografia, que dá a conhecer o que pensaram Álvaro Cunhal, Antonio Tabucchi, Eduardo Lourenço, Eunice Muñoz, Gerard Schroeder, John Malkovich, Ivan Lins, Jorge Amado, José Saramago, Manoel de Oliveira, Querubim Lapa, Robert Bréchon, Rui Nabeiro, Ruy de Carvalho ou Sophia de Mello Breyner, entre outros.

A publicação desta monografia ilustrada — editada pela Âncora — está integrada nas comemorações do aniversário do café, cuja programação foi avançada por Luís Machado.

Uma das iniciativas previstas é o regresso do ciclo de tertúlias “Rostos da Portugalidade”, uma iniciativa lançada originalmente em 2009, quando o café esteve em riscos de fechar, com o objetivo de o dinamizar.

Este foi o último de quatro ciclos de tertúlias culturais — “As conversas à quinta-feira”, “Mesas da Arcada”, “Tertúlias do Tejo” e “Rostos da Portugalidade” – que o autor dinamizou no Martinho da Arcada ao longo de três décadas.

Estas tertúlias, que estiveram interrompidas, regressam no dia 18 de novembro para uma primeira sessão que terá como convidado o cineasta António-Pedro Vasconcelos.

No dia 2 de dezembro, a protagonista dos “Rostos da Portugalidade” será a coreógrafa Olga Roriz, e no dia 15 de dezembro será dada a palavra ao músico e poeta Sérgio Godinho.

Já em 2022, o ciclo de tertúlias recebe o embaixador António Monteiro, no dia 13 de janeiro, e duas semanas depois, a 27 de janeiro, as conversas terão como orador convidado o fotógrafo Eduardo Gageiro.

“Pelo meio, haverá um recital de poesia” dedicado a Fernando Pessoa e seus heterónimos, intitulado “Pessoa — Infinitamente plural”, que decorrerá no dia 27 de novembro, pelas 17h00 no Café Martinho da Arcada e que será de entrada livre.

De acordo com Luís Machado, será promovida também a iniciativa “Era uma vez um café”, que convida alunos do ensino secundário de algumas escolas a visitarem o histórico café lisboeta e a ouvirem contar a sua história.

As comemorações terminam com um almoço de celebração no dia do aniversário, 7 de janeiro, no Martinho da Arcada.

Em cima da mesa está também um projeto da APE para criar um Prémio Literário Martinho da Arcada, destinado a galardoar livros de poesia inéditos, estando neste momento a decorrer a fase de angariação de patrocínios.

Há também o projeto de editar até janeiro uma serigrafia dedicada à data. O projeto está entregue ao Centro Português de Serigrafia, que será responsável pela edição e por escolher o artista plástico que fará o trabalho.