Não há fumo branco. Os sindicatos dos professores saíram da reunião com o ministro da Educação, João Costa, a garantir que não houve, mais uma vez, acordo quanto às “seis linhas vermelhas” que tinham definido, tendo a Fenprof aproveitado para anunciar novas greves nos próximos meses, incluindo uma a nível nacional para junho.
Tanto André Pestana, do STOP (Sindicato de Todos os Professores) como Mário Nogueira, da Fenprof, adiantaram à saída que “em princípio” haverá nova reunião com o Governo no dia 20 de março, para falar de “novos temas”, da burocracia nas escolas ao descongelamento do tempo de serviço para alguns docentes. E Pestana disse esperar, desta vez, receber as propostas do Governo “de forma atempada” — “até agora, houve seis reuniões em que apareciam novidades em cima da própria reunião”, criticou.
No entanto, a perspetiva de nova reunião não serviu para pacificar o clima, tendo os representantes dos dois sindicatos criticado a “insensibilidade” e “injustiça” das propostas do Governo e, no caso de Mário Nogueira, acusado o ministro de ameaçar não continuar a negociar enquanto “continuar a luta”.
Quanto à Fenprof, saiu da reunião já com novas formas de fazer essa mesma luta em vista: na segunda-feira, os sindicatos vão reunir-se para apresentar uma proposta formal para a recuperação integral do tempo de serviço dos professores, e entretanto vão preparar uma nova greve por distritos que durará 18 dias úteis. A isto irá juntar-se neste segundo período de aulas uma greve a toda a atividade que vá além da componente letiva normal (ou seja, das aulas), além de estar prevista uma greve às avaliações e outra ao último tempo letivo de cada professor. Fica já com data marcada, para 6 de junho, uma greve nacional acompanhada de uma grande manifestação que “não vai deixar nenhum professor em casa — nem nas aulas”, prometeu.
A irritação dos sindicatos vem também, precisamente, do facto de na agenda para a reunião de dia 20 não constar a hipótese da recuperação integral do tempo de serviço — e enquanto isso não acontecer, “os professores não vão parar”, avisou Nogueira.
Após mais esta ronda negocial, o presidente do STOP, André Pestana, saiu também insatisfeito e com a promessa de uma reunião com “centenas de comissões sindicais em greve” no dia 18, em Coimbra, para decidir formas de “continuar a luta”.
O presidente do sindicato disse estar “surpreendido” por ver que o ministério de João Costa, mesmo perante “tanta mobilização” e semanas de greve, “não responde às questões centrais” e até apresenta propostas — como as que permitem que professores efetivos se desloquem além do seu agrupamento — que podem “aumentar o desgaste e a desmotivação” dos docentes.
No final da reunião, adiantou também que o ministro “não pareceu admitir a questão da contagem integral do tempo de serviço” dos professores, mas antes “a possibilidade de contar algum tempo de serviço para alguns colegas”. “Para nós é altamente injusto”, sentenciou.
Governo disponível para negociar “outras matérias” se for retomada “normalidade das escolas”
O ministro da Educação defendeu, numa conferência de imprensa realizada após o encontro com os sindicatos, “a boa fé com que o Governo se apresentou e se empenhou nestas negociações”, afirmando que o Executivo está disponível para avançar para discussão de “outras matérias” se for retomada a “normalidade das escolas”.
“O Governo está disponível está negociar outras matérias, nomeadamente a correção dos efeitos assimétricos internos à carreira que decorrem do período de congelamento que acabou em 2018; a redução do tempo de trabalho na mono-docência; a redução da burocracia que muitas vezes compromete o trabalho dos professores; e a regularização da situação profissional de muitos técnicos especializados que têm contratos precários há demasiado tempo”, especificou João Costa.
“A disponibilidade que temos para negociar estas matérias deve ser acompanhada da disponibilidade para a retoma da normalidade das escolas, permitindo aos alunos retomarem as suas aprendizagens”, disse ainda o governante, esclarecendo que foi apresentada uma data indicativa para o início das reuniões, 20 de março.
Questionado se a reunião estaria dependente de um recuo por parte dos representantes dos docentes, João Costa não foi perentório e insistiu no mesmo apelo. “O país todo aguarda que haja serenidade. Do nosso lado, não houve nunca uma postura que não fosse dialogante e de abertura”, disse, acrescentando: “É nesse espírito que queremos continuar, mas, obviamente, apelando a que tenhamos condições de um diálogo construtivo e sereno”.
Ministério da Educação vai abrir no mínimo 20 mil vagas para o quadro no concurso de 2024
O ministro da Educação anunciou anunciou que está prevista a abertura de 20 mil vagas nos quadros de escola em 2024, uma das medidas previstas no âmbito da revisão do regime de recrutamento.
“As escolas precisam de estabilidade nas suas equipas docentes, e os docentes precisam de se fixar em escolas e não em regiões”, disse o governante na mesma conferência de imprensa, anunciando que, no concurso de 2024, será “aberto um mínimo de 20 mil vagas em quadro de escola”. “À medida que houver saídas por aposentação, serão abertas anualmente vagas de quadro permitindo que os professores possam, todos os anos, aproximar-se da sua área de residência”, esclareceu.
Esta é uma das medidas previstas no âmbito da revisão do regime de mobilidade e recrutamento de professores.
João Costa explicou que a abertura dessas vagas vai permitir cumprir o objetivo de fixar nos quadros das escolas 90% dos professores vinculados, mantendo apenas 10% em quadro de zona pedagógica, para suprir necessidades temporárias. Para o ministro, esta é uma das várias alterações ao modelo atualmente em vigor, que vai permitir “responder a problemas antigos dos professores” e “melhorar objetivamente as suas condições de trabalho”.
O ministro da Educação detalhou as algumas das diferenças em relação à proposta inicial e, se em alguns temas não recuou, como na possibilidade de professores com horário incompleto darem aulas em duas escolas, noutras aproximou-se das reivindicações sindicais. É o caso dos critérios para a vinculação dinâmica, condições para progressão remuneratória dos professores contratados, redução da área geográfica dos quadros de zona pedagógica, bem como a contratação direta pelas escolas, que teve mereceu oposição das organizações.
Por outro lado, à saída da reunião, os sindicatos justificaram a falta de acordo afirmando que a proposta final mantém as linhas vermelhas identificadas e quando questionado sobre essa posição, o ministro afirmou que os próprios representantes dos professores chegaram a admitir que houve avanços.
“Ainda que não tenhamos o acordo global, temos certamente, como, aliás, reconhecido nas reuniões pelos sindicatos, muitos pontos que registaram como positivos e como avanços”, disse João Costa. “Só consideraria que não estaria em condições de negociar se tivesse uma atitude monolítica de assumir que a chegada é igual à partida e, de facto, demos muitos passos”, acrescentou quando questionado se considerava que tinha condições para se manter no cargo devido ao resultado das negociações.
A propósito de algumas das alterações, que deverão entrar em vigor ainda este ano, o ministro esclareceu que as vinculações e evolução de posições remuneratórias terão um custo acumulado de cerca de 143 milhões de euros e assegurou que serão pagas as deslocações aos professores que acumulem horário em duas escolas.
Serviços mínimos e uma queixa contra a tutela
Num momento em que decorrem as negociações entre a tutela a os sindicatos, os professores têm saído à rua, marcando as maiores manifestações deste setor dos últimos anos. E, a par das manifestações, as várias estruturas sindicais têm marcado diferentes greves, que levaram o ministério da Educação a impor serviços mínimos para as paralisações que aconteceram nos dias 2 e 3 deste mês.
Na sequência desta decisão de obrigar os professores a cumprir serviços mínimos, nove estruturas sindicais avançaram com uma queixa no Tribunal da Relação. E os sindicatos anunciaram também, esta terça-feira, que vão apresentar queixa na Inspeção-Geral de Educação contra os diretores escolares que não terão respeitado o direito à greve.
“É absolutamente inadmissível o que se está a passar nas escolas”, disse Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, acrescentando que as escolas estão a aplicar “serviços mínimos ilegalmente”. “Os serviços mínimos só se podem acionar se forem precisos, mas os diretores estão a impedir os professores de irem a consultas médicas, de irem a funerais de parentes próximos ou de irem a reuniões sindicais.”