A pergunta foi colocada por vários deputados na audição a Christine Ourmières-Widener sobre a compensação de meio milhão de euros paga uma ex-administradora. “Há mais Alexandras Reis na TAP?” A presidente executiva da empresa indicou que era uma exceção neste tempo em que é presidente. Mas respondeu ter havido uma compensação paga a um antecessor seu, quando a empresa ainda era privada. Sem revelar o nome (nem o valor), a CEO da TAP estaria a referir-se a Antonoaldo Neves, o gestor executivo que foi escolhido pelos acionistas privados — David Neeleman e Humberto Pedrosa — que compraram a TAP em 2015 para substituir Fernando Pinto.

Christine não se demite. “Gestão tem a missão de seguir em frente e temos atuado de boa fé”

Com a saída de David Neeleman do capital da TAP em 2020 e a tomada de controlo da gestão pelo Estado, que pagou 55 milhões de euros ao empresário americano, o presidente escolhido pelos privados — e cuja estratégia de apoio público à empresa colidia com a do ministro da tutela — foi logo posto de lado por Pedro Nuno Santos que anunciou ainda que o futuro CEO seria escolhido no mercado internacional por uma empresa de recrutamento (head hunter).

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Antonoaldo Neves renunciou ao cargo em setembro de 2020, dois meses depois de o Estado comprar a participação da David Neeleman, mas continuou a receber o salário mensal até ao final do ano, quando terminava o mandato, tal como o Observador noticiou na altura. A TAP confirmou então que o acordo fechado com o antigo CEO teve como objetivo evitar o pagamento de uma indemnização que, por ter sido afastado antes do fim do mandato, seria sempre superior ao valor que não foi indicado.

TAP. Antonoaldo Neves saiu em setembro e recebeu salários até ao final do ano para evitar indemnização

De acordo com informação recolhida então pelo Observador, o vencimento bruto mensal do gestor brasileiro, incluindo despesas com habitação em Portugal e retirando o efeito dos cortes salariais já então em vigor para cargos de gestão, era de 59 mil euros. O que daria uma compensação da ordem dos 150 mil euros pelos três meses que faltavam, considerando que em setembro Antonoaldo ainda estaria em funções, pelo menos parcialmente.

Mas é Antonoaldo Neves uma Alexandra Reis? Há algumas diferenças nos dois casos, a começar pela propriedade da empresa. A TAP à data do gestor brasileiro ainda tinha um acionista privado (Humberto Pedrosa), e a saída do então presidente deu-se por causa de uma mudança de controlo e por vontade expressa do maior acionista, o Estado. Alexandra Reis saiu numa TAP pública por iniciativa da empresa e por vontade da presidente executiva, numa negociação autorizada por um representante do Estado, mas não desencadeada pelo próprio Estado.

Outra diferença é que não houve dúvidas de que a renúncia de Antonoaldo Neves resultou de uma decisão de o afastar tomada pelo acionista, ainda que tenha havido um acordo sobre a compensação a pagar-lhe. O gestor brasileiro estava também muito mais perto do final do mandato do que Alexandra Reis que saiu da TAP quando ainda tinha três anos para cumprir.

O relatório e contas da TAP de 2020 indica apenas a remuneração bruta anual do gestor brasileiro de 505,3 mil euros — sem identificar a compensação acordada pela saída antecipada. E refere também que “não foram pagas, nem são devidas, quais indemnizações devidas a ex-administradores executivos relativamente à cessação das suas funções durante o exercício”. O relatório e contas de 2019 da TAP SGPS, de quando a gestão ainda era privada, não identifica as remunerações dos gestores.

No caso de Alexandra Reis, nas respostas que deu ao Governo sobre a solução de saída negociada com a ex-administradora, a TAP descreve o valor pago de meio milhão de euros como contrapartida ou compensação por cessação antecipada de contratos de mandato atribuído a título de remunerações vicendas (por vencer) e vencidas. Nunca é referido o termo indemnização.