O teatro como forma de contrariar a lógica pandémica de distanciamento está, há um mês, a mobilizar 33 alunos de Teatro da Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE), no Porto, envolvidos na peça “Titus Andronicus”.

Com estreia marcada para dia 24 e em palco até dia 27 no Teatro Helena Sá e Costa, a peça de William Shakespeare ocupa, por estes dias, quase 12 horas diárias aos alunos do 3.º ano do curso de teatro, uma imposição de trabalho que, ainda assim, foi ao encontro da ambição dos formandos.

Jaime Castelo Branco, um dos atores, explicou à Lusa as sensações de preparar uma peça com um “texto muito pesado” em contexto de pandemia, e de como isso foi uma motivação em vez de um problema.

Quando o trabalho começou nós tínhamos muita vontade de o iniciar e voltar à escola era sempre um alívio para nós, para podermos voltar a fazer o que queríamos. Começar esta produção, isso sim, foi importante, pois a partir do momento que entramos aqui e começamos a trabalhar todo esse mundo pandémico fica lá fora”.

Inês Carneiro, também atriz, completa o raciocínio: “O contexto de pandemia tolda tudo o que se passa à nossa volta. Mas independentemente de continuarmos em contexto pandémico, o cerne da questão é o tipo de trabalho tão cru, que é tratado exatamente da mesma forma, com a pica de ir para o palco”.

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Jaime Castelo Branco assinala, também por isso, estar a “ser um grande desafio” e que, “apesar do peso [do texto], a diversão está a ser mais importante”.

“Estamos a querer ligar-nos uns aos outros, o que é um contraste com a pandemia”, frisou.

A colega na sala e no palco avança na conversa para destacar o que teve de ficar de fora no mês de preparação, lembrando que a peça contém “demasiadas problemáticas, demasiados pontos” que podiam pegar, “por exemplo, dramaturgia, mas que num mês é muito difícil de levantar tudo isto”.

O encenador Paulo Calatré, professor e orientador, explicou à Lusa serem os alunos “que montam e desmontam todo o cenário”, assinalando tratar-se de “uma produção que tenta reproduzir as produções profissionais”.

Os 33 alunos dividem-se entre 18 atores, dois na cenografia, três na produção, oito na luz e som e mais dois como figurinos, contabilizou o também ator profissional.

Confirmando ser a peça em produção “um dos textos mais pesados de Shakespeare”, explicou que a história decorre em torno do general romano Titus Andronicus, que “é chamado ao senado para ser o novo imperador, mas recusa-se, e acaba por dar o seu voto ao filho mais velho do imperador, que depois se vem a descobrir ser um tirano”.

Questionado sobre o entusiasmo dos alunos, Paulo Calatré respondeu recorrendo à história: “Shakespeare foi uma vez considerado, num livro [do ensaísta e investigador] Harold Blum como o [autor da] invenção do humano pela sua capacidade de criar personagens fantásticas que atravessam os tempos, e isso, para um aluno, todo o trabalho de pesquisa da personagem, de emoções, de ritmos, de sensações, é uma oportunidade fantástica de exploração de tudo o que é o trabalho do ator”.

Os ensaios decorrem atualmente de segunda a sexta-feira entre as 14h30 e a meia-noite.