Éric Zemmour não podia ser mais claro a pedir aos seus eleitores que dessem o voto a Le Pen na segunda volta. Dupont-Aignan (bem mais modesto na sua expressão eleitoral) seguiu-se nesse apoio. Pécresse, Jadot, Roussel e Hidalgo estenderam a mão a Emmanuel Macron. Poutou e Arthaud (ambos com menos de 1% dos votos) preferiram não entregar votos. Bem mais significativa foi a posição de Jean-Luc Mélenchon — que recusou terminantemente apoiar a candidata da extrema-direita mas também não estendeu o tapete ao candidato Presidente em funções.

Mélenchon: um quinto dos eleitores ainda tem de definir voto

Jean-Luc Mélenchon, o candidato à presidência francesa que ficou em terceiro lugar nas eleições deste domingo, pediu aos eleitores que “não deem voz à senhora Le Pen” na segunda volta — mas não esclareceu se apela à abstenção ou ao voto em Macron. O líder do partido França Insubmissa avisou que “uma nova página da batalha se abre” com o atual Presidente francês e Marine Le Pen na segunda volta pela liderança francesa; e considerou que o país está num “estado de emergência política”.

O panorama diante de vós é o que foi planeado, não por nós, mas pelas instituições da Quinta República. Conheço a vossa raiva, não deixem que ela vos leve a cometer erros irreparáveis. Enquanto a vida continuar, a luta continua. E é meu dever dizer-vos, como o mais velho, que a única tarefa que temos é a cumprida pelo mito de Sísifo: a pedra caiu no fundo da ravina, então vamos subir”, reagiu.

Jean-Luc Mélenchon referia-se ao ensaio do filósofo Albert Camus, “O Mito de Sísifo”, sobre o conceito de absurdismo — a busca humana incessante por um sentido de vida, mas a incapacidade de encontrá-la. Albert Camus compara essa busca à história de Sísifo, uma personagem da mitologia grega condenada a empurrar uma pedra desde o fundo de um vale até ao cimo da montanha. A tarefa prova-se sempre inglória: quando está prestes a chegar ao pico, uma força empurra a pedra para o vale novamente.

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Zemmour: “Não consegui convencer compatriotas suficientes”

Eric Zemmour foi bem mais categórico na reação aos resultados (ainda provisórios) e não perdeu tempo: o candidato da extrema-direita à direita da União Nacional pediu aos seus apoiantes para votarem em Marine Le Pen, mas prometeu que continuaria a “defender a França e os seus ideais”. Admitindo que cometeu “erros”, o candidato do Reconquista disse ter a “certeza” de que venceria “em breve”: “O facto de terem sido dois milhões a apoiar um homem que começou do nada, que não era político, mostra que a minha mensagem foi ouvida”, considerou na reação à derrota na primeira volta.

“Não consegui convencer compatriotas suficientes. A história dirá porquê, se os franceses concordam maioritariamente com as nossas ideias”, conjeturou Zemmour, dizendo que as ideias que defende “valem muito mais” que os votos que conquistou nas eleições deste domingo. E aponta explicações para o insucesso:

Talvez por causa desta campanha, do tratamento que recebemos; e talvez também por culpa minha. Cometi erros, aceito tudo. Assumo total responsabilidade”, disse também.

Pécresse fala de “campanha atrofiada” e diz-se prejudicada pelo voto útil

Valérie Pécresse, que estava a dois pontos de distância de Zemmour (com 7,2%) à hora em que este artigo foi publicado, explica a derrota com a “campanha atrofiada”, “a ausência de debates reais” e a estratégia de “voto útil” nas urnas. “O povo de França votou e seu veredicto impõe-se para nós. Este resultado é uma deceção pessoal e coletiva. Assumo total responsabilidade pela minha parte nesta derrota”, disse a candidata do movimento Somos Livres.

Valérie Pécresse disse que votaria em Macron na segunda volta para evitar o “caos que resultaria” da eleição de Marine Le Pen; e pediu aos apoiantes que “ponderem, nos próximos dias, com seriedade, as consequências potencialmente desastrosas para nosso país e para as gerações futuras de qualquer escolha diferente” da sua. A candidata disse-se “profundamente preocupada com o futuro” precisamente por causa do resultado que a presidente da Frente Nacional alcançou este domingo: “A extrema-direita nunca esteve tão perto de vencer”.

Lassalle não faz apelos ao voto porque agora é “um simples cidadão”, Jadot quer Macron

Yannick Jadot também anunciou que votaria em Emmanuel Macron e pediu aos apoiantes para seguirem o mesmo sentido de voto. “Peço o bloqueio da extrema-direita, depositando um boletim de voto em Emmanuel Macron nas urnas a 24 de abril. Que ninguém minimize a ameaça fundamental representada pela extrema-direita”, avisou o candidato dos Verdes. Ainda assim, o ambientalista lamentou que o debate centrado na ecologia não tenha representação na segunda volta: “É preciso ver a urgência vital da batalha pelo clima e pela biodiversidade.”

Jean Lassalle, do Resistir, não fez qualquer apelo ao voto porque agora já não é candidato à presidência — é um cidadão comum, justificou.

Desta vez, voto, mas o meu voto interessará apenas a mim porque me torno novamente esta noite e neste momento um simples cidadão”, comentou.

Mas disse acreditar que os apoiantes sabem em quem votar: “Como foram inteligentes o suficiente para nos escolher, apesar de tantas dificuldades, tenho total confiança em vós para fazerem a vossa escolha em 15 dias”.

“Nenhum voto deve ir para a extrema-direta”, consideram partidos mais pequenos

Com uns reduzidíssimos 1,7% (quando estavam contados 90% dos votos), Anne Hidalgo, presidente da Câmara de Paris e candidata do Partido Socialista francês, deixou uma mensagem direta de apoio ao atual presidente francês: “Peço-vos com seriedade que votem contra a extrema-direita de Marine Le Pen usando a boletim de voto com Emmanuel Macron.”

O comunista Fabien Roussel pediu a “derrota da extrema direita” perante o “risco de ver Marine Le Pen no poder”. “Lamento que o total de votos da esquerda seja inferior ao total de votos da extrema-direita”, acrescentou o candidato, recordando, à semelhança de Valérie Pécresse, que “a extrema-direita nunca esteve tão forte” em França.

Nunca permitirei que um projeto racista e xenófobo seja implementado [no cargo de] Chefe de Estado”, defendeu Roussel: “Usem o único boletim que estará à nossa disposição.”

Numa publicação no Twitter, o candidato Nicolas Dupont-Aignan, do partido Levantar a França, apelou diretamente ao voto em Marine Le Pen, instigando os seus eleitores a “bloquearem Macron”.

O candidato do Novo Partido Anticapitalista às eleições presidenciais, Philippe Poutou, repetiu a mensagem de Jean-Luc Mélenchon e defendeu que “nenhum voto deve ir para a extrema-direta”. Mas “não vamos dar instruções para votar a favor de Macron, porque ele é um bombeiro incendiário cujas políticas são uma das causas da ascensão do Reagrupamento Nacional”, considerou.

Mas Marine Le Pen também é um “veneno” que “procura incitar o ódio contra as populações imigrantes” e que “representa um perigo mortal” para os direitos dos imigrantes e da comunidade LGBT.

Não é de uma frente republicana liderada por Macron que precisamos, mas de construir uma ampla mobilização contra Le Pen, Zemmour e todos os seus aliados”, afirmou Philippe Poutou

Nathalie Arthaud, do Luta Operária, considera que a segunda volta nas eleições em França terá como candidatos “dois inimigos mortais dos trabalhadores” e recusa dar instruções de voto aos seus eleitores. “Ambos são inimigos da classe trabalhadora”: “Macron fará Le Pen e Le Pen fará Macron”.