Desde 2022 que o Metropolitano de Lisboa monitoriza as redes sociais de três ativistas que se têm insurgido contra a construção da estação de metro de Campo de Ourique no Jardim da Parada, no âmbito do plano de expansão da linha vermelha entre São Sebastião e Alcântara. É a própria entidade a admiti-lo no plano de comunicação do projeto que, entre outros documentos do relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (Recape), está em consulta pública até 5 de Dezembro. Em comunicado, o Metro rejeita que tenha vigiado as ativistas e diz que em causa está apenas “o normal acompanhamento” e análise das opiniões públicas sobre o projeto.
A notícia da monitorização foi avançada na edição desta terça-feira do Público e apanhou de surpresa as três ativistas envolvidas — Susana Morais, Suzana Marques e Margarida Vicente —, que pertencem ao Movimento Salvar o Jardim da Parada, criado com o objetivo de contestar o traçado da obra. As três indicam ao jornal que vão apresentar queixa contra o Metro ao Ministério Público e à Comissão Nacional de Proteção de Dados. O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia defende que a prática do Metropolitano é “certamente” ilegal e “tem relevância criminal”. O Observador contactou o Ministério das Infraestruturas, que remeteu uma resposta para o Metro.
No plano de comunicação, o Metro identifica como “ameaças” à expansão os membros da “população local” que se apresentam “ativamente contra o posicionamento das estações”, assim como “grupos existentes contra o projeto/localização de estações da linha Vermelha” e os “comentários negativos nas redes sociais”.
Nesse documento, o Metro indica que “na análise externa às redes sociais, foram analisados vários grupos/páginas de Facebook”: Movimento Salvar o Jardim da Parada; Fãs de Campo de Ourique; Nascemos Felizes em Campo de Ourique; Campo de Ourique; e Vizinhos de Alcântara. Estes grupos “são monitorizados por estarem relacionados com as zonas onde o traçado do Projeto incide”. Sublinha que à exceção do grupo “Salvar o Jardim da Parada”, os restantes “não foram criados com o objetivo de se apresentarem contra o Projeto”, sendo “grupos locais, que servem para os fregueses partilharem informações locais”. Nestes grupos “normalmente” os seus elementos partilham notícias sobre o projeto, imagens do jardim e ações ou manifestações de desagrado.
Mas o Metro, tutelado pelo Ministério das Infraestruturas, também identifica três “pessoas analisadas”: Susana Morais, Suzana Marques e Margarida Vicente. E afirma que foram inseridas no grupo “pessoas analisadas” por “serem as pessoas mais ativas nos grupos/páginas contra a construção da estação no Jardim da Parada”. A monitorização das redes sociais ocorre desde 2022.
Em causa estão as obras de expansão da linha vermelha do Metro de Lisboa, cujo projeto foi desde cedo contestado por movimentos da cidade pelos impactos patrimoniais e ambientais no Baluarte do Livramento, perto de Alcântara, e no Jardim Teófilo Braga, mais conhecido como Jardim da Parada, em Campo de Ourique.
“O Metro quer destruir o PULMÃO do bairro, um dos últimos jardins românticos de Lisboa, que num só lugar junta todas as gerações. Somos pela preservação e integridade do ÚNICO espaço verde do bairro”, defende o grupo Salvar o Jardim da Parada, no site, que se propõe a proteger “um dos últimos jardins românticos de Lisboa”. O grupo apoiou, em novembro de 2022, uma providência cautelar contra a empreitada, cujos fundamentos foram rejeitados na primeira instância, decisão que, após recurso, foi confirmada em segunda instância.
Metro rejeita ter vigiado ativistas
Em comunicado, o Metropolitano “refuta categoricamente” ter feito qualquer tipo de “vigilância” indevida e diz ser “abusivo o recurso” a esse termo.
“O que está em causa é, tão somente, o normal acompanhamento e a análise das referências públicas feitas ao referido projeto de expansão da rede do Metropolitano de Lisboa, na comunicação social e nas redes sociais, por todas as partes interessadas, incluindo cidadãos e grupos de cidadãos, em particular os que mais têm contribuído para o debate público sobre este empreendimento”, garante a entidade, que diz que em causa estão referências a conteúdos que estão no domínio público por opção dos próprios autores e que são de livre acesso a qualquer leitor.
O Metro frisa que uma das formas de ouvir os contributos da comunidade envolvente, avaliar a eficácia da comunicação e melhorar é feito, além dos contributos que recebe de contactos presenciais e de canais próprios de comunicação, através de “ler e acompanhar de forma regular a informação e a opinião que é publicada sobre o projeto”.
“O Metropolitano de Lisboa é uma instituição de serviço público que pauta a sua atuação pelo rigoroso cumprimento da lei, da ética empresarial e pela transparência na relação com a comunidade e não abdica em momento algum desses valores. Não pode, por isso, deixar de dar nota pública de que considera inaceitável que o seu bom nome e a sua reputação sejam colocados em causa por uma interpretação abusiva de informação disponibilizada publicamente”, adianta ainda.