Caiu como uma bomba em Espanha, teve estilhaços a chegar a vários edifícios da Liga, foi sentido de forma diferente em diferentes locais. A notícia de que o Barcelona teria pago um total de 1,7 milhões de euros a um vice do Comité Técnico de Árbitros da Federação Espanhola, José María Enríquez Negreira, quase passou ao lado da imprensa desportiva catalã mesmo sabendo o que estava a acontecer e também não comentários oficiais por parte do Real Madrid, principal rival dos blaugrana. No entanto, há uma frase nesta fase muito ouvida nos corredores de Valdebebas, centro de treinos dos merengues: “O tempo dá e tira razão mas neste caso deu-nos toda a razão”. Porquê essa ideia? Porque entre 2016 e 2018, período em causa neste processo, o Barcelona não teve qualquer grande penalidade assinalada contra si na Liga ao longo de… 78 encontros.

Entre 2016 e 2018, o Barcelona pagou 1,4 milhões a vice-presidente do Comité de Árbitros da Federação

Se antes se falava em teorias da conspiração, agora existe algo palpável sobre todas as críticas que recaíam sobre as arbitragens dos jogos do Barça – mesmo que não se possa formular qualquer ligação direta causa-efeito. Todavia, há motivos para levantar dúvidas. Neste caso, 33 motivos, equivalentes ao número de faturas que foi apresentado à Autoridade Tributária em janeiro de 2021 pelos dirigentes catalães quando Josep Maria Bartomeu era presidente. Destinatário? A empresa de Negreira, como mostra o El Mundo.

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A primeira fatura data de janeiro de 2016 com o valor de 45.228,8 euros, havendo daí para a frente toda uma periodicidade mensal que mudava apenas no valor a ser liquidado, entre os 90.750 euros e os 30.250 euros. O último pagamento, ainda de acordo com a mesma publicação, foi em junho de 2018. Nenhuma das partes negou que as transações tenham acontecido, justificando as mesmas com “assessoria técnica”. No total, e ao contrário do valor inicial levantado de 1,4 milhões, o Barcelona pagou 1,685 milhões em dois anos e meio. “O clube queria assegurar-se de que, com os referidos pagamentos, não seriam tomadas decisões arbitrais contra si, ou seja, que tudo fosse neutro”, salienta o El Mundo, citando a Autoridade Tributária.

O El País explica de forma detalhada o que estaria incluído no “pacote” que foi pago pelos culé até junho de 2018, altura em que Enríquez Negreira deixou de ser vice do Comité Técnico de Árbitros: sempre que havia um jogo da Liga ou da Taça do Rei, com uma cadência no mínimo semanal, era entregue nos escritórios do Barça um dossier que tinha informações por escrito e um DVD com imagens sobre o perfil e o comportamento do árbitro nomeado para o encontro seguinte. Após ser analisado pelos dirigentes, todo esse conteúdo passava para a equipa técnica, que poderia ou não utilizar mediante a sua necessidade. Segundo o mesmo El País, tudo isso era feito também para os compromissos da equipa B dos blaugrana, como foi confirmado em testemunhos recolhidos pelo Fisco de Barcelona de duas pessoas ligadas ao clube.

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Outro dos dados novos revelados pela imprensa espanhola diz respeito ao interlocutor entre o Barcelona e a Dasnil, empresa de Enríquez Negreira: não era o próprio mas sim o filho, Javier. E o seu depoimento acabou mesmo por contradizer o que o pai dissera em primeira instância. Segundo relatou às autoridades policiais, existia essa mesma entrega do dossier aos culé, defendendo assim aquilo que descreveu como um trabalho de consultoria (sendo que a faturação da Dasnil estava resumida praticamente a esta ligação aos catalães). Dirigentes do clube ouvidos ratificaram essa ideia de que o elo de ligação entre ambos era Javier Enríquez, desde 2004 o único administrador da empresa e que se descreve como um coach desportivo.

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Daqui para a frente, sobra uma dúvida que continua ainda por esclarecer: haverá forma de fazer uma ligação direta entre os quase 1,7 milhões de euros pagos pelo Barcelona ao antigo vice do Comité Técnico de Árbitros e uma tentativa de controlar as arbitragens? Sobre isso, ninguém assume qualquer posição. Mas uma coisa é certa: olhando para os Regulamentos e Estatutos da Liga e da Real Federação Espanhola de Futebol, os catalães poderiam até correr o risco de despromoção, um cenário que está ainda longe de poder ainda ser uma hipótese. E este é mais um dos muitos casos que continuam a assolar o clube agora presidido por Joan Laporta, de novo a recair no tempo de gestão de Josep Maria Bartomeu que foi acusado esta semana de ter pago remunerações a vários jornalistas para que pudessem escrever notícias positivas sobre a sua gestão.