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Em abril uma derrota com a Austrália, em julho dois nulos frente a Portugal e Canadá. Os jogos recentes não tinham o melhor registo para uma Inglaterra que há um ano era vista quase como imbatível mas as vitórias no Europeu e na Finalíssima tiveram o condão de quebrar uma barreira que parecia impossível no histórico do conjunto das Leoas: ganhar uma competição. Agora, o objetivo passava por dar o passo que faltava e ter a força para prolongar o momento com a conquista do Mundial, chegando à Austrália e à Nova Zelândia como uma das principais equipas com aspirações a desafiar os favoritos EUA. E tudo começava quase com um passeio frente ao Haiti, inevitável destino de férias por esta altura que deu o salto no futebol feminino.
Nem tudo foi perfeito a nível de preparação, com algumas baixas de peso por lesão onde se incluíam Beth Mead (melhor marcadora do último Europeu), a capitã Leah Williamson ou a criativa Fran Kirby além das já retiradas Ellen White e Jill Scott e de outros casos que chegaram à fase final no limite como Millie Bright. Ainda assim, sobrava confiança numa treinadora que parece ter toque de Midas na formação britânica desde que chegou, a neerlandesa Sarina Wiegman, e a garantia de que aquele primeiro jogo que é sempre o mais complicado pela ansiedade extra que carrega seria na teoria um treino competitivo de resultado certo.
Era contra isso que o Haiti ia jogar, numa das equipas com mais histórias neste Mundial. Entre a convulsão política e social que o país viveu nos últimos anos, com aumento da insegurança e alguns fenómenos naturais que iam fustigando ainda mais o seu quotidiano, a equipa feminina, que se viu envolvida também num escândalo de abusos sexuais a envolver o presidente da Federação, tinha a ambição de ser uma espécie de luz de esperança em tempos difíceis entre todas as fragilidades que não serão apagadas num par de anos. “O nosso maior objetivo é criar um futuro melhor para o Haiti como um todo e ser uma lufada de ar fresco entre tudo o que tem acontecido”, destacava Danielle Etienne, jogadora que teve grande importância na fase de apuramento apenas três meses depois de ser mãe. Ela, mais do que ninguém, era um exemplo.
Tudo o que era escrito sobre o Haiti acabou por ser pouco perante a exibição da equipa na primeira parte, que terminou já com a formação das Caraíbas a “pedir” o intervalo pelo desgaste físico mas com o condão de ter conseguido equilibrar bem mais a partida a nível de oportunidades do que se pensava. Aliás, depois de uma primeira ameaça de Alessia Russo, foram mesmo as haitianas a terem a melhor chance até ao descanso, com Roselord Borgella a atirar ao lado isolada na área após uma grande assistência de Dumornay (14′). Entre o domínio da Inglaterra, só mesmo de grande penalidade a formação europeia conseguiu quebrar a série de três partidas consecutivas sem golos, com Kerly Theus a defender a primeira tentativa de Georgia Stanway mas a não conseguir repetir a façanha após repetição por intervenção do VAR (29′). Mesmo com o 1-0, eram as inglesas que tinham mais para refletir do que as haitianas, que se estavam a “aguentar” bem.
Afinal, a segunda parte foi mais do mesmo. A Inglaterra foi somando mais oportunidades para chegar ao segundo golo que acabasse de vez com o encontro mas o Haiti nunca deixou de procurar as saídas rápidas e conseguiu mesmo colocar à prova Mary Earps, num dos poucos remates enquadrados. Kerly Théus manteve o destaque na baliza e os minutos iam passando com aquela sensação de que as inglesas se poderiam colocar a jeito para uma bola parada ou um erro numa transição que colocasse em risco o triunfo. Não aconteceu. No entanto, e mesmo perdendo, foi o Haiti que saiu com a “vitória” de ter deixado uma excelente imagem, sendo que Roseline Éloissaint teve o empate nos pés a dez minutos do final para nova defesa de Mary Earps.
A pérola
- Depois de uma primeira parte sem defesas mas com um grande susto, Mary Earps, considerada a melhor guarda-redes do mundo em 2022, teve um papel fulcral na vitória da Inglaterra com duas grandes defesas que impediram o “escândalo” que seria o empate do Haiti. Mais uma vez, a número 1 inglesa do Manchester United foi o garante do triunfo e ganhou pontos naquela que é a sua “guerra” fora de campo: fazer com que a Nike coloque à venda também o seu equipamento tal como faz com o das jogadoras de campo, estando mesmo disponível para pagar todo o custo que isso tenha. “Para mim é muito difícil perceber que a minha família, os meus amigos, as minhas pessoas mais queridas e os adeptos não possam ter uma camisola minha. As guarda-redes são importantes”, destacou.
A performance like no other from The Best FIFA Goalkeeper! ????????????????????????????????@Lionesses | #FIFAWWC
— FIFA Women's World Cup (@FIFAWWC) July 22, 2023
O joker
- Chama-se Melchie Dumornay, é mais conhecida como Coventina. Qualquer que seja o nome pelo qual seja referida, promete ser um daqueles que vai ser muito e muito falado – e não foi por acaso que o Lyon já se antecipou e contratou a jogadora de 19 anos ao Reims. Todos os lances de perigo nasceram dos pés da número 6 haitiana, que provou tudo aquilo que se escreveu antes sobre o potencial para chegar ao topo do futebol mundial a médio prazo e foi sempre um quebra cabeças para o meio-campo inglês, deixando muitas vezes Keira Walsh a corrigir as companheiras para travar a referência haitiana.
A sentença
- A Inglaterra lidera o grupo D com três pontos e fica agora a aguardar pelo resultado da partida entre Dinamarca e China. No entanto, aquilo que sobra deste primeiro encontro é que as inglesas terão de subir e muito o nível de jogo (que valeu por exemplo a vitória no último Europeu) para não serem surpreendidas num grupo com três candidatos aos oitavos e com um Haiti que pode tirar pontos em qualquer partida da fase de grupos do Mundial, como se viu na estreia diante das britânicas.
A mentira
- Ainda antes do Mundial, e partindo do favoritismo dos EUA à conquista do terceiro título consecutivo, falava-se muito da qualidade das formações europeias para, a par de Japão ou Canadá, desafiarem as norte-americanas pelo troféu. Até agora, Espanha e Suíça cumpriram em encontros teoricamente mais acessíveis mas a Noruega perdeu com a Nova Zelândia e a Inglaterra revelou dificuldades para bater o Haiti. A maioria das equipas da Europa podem ser melhores mas o fosso tem vindo a ser reduzido.