O Banco de Portugal pagou um dividendo de 406 milhões de euros ao Estado, depois de ter terminado o ano de 2021 com resultados líquidos de 508 milhões de euros, menos do que os 428 milhões entregues no ano anterior mas, graças a uma “rentabilização melhor dos ativos sob gestão“, o resultado ficou 42 milhões acima do que estava orçamentado.

O valor entregue ao Estado, de 406 milhões de euros, sobe para 639 milhões se se contabilizar o imposto pago no exercício (IRC), segundo o relatório do conselho de administração de 2021 apresentado esta terça-feira pelo Banco de Portugal, que convidou um conjunto de jornalistas até ao Complexo do Carregado para fazer uma conferência de imprensa de apresentação do relatório.

Nessa conferência de imprensa, numa altura em que estará iminente a primeira subida das taxas de juro, o governador Mário Centeno confirmou que “os juros baixos são, provavelmente, a um prazo que será curto, algo que vamos alterar“.

Todos temos que perceber que há uma nova situação, um novo processo financeiro e temos que pensar o nosso posicionamento enquanto agentes económicos”, disse Mário Centeno.

“Insisto com a ideia de que a normalização da política monetária é algo desejável e que deve acontecer, porque se for feita com a sustentabilidade que se deseja significará capacidade de reação futura, que hoje é mais limitada”, afirmou o responsável, reconhecendo que no caso português “é notório que em particular nos últimos dois meses a taxa de inflação se aproximou bastante daquilo que é a média da área do euro”, deixando por isso de ser “um fenómeno que estava mais contido em Portugal”.

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Ainda assim, no dia em que as taxas de mercado apontam para uma subida de 105 pontos-base nas taxas de juro na zona euro, até ao final do ano, o Observador questionou o governador do Banco de Portugal sobre se essa expectativa é realista ou exagerada. Sem responder à pergunta diretamente, Mário Centeno deu a entender que os mercados poderão estar a ler a situação de forma precipitada.

“Os mercados têm estado numa atualização mais ou menos constante daquilo que são as suas expectativas, não vou comentar dados de mercado mas é notório que essas expectativas se vão formando, que temos de enquadrar nas nossas decisões essas expectativas – quer quando aceleram quer quando desaceleram – portanto espero que nas próximas reuniões do BCE se consiga transmitir de forma clara a todos, incluindo aos mercados, qual é a expectativa correta sobre aquilo que o BCE considera ser necessário para a contenção da inflação”, afirmou o governador do Banco de Portugal.

“Gostava de sublinhar, ainda assim, que a origem da inflação é um pouco estranha às capacidades que os bancos centrais têm de conter esta inflação, originada em choques de oferta”, terminou Mário Centeno, acrescentando que, como forma de não contribuir ainda mais para as pressões inflacionistas, os governos europeus deviam estar a ponderar alargar os prazos de execução do NextGenerationEU, o programa de investimentos lançado a nível europeu como resposta à pandemia.

Balanço do Banco de Portugal aumenta para 219 mil milhões

Os 406 milhões de euros de dividendos superam aquilo que está inscrito no Orçamento do Estado que está em aprovação, onde aparecem 295 milhões de euros de dividendos esperados do Banco de Portugal. Questionado pelo Observador relativamente a esta discrepância, o administrador Hélder Rosalino explicou que esse será o efeito de, no pagamento dos dividendos, ser retido na fonte um valor semelhante a uma taxa liberatória, já que se trata de um rendimento de investimento. Ou seja, o Banco de Portugal apresenta um valor bruto e o Orçamento do Estado um valor líquido desse efeito.

O balanço do Banco de Portugal aumentou em cerca de 27 mil milhões de euros, para 219 mil milhões, um reflexo sobretudo das compras de dívida pública que foram feitas pelos bancos centrais nacionais do Eurossistema – ao abrigo dos programas de compra de títulos que estão perto do fim, incluindo o Programa de Compras de Emergência Pandémica (PEPP), o plano de estímulo lançado pelo BCE no início da pandemia.

A resposta da política monetária permitiu preservar condições de financiamento favoráveis à economia”, afirma o Banco de Portugal.

Ao abrigo desses programas de intervenção, aumentou a carteira de títulos de dívida pública em 17,1 mil milhões de euros, para 86,2 mil milhões. Por outro lado, o Banco de Portugal beneficiou da valorização das reservas de ouro, cujo valor subiu em 808 milhões de euros, para um total de 19,8 mil milhões de euros.

Portugal tem a 14ª maior reserva de ouro do mundo e a 6ª maior da Europa Ocidental, com 383 toneladas. O país que tem mais ouro é os EUA, com 8.133 toneladas, depois a Alemanha (3.359 toneladas) e Itália (2.452 toneladas). Portugal tem mais ouro que Espanha e que o Reino Unido, por exemplo, indicou o administrador Hélder Rosalino numa apresentação sobre as reservas de ouro do Banco de Portugal.

O banco conseguiu rentabilizar melhor os ativos de gestão”, explicou o administrador Hélder Rosalino, sobre os resultados acima do esperado.

Sobre os resultados anuais, o Banco de Portugal refere, também, que a margem de juros ascendeu a 677 milhões de euros – um valor conseguido graças aos juros recebidos nos títulos de dívida pública (845 milhões) e cujo emitente é a República Portuguesa. Ou seja, o Banco de Portugal, por ter comprado os títulos de dívida no mercado, recebeu juros (que são pagos pelo Orçamento do Estado) e, agora, devolve o proveito com esses juros na forma de dividendos e impostos.

Relativamente aos gastos de funcionamento do Banco de Portugal, estes totalizaram 195 milhões de euros, menos um milhão de euros do que em 2020, afirma o supervisor, notando que os gastos com pessoal diminuíram 2% e as despesas com fornecimentos e serviços de terceiros aumentaram 1%.