Este artigo é da responsabilidade da PLMJ

Texto: Rita Aleixo Gregório, Sócia da área de Europeu e Concorrência

Pela natureza das coisas, o Direito não é nem poderia ser imune a modas, nem às tendências que com elas surgem. Se assim fosse, ainda hoje vigoraria entre nós a bem conhecida Lei de Talião, por exemplo, que – no essencial e de forma simples – determina a reciprocidade entre a pena e o crime (ou, dito de outro modo, manda aplicar o princípio “olho por olho, dente por dente”). O Direito é, nesse sentido, evolutivo, mesmo naqueles casos em que aparenta ser mais disruptivo.

Veja-se o Direito da Concorrência. Podia começar-se por atentar nas diferentes escolas de pensamento e nos contextos a elas subjacentes, que ditaram os diferentes objetivos e as diferentes evoluções deste ramo do direito no mundo. Fruto das modas e tendências que surgiram à época.

Mas avance-se na linha cronológica – afinal de contas, não é necessário retroceder às origens para se observar este fenómeno.

Repare-se como a sustentabilidade, a diversidade, a inflação ou a disrupção das cadeias de abastecimento têm sido assinaladas como preocupações que importa ao Direito da Concorrência, de algum modo, considerar. Note-se como a importância do mundo digital tem ditado o desenvolvimento de teorias de dano.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Assinale-se, ainda, a maior intervenção pública em determinadas matérias há muito existentes, mas anteriormente mais esquecidas, como a não notificação prévia de operações de concentração (gun jumping). Ou observe-se como a aplicação do direito da concorrência tem evoluído de uma intervenção pública para uma intervenção também privada (private enforcement).

Atente-se, de igual modo, na maior abrangência conferida à proteção contra práticas restritivas, passando-se a estender o âmbito de aplicação do Direito da Concorrência aos mercados laborais.

E tantos outros exemplos poderiam ser avançados a propósito das tendências recentes no Direito da Concorrência. Não podendo focar em todos eles, foram os três últimos selecionados para serem objeto de debate e ponderação por vários stakeholders, no próximo dia 10, no auditório da PLMJ. A sua importância, novidade e atualidade no panorama nacional ditaram essa seleção.

Tem-se assistido, com efeito, a um aumento da atividade da Autoridade da Concorrência (AdC) na aplicação das regras de gun jumping nos casos em que o dever de notificação prévia de concentrações não terá sido cumprido. Importa, assim, conhecer os vários contornos que esta prática pode assumir, assim como não será demais saber se se pode esperar um incremento da atuação da AdC noutras vertentes de gun jumping, no curto a médio prazo.

Tem-se assistido, igualmente, a uma proliferação das chamadas ações de private enforcement (i.e., ações de indemnização por danos resultantes de infrações às regras de concorrência). Estas ações, que podem assumir diferentes configurações (stand alone ou follow on), suscitam diversos desafios sob uma perspetiva não apenas jurídica, mas também económica. Além disso, deram impulso à propositura de um tipo de ações menos tradicional em Portugal, mas que começa a vulgarizar‑se, apesar das (muitas) questões que se têm vindo a colocar – as ações populares.

Tem-se assistido, por fim e de uma forma pioneira (no contexto europeu), à extensão pela AdC do direito da concorrência aos mercados laborais. Os acordos recíprocos entre empresas com vista à não contratação de trabalhadores (no poach) são proibidos. Mas estas não são as únicas condutas proibidas no âmbito dos mercados laborais (nos quais se incluem temas de contratação coletiva).

As modas, já o dissemos, são transitórias, são passageiras, são efémeras ou fugazes. Mas, se as tendências recentes no Direito da Concorrência, delas resultantes, vieram para ficar, só o tempo o dirá. Por ora, importa estar ciente da sua existência. E importa perceber como estão a ser seguidas.