“Vou deixar o seguimento da reunião à senhora vereadora Filipa Roseta porque infelizmente vou ter que me ausentar”. Foi com esta frase que Carlos Moedas terminou, sem saber, a última reunião de câmara do primeiro ano de mandato. A reunião, pública, já ia longa, mas no ponto extra-agenda ainda estava uma proposta do PCP — e outra de alterações do Livre — sobre o Aeroporto de Lisboa. Antes que a condução dos trabalhos avançasse até esse momento, Carlos Moedas anunciou que tinha de se “ausentar”, deixando Filipa Roseta à frente da reunião. Problema: a discussão não avançou sequer por protesto das demais bancadas.
Perante a saída do presidente da Câmara de Lisboa, João Ferreira, vereador do PCP, não hesitou em notar que o abandono de Carlos Moedas acontecia “precisamente antes da discussão da proposta sobre o aeroporto” que já tinha sido apresentada há várias semanas e que não foi sucessivamente inserida nas ordens de trabalhos das reuniões. Pormenor: o novo Aeroporto de Lisboa tem sido o tema mais sensível para a nova liderança do PSD.
“Não podemos deixar de constatar que é precisamente antes da discussão desta proposta que o presidente opta por se ausentar. Sem quórum esta reunião termina agora, sabemos que estava para ser discutida a proposta do aeroporto, o presidente não explicou porque saiu”, afirmou o vereador comunista, acusando Moedas de um “manifesto desrespeito pelos direitos da oposição”.
“Esta atitude demonstra desrespeito pela oposição, direito de oposição, pela própria cidade e munícipes”, apontou João Ferreira, sugerindo que Moedas era “verdadeira força de bloqueio” de Lisboa ao “optar por não agendar as propostas da oposição”.
“Esta questão é crucial para o presente e futuro da cidade. É uma atitude pouco digna para com o cargo que Carlos Moedas ocupa. Estamos disponíveis para uma reunião extraordinária já que deixou de haver condições a partir do momento em que o presidente se ausentou”, disse João Ferreira.
Com Filipa Roseta a tentar justificar a posição do autarca, dizendo que não havia “nenhum desrespeito” pela oposição, coube à líder da bancada socialista, Inês Drummond, aumentar o tom das críticas, dizendo que a atitude de Moedas era “lamentável” e tecendo duras críticas à condução dos trabalhos da reunião de Câmara.
De resto, a socialista não resistiu em dar uma bicada a Moedas. A propósito da proposta sobre o novo aeroporto, que acabou por não ser discutida, Inês Drummond disse “lamentar muito que não tenha sido votada”, assumindo “curiosidade para perceber qual era posição do presidente da Câmara”.
Bloquista queixa-se de “discriminação” racial
A vereadora do Bloco de Esquerda, Beatriz Gomes Dias, foi a que teceu as críticas mais duras à presidência da mesa da reunião de Câmara (conduzida por Carlos Moedas e depois, por poucos minutos, é certo, por Filipa Roseta). Apontando o exemplo das sucessivas interrupções de que foi alvo — “desde a falta de inscrição, a atropelos”, a bloquista chegou a falar mesmo em “discriminação“.
“Quando falamos de discriminação também são estas atitudes, a forma como as pessoas não brancas são tratadas no contexto onde trabalham”, queixou-se a vereadora, lembrando que o Bloco tem “muitas propostas por agendar, sem qualquer intenção de agendamento”.
O Bloco de Esquerda tem-se queixado sucessivamente da falta de agendamento das propostas, acusando o executivo de violar inclusivamente os prazos regimentais previstos, uma queixa que também o PCP colocou em evidência nos momentos finais da reunião.
Com o ambiente tenso, as vereadoras Filipa Roseta e Laurinda Alves ainda tentaram apelar à votação das três propostas do executivo relativas a apoios a associações do setor social, mas João Ferreira sugeriu que fosse marcada uma reunião extra de câmara ou que os apoios fossem publicados em despacho para serem posteriormente ratificados em reunião posterior, já no pós-férias.
Paula Marques, vereadora independente, e Beatriz Gomes Dias frisaram que “têm tanta legitimidade para apresentar propostas como qualquer vereador com pelouro”, uma vez que foram eleitas, com Paula Marques a lamentar a ausência de discussão da proposta do PCP sobre o aeroporto que considera “matéria determinante na discussão política”.