Era o encontro mais aguardado não só da qualificação da América do Sul para o Mundial mas também de todas as dezenas e dezenas de jogos entre seleções de todos os continentes. Mais: era o encontro que estava a ser ainda mais aguardado tendo em conta que a última vez em que Brasil e Argentina se defrontaram houve apenas cinco minutos antes da interrupção da Agência Nacional de Vigilância Sanitária brasileira, alegando que quatro jogadores argentinos (Buendía, Lo Celso, Romero e Emiliano Martínez) tinham quebrado aquele que era o protocolo obrigatório da Covid-19 ao omitirem a passagem pelo Reino Unido nos 14 dias anteriores à entrada no país. No entanto, tornou-se o encontro aguardado por mais meia hora em relação ao horário de início previsto (21h30 no Rio de Janeiro, 00h30 em Portugal) e por razões ainda mais lamentáveis.

Autoridades sanitárias interrompem clássico aos 5′: Argentina deixou estádio três horas depois, jogo foi suspenso e Brasil… treinou

Depois de uma entrada muito serena das equipas com um ambiente de fair play que ficou bem ilustrado no cumprimento amigável entre os técnicos Fernando Diniz e Lionel Scaloni, ouviram-se os hinos mas já não chegou a haver escolha de campo ou bola: no seguimento de problemas no topo sul de um Maracanã que estava a rebentar pelas costuras, os jogadores argentinos dirigiram-se em passo acelerado para o local (Leo Messi ainda levava na mão o galhardete que ia trocar com Marquinhos, capitão do Brasil) e viram de perto a confusão e o pânico instalados. Houve de tudo um pouco, entre cargas policiais, agressões entre adeptos, cadeiras a voar e jogadores a tentarem saltar para a bancada, com Romero e Emiliano Martínez a serem os mais desagradados e com o guarda-redes a dar mesmo uma palmada num segurança no meio do caos que estava instalado entre mulheres com crianças ao colo que choravam perante todo aquele cenário.

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Ato contínuo, e quando as coisas pareciam um pouco mais controladas (pelo menos um adepto foi retirado de maca para o hospital), Messi liderou a equipa até ao balneário numa fase em que não se sabia sequer se poderia ainda haver jogo ou não. Com atraso, grande, mas houve. E meia hora depois da hora prevista lá houve o apito inicial, sendo que antes Messi e Rodrygo já se tinham picado de forma mais agressiva sem que o jogo tivesse sequer começado. Os nervos estavam à flor da pele num dos maiores jogos entre seleções do mundo, sendo que o Brasil chegava com a pior entrada em fases de qualificação e sabendo que seria a despedida de Fernando Diniz antes da provável chegada de Carlo Ancelotti (e logo no recinto onde, com apenas 7.800 pessoas nas bancadas, a Argentina ganhou a Copa América de 2021 frente aos anfitriões).

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A primeira parte acabou por ser um reflexo de toda essa tensão, num encontro praticamente sem chances de golo para ambos os conjuntos e com um total de 22 faltas. Para se ter noção do quão atípico estava a ser o jogo, o Brasil cometeu 16 infrações em 45 minutos, sendo que o ex-sportinguista Raphinha (que lutava de forma direta com um antigo companheiro em Alvalade, Marcus Acuña) quase arriscou um segundo amarelo com apenas 20′. Assim, com um futebol abaixo de zero e Leo Messi em dificuldades físicas com um aparente problema muscular na coxa, a única oportunidade acabou por surgir quase em cima do intervalo, com Gabriel Martinelli a aproveitar uma segunda bola após canto para rematar antes do corte de Romero em cima da linha (44′). O descanso só poderia ser um bom conselheiro para os dois conjuntos sul-americanos.

Foi mesmo, de tal forma que o segundo tempo tornou-se quase uma antítese em relação ao que se tinha visto na primeira parte. O Brasil entrou bem melhor e viu Dibu Martínez evitar por duas vezes o golo inaugural, primeiro num remate quase sem ângulo de Raphinha na direita da área (55′) e de seguida numa espécie de penálti em andamento na zona central de Martinelli após grande jogada de Gabriel Jesus (58′). Não marcou, acabou por sofrer: num dos raros remates da Argentina à baliza, Otamendi saltou mais alto do que Gabriel Magalhães e André após canto de Lo Celso e desviou de cabeça sem hipóteses para Alisson (63′), fazendo questão de bater com a mão no símbolo de campeões mundiais que levava no centro da camisola.

Fernando Diniz tinha de apostar tudo para resgatar pelo menos um ponto enquanto a falange argentina ia começando a fazer a festa com músicas que se tornaram ainda mais eternas durante o último Campeonato do Mundo, tendo lançado nomes como Endrick, Raphael Veiga, Douglas Luiz e Joelinton, sendo que o médio do Newcastle acabaria por não estar muito tempo em campo após ver cartão vermelho direto num lance em que Rodrigo De Paul exagerou e muito nas queixas (81′). Se dúvidas ainda existissem, o atual campeão mundial tinha o encontro na mão, dominado e com mais três pontos para a liderança da fase de qualificação para o Mundial de 2026 com 15 pontos em seis jogos contra apenas sete do Brasil, atual sexto classificado que consentiu o terceiro desaire consecutivo contra o grande rival e mais uma vez em casa, sendo que esta foi também a primeira derrota de sempre jogando como visitado após 65 jogos de qualificação.