Dizem que as imagens valem mais do que mil palavras. Este domingo, porém, foi a importância da imagem associada às palavras que deu importância ao momento: enquanto o hino nacional tocava em Dunedin, a primeira vez que foi ouvido num Campeonato do Mundo feminino, Jéssica Silva e Tatiana Pinto não aguentaram as lágrimas enquanto cantavam abraçadas. De repente, na Nova Zelândia e literalmente do outro mundo, o futebol feminino português vivia o dia mais importante da sua história.

A caminhada foi longa, com Portugal a ser mesmo a equipa que mais jogos disputou até chegar ao Mundial, mas compensou. Este domingo, contra os Países Baixos, a Seleção Nacional estreava-se na competição e procurava alcançar um resultado que permitisse entrar nas duas jornadas restantes da fase de grupos com a possibilidade de sonhar. Ou seja, não podia perder com as neerlandesas para ter margem de manobra para sofrer a expectável derrota com os Estados Unidos e cumprir ao vencer o Vietname.

Ficha de jogo

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Países Baixos-Portugal, 1-0

Fase de grupos do Campeonato do Mundo feminino

Forsyth Barr Stadium, em Dunedin (Nova Zelândia)

Árbitro: Kateryna Monzul (Ucrânia)

Países Baixos: Van Domselaar, Van der Gragt, Roord, Beerensteyn (Snoeijs, 87′), Spitse, Van de Donk (Egurrola, 80′), Martens, Groenen, Pelova (Casparij, 90+4′), Janssen, Brugts

Suplentes não utilizados: Kop, Weimar, Baijings, Dijkstra, Van Dongen, Jansen, Kaptein, Nouwen, Wilms

Treinador: Andries Jonker

Portugal: Inês Pereira, Ana Borges, Diana Gomes, Carole Costa, Catarina Amado (Lúcia Alves, 79′), Dolores Silva (Kika Nazareth, 67′), Fátima Pinto, Tatiana Pinto, Andreia Norton (Andreia Jacinto, 79′), Diana Silva (Telma Encarnação, 79′), Jéssica Silva

Suplentes não utilizados: Patrícia Morais, Rute Costa, Sílvia Rebelo, Joana Marchão, Ana Rute, Ana Seiça, Carolina Mendes, Ana Capeta

Treinador: Francisco Neto

Golos: Van der Gragt (13′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Jéssica Silva (56′), a Van de Donk (78′), a Diana Gomes (84′)

“É bom estar cá, é bom participar, mas será melhor competir. E é isso que nós queremos. Nós queremos ser competitivos, organizados. Aquilo que diz a história desta equipa é que tem partido sempre abaixo das outras no ranking e não foi por isso que não conseguimos atingir os nossos objetivos. Nas fases finais tem sido duro, tem sido difícil. Temos crescido, temos sido competitivos, mas também ainda não tivemos os resultados que gostaríamos de ter e queremos tentar ao máximo que neste Mundial consigamos dar esse passo em frente, sabendo que é sempre muito difícil. Temos as nossas armas, a nossa ambição, o nosso coração. E é isso que temos de meter no campo amanhã”, explicou Francisco Neto, o selecionador nacional, na antevisão da partida.

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Neste contexto, o treinador optava por apresentar um 4x4x2 losango, abdicando de um elemento na frente de ataque para encaixar Fátima Pinto, Dolores, Tatiana Pinto e Andreia Norton no meio-campo. Kika Nazareth, que esteve limitada fisicamente nos primeiros dias da concentração, começava no banco, com Diana Silva a fazer companhia a Jéssica Silva no setor ofensivo. Do outro lado, nuns Países Baixos que são vice-campeões do mundo e que foram campeões europeus em 2017, Andries Jonker não podia contar com a lesionada Miedema e lançava Beerensteyn e Mertens no ataque.

Os instantes iniciais demonstraram desde logo que as neerlandesas iriam apostar nos lances de bola parada e nos cruzamentos para a área, aproveitando a fragilidade portuguesa no jogo aéreo — que já tinha ficado em evidência no último Europeu, há um ano. Beerensteyn protagonizou a primeira jogada mais perigosa, com um remate que passou por cima (12′), e os Países Baixos acabaram mesmo por abrir o marcador ainda dentro do primeiro quarto de hora.

Na sequência de um canto cobrado na direita, Van der Gragt foi mais forte do que Tatiana Pinto e Fátima Pinto nas alturas e cabeceou ao segundo poste para bater Inês Pereira (13′). O lance começou por ser anulado pela árbitra assistente, por fora de jogo, mas Kateryna Monzul acabou validar o lance após analisar as imagens do VAR. Roord poderia ter aumentado a vantagem pouco depois, com um cabeceamento por cima depois de outro canto (25′), e a reação portuguesa ao golo sofrido era parca ou inexistente.

A Seleção Nacional tinha muitas dificuldades para passar do meio-campo e Jéssica Silva e Diana Silva pouco ou nada eram solicitadas, permanecendo muito isoladas na frente de ataque. Apesar da superioridade numérica no meio-campo, Portugal não conseguia responder à pressão alta e intensa dos Países Baixos e deixava-se tombar por completo para o lado esquerdo do relvado — ou seja, Ana Borges não só não conseguiu realizar as habituais arrancadas na direita como mal apareceu no jogo durante a primeira parte.

As neerlandesas somaram várias oportunidades de golo até ao intervalo, destacando-se um cabeceamento de Van de Donk que Inês Pereira encaixou (39′), e Portugal terminou a primeira parte a perder e claramente por baixo, não conseguindo contrariar a evidente superioridade das adversárias.

Francisco Neto não fez qualquer alteração ao intervalo, apesar de ter colocado Kika, Telma Encarnação e Joana Marchão em exercícios de aquecimento, e não foi preciso esperar muito para perceber que Portugal tinha regressado do balneário com outra atitude. Jéssica Silva teve desde logo o primeiro remate, a atirar ao lado depois de ser lançada em velocidade (51′), e a Seleção conseguia demonstrar outra capacidade para atacar o último terço e causar mais problemas à defesa adversária.

Inês Pereira voltou a estar em evidência com uma enorme defesa a um remate de Van de Donk (52′) e os Países Baixos continuavam a apostar na profundidade, com Beerensteyn a ser o verdadeiro motor da equipa. Francisco Neto mexeu a pouco mais de 20 minutos do fim e naquele que parecia ser o melhor momento de Portugal em todo o jogo, trocando Dolores por Kika, mas a maior posse de bola nacional não tinha consequências práticas. A seleção portuguesa estava no meio-campo adversário, ganhava duelos, soltava a velocidade — mas não criava oportunidades.

O selecionador nacional voltou a mexer a pouco mais de 10 minutos do fim, lançando Lúcia Alves, Andreia Jacinto e Telma Encarnação, e Andries Jonker respondeu com a entrada de Damaris Egurrola. A avançada do Marítimo protagonizou a melhor ocasião de Portugal, com um remate de pé esquerdo que Van Domselaar defendeu (82′), mas o resultado não voltou a alterar-se até ao apito final.

Portugal perdeu com os Países Baixos na histórica estreia em Campeonatos do Mundo e complicou as contas no Grupo E, ficando agora muito dependente do que fazem as neerlandesas perante Estados Unidos e Vietname. Num dia em que Kika não conseguiu fazer a diferença a partir do momento em que entrou em campo, fica a ideia de que Telma Encarnação poderia ter tido mais minutos — até porque foi a única que, ao longo de todo o jogo, conseguiu criar uma verdadeira oportunidade de golo.