Advogados de Direito do Trabalho alertam para as dificuldades práticas da portaria que fixa em 22 euros por mês o valor limite isento de impostos e contribuições da compensação paga pelas despesas adicionais com teletrabalho.

A portaria, que foi publicada esta sexta-feira em Diário da República e entra em vigor em 1 de outubro, estabelece o valor de 22 euros por mês (correspondente a 22 dias de trabalho) como limite de isenção, montante que poderá ser majorado em 50% se for definido na negociação coletiva.

Uma vez que a portaria apenas produz efeitos a partir de 01 de outubro de 2023, só a partir da referida data é que os valores pagos a este título e dentro dos limites aí previstos beneficiarão da isenção”, afirma à Lusa Tiago de Magalhães, advogado de Direito do Trabalho da CMS.

Segundo o especialista, os valores que já tenham sido pagos até outubro, mesmo que dentro do limite previsto, “não poderão beneficiar da isenção, desde logo porque não é feita nenhuma salvaguarda nesse sentido nem a portaria prevê qualquer efeito retroativo”.

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Tiago de Magalhães considera ainda que as normas previstas na portaria podem revelar-se de difícil execução.

À semelhança do que tem acontecido com as disposições legais que regulam o teletrabalho, também esta portaria vem dificultar a aplicação prática da modalidade de teletrabalho”, realça o advogado.

A portaria apenas prevê o limite de isenção para “dias completos de teletrabalho”, mas imaginando uma situação em que o trabalhador apenas está em teletrabalho no período da manhã, ou só no da tarde “serão estes períodos somados até que seja totalizado o referido limite ou deverá ser entendido dia completo por referência a um dia de calendário?”, questiona.

Outra dúvida, diz, pode ocorrer com o limite de isenção em 50 cêntimos por dia das despesas relacionadas com o uso de computador pessoal. “Significa isto então que nos casos em que a empresa disponibiliza o computador, o limite de isenção é reduzido em 50 cêntimos por dia?”.

Para o advogado da CMS “significa que o limite isento irá variar de trabalhador para trabalhador, podendo, no limite, não estar sequer isento”.

Já o advogado Pedro da Quitéria Faria, da sociedade Antas da Cunha Ecija, que considera o valor isento “baixo face àquilo que podem ser os consumos” do trabalhador, aconselha as empresas a atualizarem os acordos de teletrabalho “através de aditamentos ou adendas”.

Pedro da Quitéria Faria alerta para problemas “de ordem prática” que poderão surgir nos recursos humanos das empresas, como por exemplo “comparar faturas, titularidade das faturas, dimensão do agregado, casas ou equipamentos mais eficientes energeticamente do que outros, consumos diferenciados”.

Não havendo acordo, mantêm-se os problemas da prova através de faturas, comparando os valores dos gastos correntes com os anteriores à passagem a teletrabalho”, acrescentou o advogado da Antas da Cunha Ecija.

Em termos práticos e operacionais, “levanta-se ainda a problemática das despesas acima deste valor e, bem assim, a prova diabólica do valor excedente através das faturas e do método comparativo”, referiu.

No entanto, Pedro da Quitéria Faria afirma que, “ainda que pecando por tardia, revela-se muito positiva a publicação da portaria, a qual vem resolver um conjunto de dificuldades que o tema levantava, já mesmo depois da entrada em vigor da Agenda do Trabalho Digno”.

Essas dificuldades redundaram, em alguns casos, em empresas que não pagaram qualquer valor por não saberem o que pagar, por desconhecimento do valor máximo isento e, bem assim, por não quererem ou não poderem arriscar pagar acima do valor que viesse a ser considerado como isento e tal indefinição, consequentemente também prejudicou os trabalhadores”, concluiu.

A portaria define um valor diário de 10 cêntimos para compensar custos adicionais com eletricidade, de 40 cêntimos para compensar custos de internet pessoal e de 50 cêntimos pelo uso de computadores e equipamentos próprios.

Na prática, estes valores resultam em um euro por dia para as despesas adicionais com teletrabalho (22 euros por mês, tendo em conta 22 dias de trabalho), podendo ser majorados em 50% se definidos na negociação coletiva.

A portaria do Governo estava prevista nas alterações laborais aprovadas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, que entraram em vigor em maio. A Agenda do Trabalho Digno passou a prever que o contrato de trabalho deve fixar, na celebração do acordo para prestação de teletrabalho, o valor da compensação ao trabalhador pelas despesas adicionais.