O Tribunal Central de Instrução Criminal anulou a acusação do Ministério Público (MP) a Isaltino Morais por falta de interrogatório ao presidente da Câmara de Oeiras, uma decisão que afeta também os ex-autarcas Susana Amador e Ministro dos Santos.
Segundo o despacho da juíza de instrução Carina Realista Santos, adiantado esta segunda-feira pelo Expresso e a que a Lusa teve também acesso, está em causa uma insuficiência do inquérito, com a magistrada a deixar críticas à atuação do MP.
Após a acusação ser conhecida, Isaltino Morais pediu a abertura de instrução e alegou que não tinha sido interrogado. De acordo com a decisão, o autarca de Oeiras foi notificado para ser interrogado no dia 07 de agosto de 2017, em pleno período de férias judiciais, recebendo apenas um sumário da matéria do processo, pelo que decidiu pedir a consulta “deixando expresso pretender prestar declarações”.
“Tendo sido invocada a ilegalidade de o procedimento do interrogatório do arguido Isaltino Morais ter decorrido em período de férias judiciais, sem qualquer fundamento para o efeito, nada foi regularizado e, mesmo agora, o Ministério Público não tira qualquer conclusão sobre esse vício”, lê-se na decisão, que faz assim regressar os autos ao MP.
A juíza assinala os “longos anos” da investigação, cujo inquérito foi aberto em 2011 e apenas conheceu despacho de acusação em 2022, e a ausência de “qualquer explicação para a rapidez processual muito pontual” associada a um interrogatório em período de férias judiciais, que acabou por declarar inválido, tendo como consequência a anulação da acusação.
“O que não se percebe, para além da irregularidade já referida, é que, num processo tão demorado, no verão de 2017, para aparentar o cumprimento de um ato essencial do inquérito, que foi logo questionado, não tenha havido o cuidado de definir a situação do arguido Isaltino Morais, ficando o mesmo na expectativa (legítima, em face do sucedido) de ser interrogado”, frisou, resumindo: “Entendo que efetivamente foi omitido o interrogatório”.
O despacho aponta ainda outra irregularidade ao MP, por não ter separado a acusação para os arguidos titulares de cargos políticos, que têm um regime processual próprio.
Em reação, o advogado de Isaltino Morais defendeu que o TCIC repôs a legalidade ao anular a acusação do Ministério Público ao presidente da Câmara de Oeiras por falta de interrogatório. “Foi cumprida a lei e o TCIC fez com que fosse comprida a lei, uma vez que Isaltino Morais tinha manifestados a intenção de depor na fase de inquérito após consultar o processo e essa oportunidade não lhe foi dada”, disse à Lusa Rogério Alves. O advogado considerou também que “a decisão é correta e adequada em termos da lei”, sendo essa a expectativa da defesa do autarca de Oeiras.
A advogada de Ministro dos Santos, por seu turno, considerou “inaceitável que o MP mantenha um processo na fase de inquérito durante 11 anos” e que “cidadãos, que beneficiam da presunção da inocência, se vejam constituídos como arguidos e submetidos a medidas de coação e, por consequência, a restrições dos seus direitos, liberdades e garantias” .
Numa resposta enviada à Lusa, Maria Manuel Candal disse também que é “lamentável que o MP cometa um erro tão crasso como é o da falta de interrogatório de um dos arguidos na fase de inquérito”. Segundo a advogada, o inquérito iniciou-se em 2011 e a acusação foi deduzida em 2022. Já o advogado de Susana Amador escusou-se a fazer qualquer comentário.
Isaltino Morais, a ex-presidente da câmara de Odivelas Susana Amador e o ex-autarca de Mafra Ministro dos Santos foram acusados em setembro de 2022 do crime de prevaricação de titular de cargo político, que é punível com pena de prisão entre dois e oito anos.
Entre os arguidos no processo encontram-se o antigo presidente da Câmara de Oeiras Paulo Vistas (que na altura dos factos era vice-presidente), o presidente do conselho de administração da empresa MGR — Engenharia e Construção, Fernando Gouveia, o presidente do conselho de administração da empresa de consultoria FSCD, Marco Carreiro, o antigo vice-presidente da Câmara de Mafra Gil Rodrigues e o ex-vereador da Câmara de Odivelas Paulo Teixeira.
Os arguidos Fernando Gouveia e Marco Carreiro tinham sido acusados, cada um deles, por três crimes de prevaricação de titular de cargo político, enquanto Isaltino Morais, Paulo Vistas, Susana Amador, Ministro dos Santos, Gil Rodrigues e Paulo Teixeira foram acusados, cada um, por um crime de prevaricação de titular de cargo político.