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Uma fronteira, a maior de Moçambique e seis mortes em Nampula. Este é, ao início da tarde (14h00) o balanço do primeiro de três dias de protestos convocados pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, enquanto a capital vive uma quase normalidade completamente diferente do que se passou nas outras fases da contestação.

O mesmo não se pode dizer de Nampula, no norte do país, onde pelo menos seis pessoas morreram esta quarta-feira e oito ficaram feridas depois de terem sido baleadas, em confrontos com a polícia, informa a Plataforma Eleitoral Decide. Segundo esta Organização Não-Governamental (ONG) moçambicana nove pessoas foram ainda detidas em Manica, no centro de Moçambique.

Manifestantes ocuparam esta quarta-feira a estrada Nacional 4, junto à fronteira de Ressano Garcia, impedindo a circulação na maior travessia terrestre entre Moçambique e África do Sul.

A página de Facebook de Venâncio Mondlane mostra  imagens da fronteira de Ressano Garcia, a cerca de 90 quilómetros de Maputo, bloqueada, sendo que há outros vídeos a circular também na rede social X que dão conta do fecho da fronteira. O político está em parte incerta de onde anunciou na segunda-feira que esta quarta fase de “repúdio” dos resultados eleitorais que deram a vitória à Frelimo e ao seu candidato, se centraria nas capitais das províncias, nos portos e nas fronteiras.

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Também em Quelimane houve relatos de distúrbios. De acordo com a ativista Quitéria Guirengane, as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique causaram “vandalismo” na cidade.

A fronteira reabriu totalmente no sábado, depois de confrontos provocados por manifestantes que condicionaram a passagem durante cerca de uma semana, o que levou entretanto a um reforço policial no perímetro da fronteira, cujo acesso voltou, desde o início da manhã desta quarta-feira, a ser ocupado por pessoas em protesto.

O porto de Nacala também estará paralisado, segundo um vídeo publicado na mesma página de Facebook do político.

Já em Maputo, o dia tem “estado calmo”, disse ao Observador uma residente. Numa ronda feita pela Lusa ao longo da manhã por todos os bairros da capital, não se registou qualquer manifestação, um cenário muito diferente do de dias anteriores de confrontos com a polícia, que disparou tiros e lançou gás lacrimogéneo contra os manifestantes.

Ao início da manhã o movimento era reduzido, mas pouco depois, num cenário de quase normalidade na capital, progressivamente os poucos comércios que tinham decidido não abrir começaram a funcionar, levando a azáfama habitual de pessoas e trânsito à cidade.

Os transportes também estão a funcionar normalmente, mas é visível um reforço policial e militar em vários bairros, ainda assim reduzido face a dias anteriores.

“O povo tem direito à legítima defesa”, diz Mondlane

Logo pela manhã, Venâncio Mondlane voltou a chamar ao protesto. Na segunda-feira, ao anunciar a última etapa dos protestos, tinha apelado para uma paralisação nas capitais de província, incluindo, Maputo. “Vamo-nos manifestar nas fronteiras, nos portos e nas capitais provinciais . Vamos paralisar todas as atividades para que percebam que o povo está cansado”.

Um protesto que pediu para ser alargado aos portos e às fronteiras do país, e aos corredores de transporte que ligam estas infraestruturas, apelando à adesão dos camionistas: “Não obrigamos ninguém a aderir à manifestação. Passamos os valores da manifestação e quem quiser adere”.

E esta quarta-feira, ao amanhecer, pressionou a mesma nota. Já não num vídeo, por questões de segurança, sabe o Observador, mas numa voz off com uma fotografia antiga. “Não vamos recuar” garantiu, ao mesmo tempo que dizia que “se a polícia quiser usar de violência o povo tem o direito de legítima defesa”.

Esta era a resposta do candidato independente apoiado pelo Podemos ao comandante-geral da Polícia da República de Moçambique (PRM). Bernardino Rafael disse na terça-feira que é preciso um “basta” às manifestações e paralisações, referindo que são “terrorismo urbano” com intenção de “alterar a ordem constitucional”.

“Urge dizer basta às manifestações violentas com tendência de sabotagem de grandes empreendimentos que o país conquistou durante a independência e que são a esperança da geração vindoura”, declarou Bernardino Rafael.

Os empresários moçambicanos estimaram na terça-feira em 24,8 mil milhões de meticais (354 milhões de euros) os prejuízos causados em dez dias de paralisações e manifestações convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, com 151 unidades empresariais vandalizadas.

“Com estas manifestações acompanhadas pelas paralisações da atividade económica, constatamos que os setores de comércio, logística e transporte foram os mais afetados, sendo que as perdas totais e impacto no PIB (Produto Interno Bruto) totalizaram 24,8 mil milhões de meticais (354 milhões de euros), que são cerca de 2,2% do nosso PIB”, declarou o presidente da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), Agostinho Vuma.

Venâncio Mondlane, na sua gravação de menos de um minuto e meio ripostou que tem sido a Frelimo “a destruir o país e o levaram ao abismo nos últimos 50 anos”. E reitera que não vão desistir das manifestações “porque desorganizaram [Frelimo e governo], destruíram o país, criaram miséria total e completa”.

O Ministério Público (MP) moçambicano já instaurou 208 processos-crime para responsabilizar os autores “morais e materiais” da violência nas manifestações pós-eleitorais, anunciou também na terça-feira a Procuradoria-Geral da República (PGR), responsabilizando o candidato presidencial Venâncio Mondlane.

A PGR refere que, no “âmbito das suas competências constitucionais e legais”, o MP “tem estado a instaurar processos judiciais, visando a responsabilização criminal” dos autores “morais e materiais”, e “cúmplices destes atos”.

“Tendo sido desencadeados, até ao momento, 208 processos-crime, nos quais se investiga homicídios, ofensas corporais, danos, incitamento a desobediência coletiva, bem como a conjuração ou conspiração para prática de crime contra a segurança do Estado e alteração violenta do Estado de direito”, lê-se.