Os estrangeiros em Portugal são dos que mais sofrem com as “práticas sedimentadas de má administração”, denuncia à Rádio Observador a Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral. Entrevistada no programa Explicador, a responsável apontou exemplos que diz verificar “todos os dias”, como “estrangeiros que residem em Portugal, ou que entram, e que têm de esperar muito tempo para ter autorizações de residência ou renovações de autorizações de residência, por causa das deficiências do nosso aparelho administrativo“.
Nestas declarações, Maria Lúcia Amaral esclareceu que a Provedoria de Justiça não está a intervir no caso dos migrantes de Odemira agredidos pela GNR. Maria Lúcia Amaral explica que se trata de um assunto nas mãos do Ministério Público, do Ministério da Administração Interna e dos tribunais.
Provedora de Justiça estranha poucas queixas de abusos das autoridades
No entanto, a Provedora de Justiça denuncia que seria de esperar que lhe chegassem mais queixas de abusos, o que só não acontece porque, considera Maria Lúcia Amaral, Os estrangeiros em Portugal não estão cientes dos direitos que lhes assistem. Estão entre os que mais sofrem com as práticas de má administração.
“Normalmente, as queixas que nos chegam, quanto a autoridades policiais, são de pouca urbanidade”, afirmou a Provedora, acrescentando que “maus tratos, abusos, não nos chegam”. Admitindo ser uma questão que a “preocupa imenso”, Maria Lúcia Amaral estima que “quem é vítima destes abusos, quando eles acontecem por parte das forças de segurança,são pessoas de tal ordem vulneráveis, pessoas que na nossa sociedade estão tão à margem, tão para lá de tudo, tão pouco protegidas que nem sequer sabem da existência do Provedor de Justiça e nem sequer sabem que se podem queixar”.
Acidente na A6. Devia ter havido “comportamento especial”
Questionada sobre o caso do acidente na A6 com o carro do ex-ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, Maria Lúcia Amaral entende que deveria ter havido um “comportamento especial”.
Era um carro oficial do Estado e isso implica que quem o conduz e em nome de quem ele é conduzido tem de ter um comportamento especial, visto que é conduzido não pela sua viatura particular, mas pela viatura que é paga por todos os portugueses e que ao Estado pertence”, afirmou a Provedora da Justiça.
Ainda sobre este caso, Maria Lúcia Amaral destacou que não pode ser comparado a outros, envolvendo “factos extraordinários”, que levaram a avultadas indemnizações, como aconteceu no processo do cidadão ucraniano morto no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, no Aeroporto Internacional de Lisboa.
Pode haver vacinação obrigatória?
Nestas declarações no Explicador da Rádio Observador, Maria Lúcia Amaral defendeu, ainda, que, no âmbito da pandemia e da constitucionalidade de algumas medidas, a maior obrigação do estado é proteger a vida da população.
Nesse sentido, a Provedora de Justiça admite que as vacinas contra a COVID-19 podem tornar-se obrigatórias. “Admito que sim”, disse Maria Lúcia Amaral, defendendo que, “nesse ponto, admito que o Direito e o raciocínio jurídico, pode acomodar as soluções, sobretudo o pensamento constitucional, precisamente porque estão em conflito muitos valores contrastantes”.
“A questão não é jurídica, deve ser científica, deve ser fundamentada pelo melhor pensamento da ciência. O Direito é um instrumento, acomoda o que for pedido pela ciência e que for deliberado pela consciência social e pela opinião pública”, acrescentou.
Maria Lúcia Amaral está a iniciar um segundo mandato de quatro anos como Provedora de Justiça, depois de ter sido reeleita há cerca de um mês.