O Millennium BCP aumentou os lucros anuais em mais de quatro vezes, para 856 milhões, anunciou o banco esta segunda-feira. Os lucros, que comparam com os 197 milhões do ano anterior (reexpressos), foram impulsionados pelo aumento da margem financeira – isto é, a diferença entre os juros cobrados nos créditos e os custos de financiamento do banco (juros dos depósitos, grosso modo). O banco decidiu distribuir 30% dos lucros na forma de dividendos: mais de 250 milhões de euros.

Os resultados anuais do banco foram apresentados esta quinta-feira em conferência de imprensa na sede do banco em Oeiras, no Tagus Park. Na conferência de imprensa estiveram Miguel Maya, presidente da comissão executiva, e Nuno Amado, presidente do conselho de administração.

Parece que há uma certa vergonha em apresentar resultados [em algumas empresas], ora nós temos muito orgulho em apresentar bons resultados porque são as empresas com lucros que conseguem acrescentar valor à economia e reter talento”, afirmou Miguel Maya, na apresentação dos resultados.

Entre os 856 milhões de euros de resultado líquido consolidado do grupo, 725 milhões foram obtidos na atividade em Portugal – resultados que praticamente duplicaram face aos 381,4 milhões do ano anterior.

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O banco, como um todo, obteve um resultado operacional “core” de 2.435 milhões, em mais um ano em que foram assumidas imparidades significativas na atividade polaca (devido ao problema que se arrasta há vários anos relacionado com a concessão de crédito à habitação indexado a francos suíços, prática que remonta a antes de 2008 mas só nos últimos anos começou a provocar fortes perdas ao banco). Foram registados encargos de 780 milhões de euros relacionados com este problema, num banco que voltou a ter mais de mil milhões de euros em imparidades totais que subtraíram ao resultado líquido.

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30% do lucro vai ser entregue aos acionistas

A margem financeira do banco disparou mais de 31% para 2.825 milhões de euros, fruto do aumento repentino das taxas de juro que se refletiram mais rapidamente nos juros dos créditos no que nas remunerações dos depósitos (não só no BCP mas na generalidade dos principais bancos a operar em Portugal).

“A Comissão Executiva irá submeter ao Conselho de Administração uma proposta de aplicação de resultados a apresentar à Assembleia Geral de Acionistas que inclua a distribuição de dividendos correspondentes a um payout ratio de 30% calculado sobre o resultado líquido consolidado do exercício de 2023″, informou o banco, o que significa cerca de 256 milhões de euros.

O banco tinha pago um pequeno dividendo de 10% em 2022, relativamente aos lucros de 2021, mas no último ano (2023, relativamente a 2022) não pagou qualquer dividendo. Esta distribuição de dividendos, a confirmar-se, será de longe a maior desde a crise financeira.

“O BCP foi um banco com problemas no passado mas é um banco preparado para o futuro”, disse Nuno Amado, lembrando as contribuições cobradas ao banco entre a contribuição para o Fundo de Resolução nacional (além do europeu), a contribuição adicional de solidariedade desde 2020 e a contribuição extraordinária cobrada à banca, que se transformou em ordinária”.

Miguel Maya, por seu lado, comentou o facto de a banca estar a ser tema da campanha eleitoral, com alguns partidos a pedirem mais contribuições à banca. Os lucros que o banco está a ter, diz o líder da comissão executiva do BCP, são para “proveito de Portugal” – embora haja “pessoas que nunca vão gostar de ver outras pessoas ou empresas a ter sucesso”. E também não se deve lembrar a ajuda recebida por este banco, diz Miguel Maya, porque “o banco recebeu três mil milhões de euros de ajuda mas devolveu esses três mil milhões e ainda pagou mais mil milhões em juros“.

Esta é uma referência aos empréstimos de capital contingente (CoCo’s) que o banco recebeu após a crise financeira e que tinham implícitos juros anuais perto de 10% – daí o banco ter pago mil milhões de euros em juros, no total dos anos em que os empréstimos estiveram em vigor. “Eu queria ver o que acontecia se este banco também cobrasse juros de 10% no crédito à habitação…”, ironizou Miguel Maya.

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Há que ser justo com o BCP“, diz Nuno Amado, sublinhando que o banco tem mais de seis mil milhões em capitais próprios e, por isso, estes não são resultados tão volumosos assim. “Não somos uma empresa com seis mil euros de capitais próprios, nem seis milhões, temos seis mil milhões de euros em capitais próprios e isso faz uma diferença enorme” na apreciação do volume de resultados.

Num aparente comentário às eleições de 10 de Março, Nuno Amado diz que seria “importante que o País continuasse a ter o que tem agora, embora não tenha tido no passado, que é um setor bancário forte e competitivo e que tenha condições para apoiar a economia”. Mais concretamente, Nuno Amado disse sobre as eleições de 10 de março que espera que haja um “período pós-eleitoral que seja muito marcado pelo pragmatismo, de forma a permitir que o País cresça mais e sem crescer não há distribuição de riqueza”.

Novo Banco? “Ainda estamos na fase de pagar”

No seu comentário introdutório, Nuno Amado disse que o “BCP tem de ter dimensão e tem de lutar por essa dimensão”. Mas isso não passa, garante Nuno Amado, por uma fusão com o Novo Banco. “Neste momento estamos na fase de pagar“, ironizou, em referência às contribuições para o Fundo de Resolução Nacional. Nuno Amado diz que já foram pagos 480 milhões de euros, pelo BCP, ao fundo que capitalizou o Novo Banco após a resolução do BES.

Não é muito fácil pagar a um concorrente mas é o que estamos a fazer”, acrescentou.

O presidente do conselho de administração do BCP sublinhou que “a estratégia do BCP é crescer organicamente e estamos a ver que isso é possível”. Porém, “obviamente que se um dia houver uma necessidade de analisar iremos analisar. Mas não está na nossa agenda”, garantiu.

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Miguel Maya afirmou, também, que o banco renegociou 22.073 créditos à habitação em 2023, sendo que, nesse universo, por dificuldades financeiras foram menos de 2.500 renegociações. Especificamente ao abrigo do decreto-lei governamental com medidas para renegociação foram 1.070 renegociações.

São números “perfeitamente alinhados com o que eram as nossas expectativas”, disse Miguel Maya, garantindo novamente que no crédito não houve “nenhuma situação dramática” sobretudo porque o “emprego teve um desempenho positivo”. Repetindo uma imagem que já tinha usado no passado, o presidente da comissão executiva do BCP garantiu que “a floresta está bem”, embora haja alguns casos onde existem dificuldades e “aí, o banco cumpre a sua responsabilidade”, designadamente fazendo acordos com os clientes.