Uma pedra preciosa, que será um diamante, embrulhada em papel vegetal escondido entre cartões numa gaveta do gabinete da Câmara do Funchal. Vários objetos de luxo, entre eles 21 garrafas de vinho de edição limitada, canetas e 15 relógios, com os respetivos certificados, de marcas como Cartier, Chopard ou Frank Mueller. Muito dinheiro em notas, transportado pelo motorista, e encontrado em envelopes com o logotipo da câmara e do governo regional, na casa da mãe ou depositado nas suas contas ou na da filha. E um talão de uma transferência bancária de 7.500 euros para Miguel Albuquerque.

Tudo isto foi encontrado nas buscas da PJ a Pedro Calado, ex-vice do governo regional da Madeira (número 2 de Albuquerque) e ex-presidente da Câmara do Funchal e surge agora descrito no despacho de indiciação do Ministério Público citado pela CNN. Calado demitiu-se do cargo depois de ter sido detido e constituído arguido por suspeitas dos crimes de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevida de vantagem, abuso de poderes e tráfico de influência, ao lado dos empresários Avelino Farinha, líder do grupo de Construção AFA, e de Custódio Correia, CEO e principal acionista do grupo de construção civil Sociocorreia.

Além dos bens apreendidos, o Ministério Público seguiu o circuito do dinheiro que suspeita ter circulado entre os empresários envolvidos nos negócios investigados na Madeira até chegar, em notas, a Pedro Calado. E concluiu, no despacho de indiciação de cerca de 80 páginas avançado e citado pela CNN, que exibia “um nível de vida muito superior àquele que é o esperado de um servidor público, seja no exercício das funções de vice-presidente do governo regional da Madeira, seja nas de presidente da câmara municipal do Funchal”.

Em 10 anos, os depósitos em numerário terão atingido cerca de 200 mil euros, na maioria feitos pelo motorista, Rui Pinto, com quem trabalhou primeiro no Governo Regional e depois na autarquia. Pedro Calado terá justificado essas verbas (67 mil euros só de 2018 a 2021) com as remunerações da mulher, médica.

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A PJ fez também buscas, já conhecidas, à casa da mãe de Pedro Calado, Fátima, onde terá encontrado 10 mil euros em dinheiro vivo. O detalhe, avançado pela CNN citando o despacho de indiciação, é que se tratavam de 46 notas de 200 euros em envelopes da câmara, e uma nota de 200 euros, 10 notas de 20 euros e 10 notas de 10 euros num saco de tecido. Na conta da filha, mas de que é co-titular, fez entrar, também em dinheiro vivo, cerca de 30 mil euros. Tudo transportado igualmente pelo motorista. O que terá levado o MP a concluir que mãe, filha e motorista eram os seus testas-de-ferro.

As escutas citadas pelo despacho de indiciação agora divulgado mostram ainda a relação que tinha com os outros dois empresários arguidos. O ex-autarca tratava Avelino Farinha, dono dos hotéis Savoy onde era cliente VIP, por “chefe” e Custódio Correia por “meu querido” ou “companheiro”.

Na relação com Miguel Albuquerque, de quem foi braço direito no governo regional, e que foi igualmente constituído arguido, fica o tal talão da transferância bancária apreendido nas buscas da PJ de dia 24 em casa de Pedro Calado. Buscas onde a PJ encontrou também três relíquias religiosas da Arménia.

Pedro Calado e os dois empresários devem começar a ser ouvidos esta quarta-feira pelo juiz.