Rui Rodrigues já tinha dito várias vezes aos amigos, com quem se juntava depois das aulas, no regresso ao Feijó: ia desviar um avião. Na altura, todos se riram muito: o que seria, um miúdo de 16 anos desviar um avião.
Quando aconteceu e começaram a ouvir as notícias, foram apanhados de surpresa, mas não tanto como os pais de Rui — ou o resto dos portugueses, em choque com a informação que começava a chegar a conta-gotas, ainda sem se conhecer a identidade do pirata do ar. O amigo não tinha ido à escola naquele dia, nem tinha voltado para casa. Ligaram os pontos e rapidamente perceberam: afinal, o Rui estava a falar a sério.
Naquela noite de 6 de maio de 1980, nenhum deles foi à cama. Francisco Sá Carneiro, primeiro-ministro eleito há escassos meses, também não. E os jornalistas portugueses muito menos. No dia seguinte, já faziam o retrato do bom aluno e filho exemplar, fã de óvnis, que nunca tinha passado uma única noite fora de casa e agora exigia dez milhões de dólares em troca das vidas de passageiros e tripulação. E publicavam também uma alcunha, que perdura até hoje: Rui Rodrigues era o “Piratinha do Ar”.
[Pode ouvir aqui o trailer do “Piratinha do Ar”]
Trailer “Piratinha do Ar”. A história do desvio de um avião da TAP
Depois do sucesso de “O Sargento na Cela 7”, o podcast narrativo que revelou a história de António Lobato, o militar português que mais tempo passou em cativeiro durante a guerra de África, o Observador apresenta o seu novo Podcast Plus.
“Piratinha do Ar” conta a história de Rui Manuel da Costa Rodrigues, o adolescente que, no início da década de 1980, armado de uma pistola que alguém tinha em tempos abandonado no táxi do pai, faltou ao liceu e embarcou no voo noturno de Lisboa para Faro. Depois, já a sobrevoar o Algarve, cumpriu o resto do plano que tinha magicado ao longo de meses: invadiu o cockpit, que em plena era dourada da pirataria aérea nem fechadura tinha, e obrigou o Boeing 727 da TAP a ser desviado para Madrid, com outros 82 passageiros a bordo.
Este podcast narrativo é também uma viagem à vida na década de 80 — as músicas, os programas de televisão e as obsessões dos adolescentes.
Tal como “O Sargento na Cela 7”, que já foi ouvido mais de meio milhão de vezes, esta é uma série para ouvir em seis episódios, que vão estar disponíveis todas as terças-feiras, não apenas no site e nas redes sociais do Observador mas também em todas as habituais plataformas de podcast.
A narração da história está a cargo da atriz Margarida Vila-Nova e o músico David Fonseca é o autor da banda sonora original. O guião e as entrevistas são de Miguel Cordeiro, a sonoplastia é de Beatriz Martel Garcia e a edição é de João Santos Duarte.
Ao longo de vários meses, o Observador mergulhou nos arquivos da imprensa, teve acesso ao processo entretanto desencadeado em tribunal, entrevistou os principais intervenientes no episódio e resgatou da memória dos anos 80 os planos, as motivações e as frustrações do imberbe pirata do ar português.