O Governo aguarda a aprovação da Comissão Europeia para aprovar legislação que permita criar um apoio aos transportadores ferroviários de mercadorias. A informação foi avançada ao Observador por fonte oficial do gabinete do secretário de Estado Adjunto e das Infraestruturas em resposta a uma pergunta sobre a subida em 23% da taxa de uso cobrada a estes operadores. A mesma fonte confirma que o Governo “manifestou à APEF (Associação Portuguesa das Empresas Ferroviárias) o seu compromisso em encontrar uma solução que evitasse repercussões deste aumento de custos”, mas “garantindo o cumprimento da legislação europeia relevante”.
Em causa está o aumento em 23% da taxa de uso da infraestrutura, que corresponde às portagens cobradas aos comboios, aprovada este ano pela Infraestruturas de Portugal, uma empresa pública tutelada pela secretária de Estado das Infraestruturas. Sinalizando partilhar a preocupação dos operadores com o aumento dos custos de transporte de mercadorias por ferrovia e com o desequilíbrio face à rodovia, a mesma fonte indica que a legislação para criar essa compensação está preparada e que o IMT (Instituto da Mobilidade de Transportes) está na fase final de um processo de notificação a Bruxelas.
“O atual Governo está a desenvolver esforços para ainda aprovar a criação deste apoio (cuja natureza e dimensão não é explicitado). No caso de tal não ser possível, as propostas legislativas e regulamentares ficarão na pasta de transição para o próximo Governo”.
O executivo está em gestão corrente até às eleições de 10 de março, mas poderá ficar em funções mais tempo do que o normal se não for encontrada de imediato uma solução governativa na sequência dos resultados das legislativas. A pasta das Infraestruturas, gerida por Frederico Francisco, passou para a tutela do primeiro-ministro após a demissão de João Galamba no ano passado.
A situação do aumento da taxa de uso foi denunciada pela associação que representa os operadores de mercadorias na sexta-feira passada. A APEF manifestou a sua desilusão face às expetativas criadas pelo Executivo (e que este confirma) e a intenção de realizar o pagamento da taxa de uso pelos valores de 2023, ignorando o aumento agora implementado.
IP ignora recomendação do regulador e mantém aumento de 23% nas portagens cobradas aos comboios
Numa resposta também enviada esta quinta-feira ao Observador, a IP atribui a atualização tarifária média de 20% este ano à aplicação do regulamento europeu, o qual prevê que as tarifas devem refletir “a evolução dos custos reais da gestão da infraestrutura (manutenção, operação e alocação de capacidade)”, princípio que não foi aplicado em 2021, 2022 e 2023 por causa da pandemia. Mas essa suspensão era temporária, ao abrigo do quadro legal europeu, e a atualização agora efetuada “contempla a variação da estrutura de custos de cinco anos”. A empresa diz ainda que procurou “minimizar o impacto dos aumentos decorrentes da aplicação dos critérios”, fazendo as contas à variação de custos nos cinco anos e não apenas de um ano.
A associação que representa os operadores ferroviários queixou-se ainda do tratamento desigual dado à ferrovia face às estradas numa referência aos descontos nas portagens de autoestradas no interior, que são importantes canais para o escoamento de mercadorias. São também estas portagens que o PS de Pedro Nuno Santos, que enquanto ministro deu grande protagonismo à ferrovia, quer eliminar se chegar a primeiro-ministro.
A IP diz que está “legalmente vinculada” a cumprir o regulamento europeu à luz do qual não é legalmente possível suspender a aplicação do modelo tarifário e que tem vindo a estudar soluções complementares em articulação com o regulador do setor, a AMT.
Mas a APEF cita o caso espanhol, onde foi aprovado o congelamento da taxa de uso em 2024 e onde os operadores pagam “oito vezes menos taxa de uso do que em Portugal” para concluir que “esta não é uma questão administrativa, é uma questão de política pública e de opções do Estado português”. Já o gabinete do secretário de Estado considera “relevante notar que a TUI (taxa de uso da infraestrutura) em Portugal para os comboios de mercadorias é metade da média europeia”.
A secretaria de Estado das Infraestruturas adianta ainda que foi pedido à AMT (Autoridade de Mobilidade e Transportes) um estudo sobre a revisão global do sistema de tarifação da infraestrutura ferroviária com o objetivo de encontrar um modelo “mais flexível que venha a incentivar a transferência modal” e que possa ser aplicado em 2025.