É o terceiro livro de uma trilogia, seguindo-se a A verdade sobre o caso Harry Quebert e a O livro dos Baltimore. A fórmula deu frutos em termos comerciais e Dicker agarrou-se a ela. Meteu-se no terreno que lhe é confortável e não surpreendeu ninguém.

Como os leitores eram muitos, a expectativa era grande. Marcus Goldman e Perry Gahalowood reencontram-se 11 anos depois de terem metido atrás das grades presumíveis homicidas. Aqui, a investigação gira em torno da morte de Alaska Sanders. Residente recente de Mount Pleasant, é encontrada morta em 1999. Em 2010, Gahalowood, sargento de New Hampshire, recebe uma carta anónima que o leva a crer que seguira uma pista falsa. Com Goldman, tenta resolver o caso, numa incursão no caso que inclui Harry Quebert. E temos Dicker a aproveitar o trabalho prévio, piscando o olho aos leitores dos livros anteriores, numa tentativa deliberada de os agarrar, já que o que apresenta agora é coisa pouca em termos de novidade e coesão.

De forma resumida, é mais do mesmo. Dicker encontrou uma fórmula eficaz e satisfez os leitores pouco exigentes, leitores esses que serão como espectadores de uma série de televisão de domingo à tarde. Se não há voos de linguagem, também não parece sequer haver trabalho de linguagem. A técnica cumpre a função de veicular a história e mais nada, parecendo quase ausente de estilo. Em termos de sintaxe e semântica, não há, em quase 700 páginas, um único baque. O livro é um mero suporte.


Título: O caso Alaska Sanders
Autor: Joël Dicker
Editora: Alfaguara
Tradução: Diogo Almeida Paiva

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A história, por sua vez, é aborrecida. Nota-se que o autor quer repetir a fórmula, usar um universo que funcionou anteriormente, apresentando aos leitores um livro que já não respira. Ao dar o que julga que o povo quer, mostra que não tem nada para dar. E, nisto, as personagens têm a espessura de uma folha de papel, a prosa é para lá de pobre, a manipulação temporal está perto de inexistente. A linguagem é de tal forma maquinal que o melhor que se pode dizer da prosa é que não tem erros sintácticos, mas a literatura há-de ser dois degraus acima disso. Ora, Dicker parece não se ter sequer esforçado para subir um. Tudo ali é plano, da emoção da vida à emoção da gente. O autor consegue escrever sobre ciúmes, traições e assassinatos sem ponta de emoção, transformando a vida humana em arquitectura, engenharia e matemática. O romance passa a ser um plano que possibilita que se chape uma história a direito.

Dicker pega na morte de uma mulher, cola-a a um ex-namorado acabado de largar, mergulha no passado dele, apresentando ao leitor um episódio em que se acercou de uma outra ex-namorada com agressividade, e não só nada disto é operante como parece feito a despachar, e isto apesar das centenas de páginas de romance. Tudo é corrido, mas nunca há densidade. As personagens são autómatas, a empatia é impossível. Pega-se aqui e ali num elemento como um mosaico para compôr um resultado final, mas cada capítulo sabe a mosaico singular, sem grande integração na narrativa como um todo orgânico, ainda que as coisas se componham numa estrutura que é demasiado escancarada, planeada, sem vida.

Ainda assim, Dicker lá vai contando a história nos contornos que são o seu propósito. Entretém e descansa a cabeça, salvaguardando o leitor de qualquer trabalho ou sobressalto. A prosa é limpinha, enfileira a história. Não se pode dizer muito mais, além de assumirmos que, como quem segue uma receita, o resultado foi o pretendido: um bolo aborrecido e seco, feito para ninguém morrer à fome.

A autora escreve segundo a antiga ortografia